São Paulo, domingo, 17 de dezembro de 2006

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ELIO GASPARI

Tungas de Natal: IPVA e seguro obrigatório


Mantega fala em desonerar a produção. O aumento do seguro do trator foi maior do que o do carro de passeio

É EMPULHAÇÃO a conversa segundo a qual o governo tem algum remoto interesse em reduzir a carga de obrigações da patuléia. Pelo contrário, precisamente na área do ministro Guido Mantega, da Fazenda, a Superintendência de Seguros Privados aumentou em 11,13% o preço do seguro obrigatório de automóveis. Isso, depois de ter aplicado uma tunga de 43,4% em janeiro passado.
A Susep fez pior. O reajuste das indenizações em casos de morte e invalidez ou com despesas médicas foi de 0,15%. Muito bonito. Paga-se um aumento quase quatro vezes acima da inflação, mas o valor que se recebe é recalculado com um índice 20 vezes menor que a desvalorização da moeda. A cobertura de despesas médicas foi de até R$ 2.696 para R$ 2.700. Em grana real, encolheu. Uma coisa não pode ficar atrelada à outra, mas o que um paga não deve ser reajustado em Júpiter enquanto o que o outro recebe é corrigido em Jurujuba. Considerando-se que a choldra é obrigada a fazer seguro para proteger as vítimas de acidentes, não é difícil perceber que parte de seu dinheiro embebeda-se.
O doutor Mantega fala em desonerar a produção. O aumento do seguro dos tratores (14,8%) foi superior ao dos carros de passeio. A Susep tomou essa medida sem oferecer qualquer explicação ao público. Quando o cardeal Joseph Ratzinger comandava a Santa Inquisição, justificava suas decisões, respeitando os hereges. Registre-se que há um abismo entre a competência teológica de Ratzinger e os segurocratas nacionais.
Junto com o reajuste do seguro obrigatório a escumalha tem esse restinho de ano para contabilizar outros avanços sobre seu bolso. Os governos estaduais reajustaram o valor do IPVA dos veículos. Em quase todos os casos o aumento médio foi superior à inflação. O Rio Grande do Sul manteve os mesmos valores, o Rio pegou leve (3,5% de aumento médio) e São Paulo pegou pesado (6,5%).
Somando-se a tunga do seguro à do IPVA, um Gol 1.0 de 2000 pagará, no ano, R$ 350 em Santa Catarina, R$ 590 no Rio e R$ 620 em São Paulo. Uma família com renda de R$ 1.750 desembolsará entre 1,5% e 3% de sua renda anual com a papelada do possante.
Quem manda pobre querer carro? Deve andar de ônibus. Engano. O aumento das tarifas de transportes vem sendo superior aos índices da inflação e do IPVA. No Rio, 11%. Em São Paulo, 15% para o ônibus e de 16,7% para o tarifa integrada, que permite viajar sobre pneus e trilhos com um só bilhete. (Um trabalhador de Nova York que toma duas conduções para ir e voltar do serviço compra um cartão mensal pelo equivalente a R$ 160. Submetido à voracidade tucano-pefelê que confiscou um desconto parecido, o paulistano paga R$ 198.)
Quanto mais próxima da base da pirâmide, mais a patuléia apanha. Se ninguém cuidar, criarão uma despesa para quem anda a pé.

COMO A BANCA NÃO GOSTOU, A IDÉIA TRAVOU

Em fevereiro completa-se um ano que o então secretário do Tesouro, Joaquim Levy, anunciou sua disposição de licitar a folha de pagamentos do INSS (R$ 11,3 bilhões em 24 milhões de contas). Quando uma idéia agrada a banca, o seguro obrigatório dos carros é reajustado em 60% em menos de 12 meses. Quando desagrada, trava. Levy foi para Washington, mudou-se para o Rio, e nada. Hoje essas contas ficam em 20 bancos, que pagam zero à Viúva. Leiloadas, valem entre R$ 5 bilhões e R$ 10 bilhões a cada cinco anos. Em agosto, o ministro da Previdência, Nelson Machado disse que era necessário fazer mais algumas reuniões para definir a iniciativa. Ele e o secretário do Tesouro, Carlos Kawall, concorrem ao Prêmio Reunião, pois nem no pacote de medidas para socorrer a gestão do INSS o assunto amadureceu. Poderiam recebê-lo com uma grande festa, quando a idéia de Levy comemorar seu primeiro aniversário.

