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ÍNTEGRA
"Crise revelou limites da democracia"
DA REDAÇÃO
Leia a seguir a íntegra do manifesto a ser lançado por intelectuais
na próxima terça-feira na Unicamp (SP).
"Pela investigação rigorosa da corrupção, pela punição dos envolvidos
e pela democracia.
A crise atual revelou os limites da
democracia brasileira, e as manobras
em curso, que visam poupar os corruptos, podem estreitá-la ainda mais.
Depois de muitos anos de luta contra uma violenta ditadura militar,
chegamos a um regime democrático
esquálido, que não rompeu claramente com o passado ditatorial. Sob
forma nova, permanecem alguns dos
instrumentos espúrios da ditadura,
dos quais são exemplos o açambarcamento da função legislativa pelo Executivo, a multiplicação de foros privilegiados para julgar mandatários e
burocratas, a ação subterrânea das
forças de segurança militarizadas no
seio do Estado, a ausência da plena liberdade de organização para os trabalhadores e a prática de tortura e do
assassinato pelos órgãos policiais.
Desenvolveram-se também, sem nenhum freio, alguns dos instrumentos
pelos quais o poder econômico e as
instituições do Estado podem distorcer os mecanismos de expressão da
vontade popular, como a intervenção
direta dos organismos econômicos
internacionais na definição da política econômica do Estado brasileiro, o
monopólio exercido por um reduzido número de grandes grupos econômicos sobre os meios de comunicação, o sistema de financiamento de
campanhas eleitorais que nada mais é
que um sistema para comprar candidatos e candidaturas, a conversão dos
votos de deputados e senadores em
mercadoria que é negociada quase
que à luz do dia com vultosos recursos de origem escusa, a total falta de
controle dos representantes pelos supostos representados e a consolidação de um presidencialismo que se
parece com o poder imperial. Esse tipo de democracia tem sido útil para
preservar o modelo econômico neoliberal, mas não para atender aos interesses da maioria da população brasileira.
Depois de conquistarem o voto popular na eleição de 2002, o governo
Lula e o PT, sob a direção do Campo
Majoritário, aderiram àquelas práticas. Chegamos a uma situação em
que, dentre os grandes partidos políticos, ninguém pode atirar a primeira
pedra. Desde que surgiram as denúncias sobre a compra de deputados para que votassem com o governo, o PT
e o governo Lula têm dificultado as
investigações, enquanto o PFL e o
PSDB agem sob medida com o único
objetivo de usar eleitoralmente as denúncias, zelando para que a corrupção praticada por tucanos e pefelistas
permaneça ignorada e não apurada.
Há também os interesses econômicos aos quais estão ligados o PFL e o
PSDB. Estes partidos sacrificam as investigações quando elas apontam na
direção do Ministério da Fazenda, de
modo a preservar a política econômica do governo com a qual concordam. Não estão empenhados, de fato,
em levar a investigação até o fim e em
todas as direções; não estão empenhados em preservar e em ampliar o
pouco de democracia política que
conquistamos no Brasil. Colher depoimentos espetaculares sem proceder a investigações rigorosas pode ser
um caminho para simular que se está
investigando e, ao mesmo tempo,
viabilizar um grande acordo que salve quase todos: o governo, a oposição
liberal e até mesmo os deputados cujos nomes estão na lista de sacadores
das contas de Marcos Valério.
É este acordo contra a democracia
que não podemos aceitar! Investigação pela metade e punições meramente protocolares estimularão a
continuidade da ação dissolvente do
poder econômico sobre a democracia
brasileira e reforçarão a autonomia e
a presunção de impunidade de parlamentares, de mandatários do poder
executivo, de juízes e de burocratas
do Estado. Campanhas eleitorais e
deputados continuarão sendo comprados, a política continuará sendo
meio para o enriquecimento pessoal
e a democracia representativa, uma
falsa representação da vontade da
maioria. Passado o momento espetacular da crise, regressaríamos à normalidade de nossa democracia estiolada pela herança da ditadura, pela
corrupção do poder econômico e pela arrogância dos políticos profissionais e dos burocratas.
Exigimos que as investigações
prossigam até o fim, inclusive aquelas
que apontem em direção à Presidência da República e possam redundar
na instauração de um processo de
impeachment.
Todos os culpados, corruptos e corruptores devem ser punidos, inclusive os bancos e empresas, nacionais e
estrangeiras, que financiaram essa ultrajante operação de compra de votos
e apoio político.
É hora de lutar pela preservação das
conquistas democráticas e pela criação e ampliação dos mecanismos de
controle popular sobre o Executivo, o
Legislativo e o Judiciário. A luta contra a corrupção e pela ampliação da
democracia é parte da luta contra o
modelo econômico neoliberal e pela
melhoria das condições de vida da
população brasileira.
Setembro de 2005."
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