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Operador não consegue esquecer acidente ocorrido em 84
CRISTINA GRILLO
DA SUCURSAL DO RIO
Quase dezessete anos depois, o
operador de produção Luís César
Nascimento, 40, ainda não conseguiu apagar de sua memória as
cenas da madrugada do dia 16 de
agosto de 1984.
Nessa data, 37 das 220 pessoas
que estavam na plataforma Enchova-1 morreram quando a embarcação na qual tentavam fugir
de um incêndio despencou no
mar, de uma altura de 30 metros.
Durante duas horas e meia,
Nascimento lutou para escapar
com vida do maior acidente da
história da Petrobras, ocorrido na
bacia de Campos, a 82 km do litoral. "Eu vou morrer. Era a única
coisa que conseguia pensar", contou Nascimento à Folha.
O operador de produção, que
estava prestes a completar um
ano na empresa quando houve o
acidente, estava trabalhando
quando notou um vazamento
anormal de água perto de onde
estava. Ao sair de seu posto para
avisar um supervisor, ouviu uma
explosão.
Nascimento conta que, seguindo as normas de segurança, correu para a sala de controle para receber orientação e de lá seguiu para um dos pontos de encontro
predeterminados.
Baleeiras
"Houve outra explosão e eu via
uma chama enorme, de 20 metros
de altura, bem perto de onde estávamos. O pessoal da segurança
disse que não havia como controlar o incêndio e nos mandou para
as baleeiras", relembra o operador de produção.
Enchova-1 tinha cinco baleeiras,
embarcações de fibra de vidro
com capacidade para 50 pessoas
cada uma e pesando cerca de 10
toneladas.
As baleeiras eram sustentadas
por dois cabos de aço. Acionada
uma engrenagem, os cabos desciam as embarcações até o mar.
"Ficamos esperando uma ordem para descer, mas, depois de
algum tempo, nos mandaram sair
e voltar ao ponto de encontro."
Nascimento conta que não entendeu o motivo da determinação, mas, ao sair, teve um choque:
viu que a embarcação que estava
ao lado da sua havia despencado
no mar. A queda teria sido causada por superlotação -havia 57
pessoas embarcadas.
"Vi um pedaço da baleeira preso no cabo de aço. Muitas pessoas
se descontrolaram, ficaram nervosas. Percebi que não tinha como fugir daquele lugar. Só pensava que ia morrer, não conseguia
pensar em mais nada.
"De um lado, o incêndio ameaçava tomar conta da plataforma.
Do outro lado havia o mar. Um
amigo meu estava morto. Não havia saída para nós."
Escada
A saída veio com a ordem para
que todos descessem por uma pequena escada de uma das pilastras
de sustentação -a uma altura de
cerca de 30m- e se jogassem ao
mar no fim da escada.
"Pulei a cerca de 2 metros do
mar. Nem sabia mais o que estava
fazendo. Um barco me resgatou
logo depois. Foram duas horas e
meia de inferno", conta o operador de produção.
Nascimento voltou a Enchova
45 dias depois do acidente. "Pensei em largar o emprego, mas acabei voltando. Foi muito difícil pisar lá outra vez. Tive uma sensação muito esquisita."
O operador conta que os sobreviventes montaram uma espécie
de grupo de ajuda informal. "Não
houve psicólogos, não houve ajuda da empresa. Nós nos ajudávamos. Não deixávamos ninguém
sozinho, estávamos sempre
acompanhados", relembra.
Dois anos depois, Nascimento
passou por novo susto. Uma peça
de aço, pesando cerca de 20 toneladas, despencou da torre de perfuração, furando a plataforma até
cair no mar.
"Quando ouvi aquele barulho,
entrei em pânico. Quase desmaiei, fiquei totalmente descontrolado", conta o operador, que
continua trabalhando em plataformas.
Tensão e comprimidos
A tensão da vida em uma plataforma e a irregularidade nos horários fazem com que muitos trabalhadores usem comprimidos
para dormir, afirma Luís César
Nascimento.
"Há muita tensão a partir da segunda semana embarcado. O
tempo não passa e a impossibilidade de sair na hora que se quiser
faz com que a pressão seja muito
grande. Eu não tenho filhos, mas
quem tem sofre muito", diz.
Os trabalhadores em plataformas marítimas trabalham em
uma escala de 14 dias embarcados
por 21 dias de folga. Até 1988, para
cada 14 dias em plataforma eram
concedidos 14 dias de folga.
Há um rodízio no horário de
trabalho durante as duas semanas
na plataforma. Na primeira semana, o funcionário trabalha das 7h
às 19h; na segunda, das 19h às 7h.
O "dia da virada" -o oitavo dia
de trabalho, quando o empregado
troca de turno- é o pior.
"A gente tenta se adaptar. Se está no turno do dia, trabalha até as
19h, dorme até as 4h30, volta às
5h, trabalha até as 14h, dorme de
novo e volta ao trabalho às 23h.
Vários tomam comprimidos para
dormir. No nono dia, já estamos
adaptados ao horário", explica
Nascimento.
Jogos e ginástica
O operador conta que, para tentar diminuir a tensão dos funcionários e distraí-los nas horas de
folga, a Petrobras instala quadras
de futebol de salão, equipamentos
de ginástica e salas de jogos nas
plataformas.
"Depois de uma semana ninguém aguenta mais esses lugares.
Em algumas plataformas, o barulho é tão grande e a gente sai tão
cansado do trabalho que só quer
saber de dormir", diz.
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