TEATRO NA CORTE
Há dois desfechos possíveis para a reunião de Nosso Guia com líderes partidários de sua Corte: mau teatro ou péssimo teatro. Supor que medidas econômicas complexas possam ser discutidas em poucas horas exige que doutores da coalizão sejam reencarnações de Milton Friedman. Lula faria melhor se convidasse bons atores. Paulo Autran contracenaria com Guido Mantega e Fernanda Montenegro, com Dilma Rousseff.

VINGANÇA
Após perder paciência e tempo no planeta 0800 ouvindo gerúndios insuportáveis, músicas exasperantes e por dez vezes as mesmas perguntas, as vítimas não precisam mais pensar em suicídio. A forra é simples e vem da esperteza da garotada: basta gravar a conversa, anexá-la a imagens ao gosto do freguês e mandá-la para o YouTube. As telefônicas americanas já sentiram esse calor.

JÓIA JANISTA
Graças ao Centro de História e Documentação Diplomática do Itamaraty e ao embaixador Álvaro da Costa Franco, foi publicada uma jóia na última edição dos Cadernos CDDH. São 288 bilhetinhos enviados em 1961 pelo presidente Jânio Quadros ao chanceler Afonso Arinos. Revelam a teatralidade e o provincianismo de Jânio, que usava esses papeizinhos para simular produtividade. Houve um dia em que despachou nove. Pediu ao ministro que ouvisse os donos do cinema Apolo, de SP, interessados em expandir suas projeções. Revelam também como são velhas as novidades de Lula: "Interesse especial pelo Gabão". Há mais bilhetes tratando de inutilidades africanas que de temas europeus ou americanos.

SEGURANÇA
Holger Wettlauer estava na Alemanha quando seu celular foi automaticamente acionado. Sua casa no Guarujá acabara de ser invadida. Foi ao laptop e teve, ao vivo, as imagens do larápio depenando-a. Ligou para São Paulo e, minutos depois, o marginal estava preso. Não há milagre. Uma casa pode ser protegida com programas e câmeras por R$ 10 mil ou R$ 15 mil. Um monitoramento profissional (o que não foi o caso de Wettlauer) custa entre R$ 300 e R$ 1.200 mensais. Cuidado: Há umas 200 firmas nesse mercado. Merecedoras de fé, só umas 20. Em matéria de segurança pública, vai-se de mal a muito pior. Em novembro, surgiu a denúncia de que o aloprado Gedimar Passos reunira-se clandestinamente com Freud Godoy enquanto estava preso na carceragem da PF. Mentira? Bastava conferir os vídeos das câmeras dos corredores. Informaram ao ministro Thomaz Bastos que as fitas são apagadas nos dias seguintes. Há equipamentos que guardam 24 horas num CD. Gravam para apagar?

O'CONNOR E GRACIE
É grande a admiração da ministra Ellen Gracie por Sandra O'Connor, a primeira mulher nomeada para a Corte Suprema dos EUA. Um freqüentador do aeroporto de Washington jura que, com freqüência, viu O'Connor sentada na sala de embarque da ponte aérea para Nova York. Esse curioso suspeita que, se houvesse um apagão nos aeroportos, nem bandidos fariam O'Connor embarcar num jatinho da Viúva para evento em Miami. Seu colega Harry Blackmun, morto em 1999, ia para o trabalho num Fusca azul. Quando as filhas levaram o carro ao funeral, foram barradas pela segurança do cemitério de Arlington.


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