São Paulo, Domingo, 17 de Outubro de 1999
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ELIO GASPARI

Em campanha
O doutor Armínio Fraga, presidente do Banco Central, já está em campanha para ocupar o Ministério da Fazenda. Não há indicações de que esteja atropelando o professor Pedro Malan. Está apenas limpando os trilhos.
Admitindo-se que Malan deixe o ministério (coisa que só ele e FFHH sabem se vai acontecer), Fraga é um nome provável para o cargo, mas julgá-lo favorito é exagero.

2002
Fará bom negócio quem acreditar que o governador Mário Covas é sincero quando diz que não pretende disputar a Presidência da República.
Covas sabe quais são as suas reais condições de saúde. Seu câncer de bexiga foi retirado e não se sabe de más notícias nessa área. Sua qualidade de vida, contudo, foi afetada.
Está obrigado a limitações que levariam qualquer pessoa a avaliar o tamanho do piano que deveria carregar se fosse eleito.
Quando o PSDB diz que Covas é seu candidato, está apenas fingindo.

Casos de cadeia
Saldos da administração Renan Calheiros no Ministério da Justiça:
Ao longo deste ano a União deixou de repassar verbas para a construção de presídios em São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Coisa de R$ 10 milhões, que resultariam na criação de 3.000 novas vagas nas prisões desses Estados.
Enquanto isso, liberaram-se outros R$ 10 milhões para a construção de uma penitenciária masculina em Alagoas.
Ela terá 280 vagas e custará R$ 17,2 milhões. Será o metro quadrado de cadeia mais valorizado do mundo.

Gosto do café
Depois de refinanciar as dívidas dos cafeicultores, com jeito de quem não quer nada, volta-se a discutir no governo uma maneira de se torrar o dinheiro da Viúva para subsidiar empresários.
Trata-se de armar um leilão fechado para a venda de 1 milhão de sacas de café a empresas brasileiras fabricantes e exportadoras de café solúvel.
Sempre que aparece a expressão "leilão fechado", alguma coisa de ruim está para acontecer. Nesse caso, trata-se de uma maneira complicada (e fechada) de ajudar a capitalização das empresas brasileiras de solúvel. Elas compram o café do governo a prazo e o trocam no mercado a um preço um pouco maior, à vista.
Essa acrobacia esteve para ser feita no início do ano, mas desandou.
Caso ela seja feita, pede-se apenas uma coisa: que os ministros encarregados de azeitar o percurso do leilão fechado compareçam a um programa de auditório e entreguem aos empresários, diante das câmeras, um cheque equivalente ao valor da ajuda que lhes darão.


Uma burocracia que come cestas


Mais uma jóia da reunião anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais, a Anpocs.
A economista Lena Lavinas, do Ipea, comparou dois programas sociais em operação no país. Um é o Prodea, o Programa de Distribuição Emergencial de Alimentos, do governo federal, criado em 1993 e hoje integrado ao Comunidade Solidária. Distribui cestas básicas em comunidades carentes. O outro é o Cesta do Povo, mantido pelo governo da Bahia. Vende gêneros alimentícios a preços subsidiados em 409 pontos do Estado.
A professora Lavinas foi buscar uma resposta para a seguinte pergunta: o que funciona melhor, a distribuição de comida ou a transferência de renda (por meio do subsídio)?
Dois em cada 10 brasileiros não ganham o suficiente para comprar a comida necessária a uma nutrição adequada. Um programa alimentar que atingisse os 32 milhões de necessitados custaria R$ 8,4 bilhões ao ano. Noutra conta, com R$ 4,5 bilhões seria possível suprir as necessidades de 70% dos necessitados.
Em 1998 o Prodea distribuiu 28,5 milhões de cestas básicas em 2.200 municípios (contra 3,1 milhões em 1995). Mesmo sabendo-se que a quantidade de calorias de cada cesta foi reduzida em mais ou menos 20%, são bons números e atingem cerca de 20% das famílias carentes.
A eficiência é outra questão. Em 1997 o programa gastou quase metade dos seus recursos pagando sua folha de pessoal. Dos R$ 20 gastos com cada cesta, R$ 9 foram gastos com pessoal. Ou seja, o programa come a mesma quantidade de dinheiro que usa para levar comida a quem tem fome.
A Cesta baiana funciona de forma diversa. Atinge 1 milhão de famílias, aproximadamente um terço da população do Estado. Não dá comida e tem uma estrutura burocrática simples. Vende os gêneros a preço subsidiado. Comparando-se o preço dos alimentos da Cesta do Povo com os do Prodea resulta que, com R$ 20, compra-se, na Bahia, 24% mais calorias do que pelo programa federal.
Conclusão da professora Lavinas:
"Se a distribuição de alimentos do Prodea fosse substituída pelo seu equivalente em renda, o governo federal estaria transferindo um maior benefício no acesso alimentar às famílias beneficiárias que alocassem essa renda na Cesta do Povo."
Ela ressalva que a experiência baiana não pode ser estendida a todo o país, mas pergunta se não seria o caso de se discutir a desativação do Prodea, colocando-se no seu lugar um programa que, em vez de dar comida, transferisse renda.
Uma coisa é certa, com os R$ 20 que o governo federal gasta em cada cesta, os cidadãos poderiam comprar a mesma quantidade de alimentos nos balcões do varejo de pelo menos três capitais. A professora pesquisou os preços de Belo Horizonte, Curitiba e Salvador. Verificou que a cesta federal e o balcão empatavam em Salvador, eram ligeiramente mais caros em Belo Horizonte e mais baratos em Curitiba.
Uma última informação da professora Lavinas, destinada a ilustrar quem acredita que necessitado e vagabundo são coisas parecidas: a taxa de atividade dos chefes de famílias que não comem o suficiente para se nutrir é de 75%, a mesma dos outros chefes de família, independente da renda que tenham.

