São Paulo, quinta-feira, 17 de abril de 2008

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"Achei que era diária, botava no bolso sem explicar", diz reitor

Professor da Unifesp, Ulysses Fagundes Neto afirma que se equivocou ao usar cartão corporativo, mas não agiu de má-fé

Ao se explicar sobre gastos pessoais em viagens ao exterior, acadêmico diz que não vê razão para se afastar do cargo nem para punição

LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

O reitor da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), Ulysses Fagundes Neto, 62, que usou R$ 12 mil do cartão corporativo em compras pessoais no exterior, disse ontem ter cometido um "equívoco", pois achava que tinha autonomia para gastar e que entendia não se tratar de dinheiro público.
"Eu me equivoquei. Achava que era como uma diária, um dinheiro que você bota no bolso e não tem de explicar. Errei por falta de informação. Por isso, devolvi o valor integral numa demonstração de boa-fé e de respeito ao trato com o dinheiro público", afirmou o reitor.
De 2006 até janeiro de 2008, ele gastou R$ 84,8 mil do cartão. Durante a Copa do Mundo de 2006, foram R$ 2.473 em lojas da Nike e da Adidas na Alemanha. Na Espanha, comprou R$ 1.411 em cerâmicas. Nos EUA, mais R$ 5.084 em produtos eletrônicos. E na China, outros R$ 2.035 em malas.
Fagundes Neto, que é professor da Unifesp, reclamou de erros divulgados pela imprensa. "Falam que comprei malas nos Estados Unidos. Não foi. Foi na China. E comprei porque as minhas arrebentaram em Hong Kong. E esse [R$ 2.035] é o preço da Samsonite."
Questionado se está arrependido por ter usado dinheiro público em despesas pessoais, respondeu: "Não é que eu me arrependa, é que eu não fiz por má-fé. As regras não eram claras, principalmente em 2006. O ano foi muito confuso".
O reitor disse ter devolvido os R$ 84,8 mil aos cofres públicos. Os últimos R$ 37 mil foram ressarcidos anteontem. "Agora vou entrar com recurso para ser reembolsado, sei que tinha direito à maior parte."
Ao falar sobre o cargo dele na Unifesp, Fagundes Neto mudou o tom. De forma pausada, disse que o caso não justifica seu afastamento da reitoria nem eventual punição -o Ministério Público Federal informou que a devolução do dinheiro não o livra de eventual ação por má gestão pública.
"Pedir a minha saída da reitoria não se justifica porque não houve má-fé. Punição formal eu não espero, mas a moral eu já sofro. Estou pagando um preço incalculável por um prejuízo sem dolo [intenção]."
O reitor declarou ainda não temer uma invasão de seu gabinete, a exemplo do que ocorreu na Universidade de Brasília, onde os estudantes derrubaram a cúpula da instituição.
"Isso está maculando minha vida pessoal, não a minha vida acadêmica. O que tem acontecido é que, em minhas relações, tenho de dar satisfações. As pessoas me cobram, às vezes, até de forma irônica. E tive de falar para a minha mãe, uma coisa difícil", afirmou o reitor, que não aceitou revelar o salário dele como servidor público.
Fagundes Neto disse ter sido notificado para depor na CPI dos Cartões. "Vou e responderei a todas as questões."

Clima
A entrevista do reitor ocorreu num anfiteatro da Unifesp. O clima foi tenso. Enquanto o reitor falava com os jornalistas, era possível ouvir, mesmo à distância, os batuques e gritos dos alunos. "Ulysses ladrão, cadê a educação?", repetiam.
A entrevista foi acompanhada por funcionários e amigos do reitor que, a cada resposta dele, torciam: "é isso", "muito bem".
Do lado de fora, dezenas de seguranças impediam a entrada de alunos.
O coordenador do Diretório Central dos Estudantes, Mateus Lima, um dos poucos que assistiram à entrevista, disse ser ingenuidade o reitor crer que a devolução apaga o erro.


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