|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
JANIO DE FREITAS
Daí para baixo
Sob acusações que não quer explicar ou não tem como fazê-lo, Lula se concentra
em acusações recíprocas
A CAMPANHA PELA Presidência
degenerou mesmo e não tem
mais salvação. Mas, se é própria da disputa a exploração dos erros e das fraquezas de Lula, do PT e
do governo, a oposição não está
isenta de dividir com os adversários
a responsabilidade pelo baixíssimo
nível do confronto -"como jamais
houve neste país", diria alguém, não
estivesse envolvido. Alckmin e seus
companheiros contribuíram decisivamente, por dois modos principais
e combinados, para a redução da
Presidência a uma presa de luxo e cifrões, disputada por duas hordas
com iguais ambições e armas.
A exploração do dossiê Vedoin, do
dinheirão de origem misteriosa, e
outras criações dos adversários não
impediria Alckmin de apresentar ao
eleitorado, com clareza e precisão,
as idéias que orientariam seu governo em relação aos principais problemas e anseios do país.
Ou porque não tenha idéias assim
ou porque não lhe convenha expô-las à apreciação do eleitorado, Alckmin ficou, quando muito, na vaguidão do tipo "vou melhorar o Bolsa
Família, vou acabar com a corrupção", e nada menos superficial. Relegadas as propostas devidas por todo
candidato à Presidência, reduziu sua
campanha a uma ação de infantaria,
ainda por cima, com armamento
pouco variado.
A segunda contribuição vem da
maneira peculiar como Alckmin e o
PSDB convidam a campanha de Lula a também reduzir a disputa à troca de acusações. Sob acusações ininterruptas que não quer explicar ou
não tem como fazê-lo (presumivelmente, por exemplo, a origem do tal
dinheirão), Lula e sua campanha do
segundo turno concentram-se em
acusações recíprocas. O que não
quer dizer que Lula tenha idéias definidas para um mandato inovador,
mas a Alckmin caberia forçá-lo a
mostrar se as tem ou não. Faz o
oposto.
A campanha de Alckmin e dos
peessedebistas "pela ética" não se
restringe, porém, a acusações ao adversário. Inclui a originalidade ética
de negar o seu passado administrativo e a linha partidária característica.
Negar que o PSDB seja privatista é
falsificação grosseira. Mesmo que
apenas no âmbito estadual: em termos proporcionais aos respectivos
patrimônios, o PSDB no governo
paulista (últimos 12 anos) privatizou muito mais o patrimônio estadual do que o governo Fernando
Henrique conseguiu fazê-lo com o
patrimônio da União.
A defesa das privatizações por
meio de comparações com o passado é, também, outra farsa. Omite o
fato essencial de que as tarifas e os
preços, antes da privatização, eram
contidos pelos governos para evitar
que as correções, ainda que apenas
para repor perdas com a inflação,
aumentassem os subsequentes índices inflacionários. É claro que a expansão da telefonia é imensa: as tarifas foram aumentadas entre 100% e
200% em poucos meses depois da
privatização, além dos financiamentos privilegiados do BNDES. O dinheiro para investimento ficou fácil
e barato. O quilo do aço da Companhia Siderúrgica Nacional, ao tempo
de Mailson da Nóbrega controlando
a economia, custava o mesmo que
um molho de salsa ou cheiro verde
(quando publicada aqui tal relação, o
pasmo de leitores traduziu-se em
centenas de correspondências). E,
mostrou no domingo meu bravo colega Frederico Vasconcelos, Alckmin, antes de deixar o governo, esbanjou dinheiro com "antecipação
de gastos considerados eleitorais".
Texto Anterior: Memória: "República do Galeão" se opôs a Getúlio Próximo Texto: Eleições 2006/Crise do Dossiê: Dinheiro tem origem criminosa, diz Biscaia Índice
|