A ekipe prometeu e não entregou
Poucas vezes uma ekipekonômika produziu um fracasso semelhante ao das contas externas brasileiras neste ano. Os doutores que a cada semana dão aulas de matemática e modos aos nativos assinaram um acordo com o FMI comprometendo-se a produzir um superávit comercial de US$ 11 bilhões. Fecharão o ano com um déficit de US$ 1 bilhão.
Quando se trata de tungar os trabalhadores, os sábios da ekipekonômica cumprem todas as metas do Fundo. Quando se trata de mostrar resultados no conjunto da economia, fracassam e olham para a escumalha como se a culpa fosse dela.
A balança comercial é um dos melhores indicadores da saúde de um país. Se ele importa mais do que exporta, tem problemas. Os EUA estão nessa situação, mas emitem dólares, não reais. Desde 1995, a cada ano o governo prometeu uma balança comercial equilibrada. Chegou a delirar com promessas de superávits. Produziu apenas ruína. Entre 1997 e 1998, no auge do populismo cambial, acumulou-se um déficit de US$ 14,5 bilhões.
No início deste ano, quando o FMI assumiu a gerência das contas nacionais, tanto os seus técnicos quanto a ekipe acharam razoável anunciar ao mundo que o Brasil poderia fechar 1999 com um superávit de US$ 11 bilhões.
Agora é o caso de perguntar aos doutores Stanley Fischer e Pedro Malan o que é que aconteceu com o número.
Era mentira? Nesse caso tudo bem. Não é a primeira vez.
Era leviandade? Nesse caso, novamente, tudo bem. Não será a última.
Foi uma estimativa errada? Nesse caso a conversa fica séria. Tanto o FMI quanto a ekipekonômica deveriam ter a boa educação de se dirigir ao mercado e à escumalha para explicar onde erraram as previsões.
Não se tratou de um erro pequeno. Se o Brasil estivesse com um superávit comercial de US$ 5,5 bilhões (metade do prometido), seria possível supor que se começava a reverter a tendência estabelecida em 1995, pela qual o governo de FFHH gera empregos no exterior (sobretudo nos Estados Unidos) e desemprego em Pindorama.
O saldo comercial era a meta saudável do acordo com o FMI e foi integralmente à breca. Todas as outras, que custam sofrimento, desemprego e recessão, foram cumpridas à risca.
Em maio, o ministro Pedro Malan reconheceu que a meta acertada com o FMI era inviável. Em junho prometeu um superávit de US$ 4 bilhões. Um mês depois, reviu o acordo com o FMI, deixando tudo por US$ 3 bilhões. Agora negocia-se uma nova meta, com um déficit de US$ 1 bilhão. A diferença entre o prometido e o entregue ficou em US$ 12 bilhões.
Tanto o doutor Stanley Fischer, babalorixá do FMI, quanto o doutor Malan, cambondo da ekipe, deveriam responder à seguinte pergunta:
"O que nos aconteceria se tivéssemos feito uma coisa dessas numa empresa privada?"

