São Paulo, sexta-feira, 17 de junho de 2005

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Foi a decisão "mais difícil", diz Lula

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, segundo suas próprias palavras, tomou ontem "a decisão mais difícil" de seus quase dois anos e meio de governo. Como dissera, cortou na carne ao formalizar a saída do poderoso José Dirceu da Casa Civil, a primeira etapa de uma reforma do primeiro escalão e de medidas anticrise.
Estão previstas a saída de outros ministros para que retomem mandatos na Câmara, a tentativa de recompor diálogo com a oposição e a reunificação do dividido PT sob o comando formal de Dirceu no futuro.
Dirceu foi o principal estrategista da chegada do PT ao poder central, defendendo uma inflexão ao centro (moderação econômica e política), como alianças com partidos conservadores. O escândalo do "mensalão", com raízes nessas alianças, derrubou o ministro que começou o governo como o mais importante auxiliar de Lula e que, após 30 meses, virou seu maior problema. Dirceu sobreviveu, enfraquecido, ao caso Waldomiro Diniz, no início de 2004.
No último domingo, quando o presidente do PTB, Roberto Jefferson (RJ), deu a sua segunda entrevista à Folha, na qual bombardeou fortemente Dirceu e a cúpula do PT ligada a ele, Lula deu início a um complicado processo de negociação com o ministro.
Na noite de domingo, Dirceu chegou às 18h à Granja do Torto preparado para "o pior", como dissera. Tinha razão. O presidente disse a ele que seu afastamento, ainda que temporário, era a melhor solução -desde que o ministro concordasse. Presente, o presidente do PT, José Genoino, afirmou que era "confissão de culpa". Dirceu também. Lula, então, aquiesceu.
Mas o depoimento de Jefferson na Câmara na terça-feira foi a gota d'água. O petebista disse: "Dirceu, se você não sair daí rápido, você vai fazer réu um homem inocente, o presidente Lula".
Contrariado com o misto de ultimato e recado, Dirceu dormiu nesse dia disposto a não deixar o governo, mas, na manhã seguinte, ao ver a repercussão do depoimento apontando-o como o principal fator de desgaste do governo, tomou a iniciativa de dizer a Lula "não dá mais". Ontem, negociou as formalidades de sua saída e os próximos passos do governo para combater a crise num clima de muita emoção.
Ao final do pronunciamento à imprensa, no qual disse que deixava no governo parte da "alma" e do "coração", o ministro fez uma reunião com os principais funcionários da Casa Civil. Chegou a marejar os olhos ao receber abraços de auxiliares que choravam. Depois, recebeu as visitas do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e do senador José Sarney (PMDB-AP).

PT e reeleição
Dirceu retornará à Câmara dos Deputados, onde deporá em todas as investigações parlamentares, da CPI dos Correios ao Conselho de Ética da Câmara. Não deverá ter posição formal de liderança nem deverá reassumir a presidência do PT, mantendo-se licenciado do posto, hoje nas mãos de José Genoino. Principal petista depois de Lula, Dirceu é a voz mais influente dentro da estrutura partidária do PT.
Lula gostaria que ele voltasse a presidir o PT formalmente, candidatando-se a presidente do partido nas eleições deste ano. No médio prazo, sua principal missão será coordenar novamente a campanha à reeleição de Lula e montar um plano eleitoral para o PT nas eleições de 2006.
No curto prazo, Dirceu comandará no Congresso a estratégia de defesa do governo na CPIs dos Correios e do Mensalão.
Além de Dirceu, a Folha apurou que também deverão retornar à Câmara os ministros Aldo Rebelo (Coordenação de Governo), Eduardo Campos (Ciência e Tecnologia) e Ricardo Berzoni (Trabalho), de acordo com decisão transmitida ontem por Lula. O presidente estuda ainda substituir os ministros Humberto Costa (Saúde), Romero Jucá (Previdência) e Henrique Meirelles (presidente do Banco Central).
Lula e os principais auxiliares tentaram chegar ontem a uma decisão final sobre o substituto de Dirceu, que se afasta em definitivo do cargo. Ao final do dia, havia a versão de que o presidente já havia optado pelo governador do Acre, Jorge Viana (PT), mas que preferia anunciar isso na segunda-feira. Noutra versão, apareciam como cotados o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, e o prefeito de Aracaju, Marcelo Déda. A hipótese de Antonio Palocci Filho (Fazenda) ocupar o posto voltou a ser lembrada, mas era menor que as anteriores.
A intenção de Lula é extinguir a Coordenação Política, mas, dependendo da escolha do sucessor de Dirceu, ela pode ser mantida, preferencialmente com o PT.


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