Uma história de cavalheiros
No livro "Uma Vida", no qual o advogado Plinio Doyle contou suas memórias a Rachel Valença, há uma história que dá prazer contar. Numa época em que funciona uma CPI do Judiciário e o presidente do Supremo Tribunal Federal ampara seus votos contrapondo a bibliografia do seu contracheque à jurisprudência da prestação de seu carro, vale revisitar o mundo de Plinio Doyle.
Advogado e companheiro de banca de San Tiago Dantas, nos anos 50 Doyle comprou um apartamento em Petrópolis. Eram dois por andar, e o outro pertencia ao ministro Orozimbo Nonato, do Supremo Tribunal Federal.
Orozimbo ia muito pouco a Petrópolis, e Esmeralda, a mulher de Doyle, sonhava com mais espaço. Um dia souberam que o apartamento seria vendido.
Doyle não teve coragem de procurar um ministro do Supremo Tribunal Federal para propor-lhe uma transação comercial. O assunto foi conduzido pelas duas mulheres e fechado pelo preço que Orozimbo Nonato pagara ao comprá-lo.
Plinio Doyle reuniu uma das melhores bibliotecas do país, com 25 mil volumes. Ela foi comprada pela Fundação da Casa de Rui Barbosa.


Curso Madame Natasha de piano e português

Madame Natasha tem horror a música. Ela protege os desafortunados do idioma e são poucos os seus momentos de felicidade. Ela acaba de ter uma grande satisfação, ao saber que o deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP) apresentou ao Congresso um projeto de lei destinado a proteger o idioma nacional.
Rebelo argumenta:
"Estamos a assistir a uma verdadeira descaracterização da língua portuguesa, tal a invasão indiscriminada e desnecessária de estrangeirismos -como "holding", "recall", "franchise", "coffee-break", "self-service'- e de aportuguesamentos de gosto duvidoso. Em geral despropositados -como "startar", "printar", "bidar", "atachar", "database"."
O maior mérito do deputado está na abertura da discussão. Salta aos olhos que o anarcoglotismo vigente poderá produzir uma geração de brasileiros que se expressam com palavras de uma língua que não conhecem (o inglês), ao mesmo tempo em que não conseguem se expressar no idioma que conhecem.
Rebelo propõe que a Academia Brasileira de Letras se torne guardiã do idioma e que o uso indevido de palavras estrangeiras seja punido com multas.
A dose parece forte, mas isso não impede, por exemplo, que FFHH recomende aos seus ministérios o uso do idioma português. (A rede do Ministério da Educação na Internet, por exemplo, chama-se Web MEC.)
Na França o governo vigia os estrangeirismo com grande rigor. Já na Alemanha, instalou-se a bagunça.
Tomara que em Pindorama se possa chegar a algum meio-termo.

Novo e ruim
O que está aparecendo de novo na política americana é coisa preocupante. O mais destacado pré-candidato do Partido Republicano é George Walker Bush, governador do Texas, filho do ex-presidente George Bush e neto do senador Prescott Bush. Vindo de uma família do patriciado da Nova Inglaterra, o jovem Bush seguiu os passos do pai e fez fortuna no Texas. Estudou em Yale, mas ganhou dinheiro com petróleo e até com esportes.
Tendo berço, fortuna e poder, George W. Bush referiu-se aos habitantes da Grécia como os "greecians" (em vez de "greeks"). Isso equivaleria a dizer, em português, que Homero foi um poeta grécio.


Classificado
Foi posto à venda o apartamento que Nelson Rockefeller montou em 1934, logo depois de seu primeiro casamento. Fica na cobertura da esquina da 5ª Avenida com a rua 62, em Nova York. A família quer US$ 19,5 milhões, mas o preço parece salgado.
São dois andares (inclusive a cobertura), com sala redonda, 17 cômodos, seis banheiros e quatro lareiras. O apartamento vagou em abril, quando Tod, a primeira mulher de Rockefeller, morreu aos 91 anos.


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