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CÂMARA OCULTA
Programa para servidores viciados em drogas e álcool tem 147 nomeados e atende entre 20 e 30 por ano
Câmara usa projeto assistencial como cabide
JAIRO MARQUES
EDUARDO SCOLESE
DA AGÊNCIA FOLHA
RUBENS VALENTE
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA
Em três pequenas salas do 9º e
do 23º andares do prédio principal da Câmara dos Deputados,
em Brasília, funciona o maior cabide de cargos vips da Casa, a Cope (Coordenação de Programas
Especiais).
No papel, há 147 CNEs (Cargos
de Natureza Especial) nomeados
para o setor pelo presidente da
Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP). Mas apenas três são encontrados trabalhando no local. Os
CNEs são nomeados sem concurso público, recebem entre R$
1.680 e R$ 7.428 e podem ter o
ponto liberado por deputados.
A Folha localizou em São Luís
(MA) um dos ocupantes de CNE
na Cope, a dentista Clarissa Cabral Trinta, 23, filha do ex-deputado federal Remi Trinta (PL).
Recém-formada em odontologia -o pai também é dentista-
além de não saber dizer exatamente o que faz na coordenadoria, mora na capital do Maranhão
e tem outra atividade profissional.
"Tem mais de um ano que faço
esse trabalho para a Câmara. Mas
deixa eu falar uma coisa: eu não
queria estar respondendo essas
coisas porque eu trabalho aqui
em São Luís e, além desse trabalho, eu desempenho outros trabalhos. Sou dentista também. Até
deixei de lado um pouco [o trabalho da Câmara]. Eu não tenho
acompanhado mais nada em relação a isso. Estou vendo a minha
outra parte [odontologia no MA],
que é o que eu quero fazer também", disse Clarissa, por telefone.
Indagada se pretende abandonar a função na Câmara, ela disse:
"Não pretendo me desligar, mas
quero fazer o que eu gosto".
Clarissa declarou que, apesar de
estar lotada na Cope, seu trabalho
era para "um deputado do PL"
em São Luís. O cargo que ocupa
prevê um salário de R$ 2.000.
Oficialmente, o grupo de 147
cargos vips da Cope tem três tarefas básicas: recuperação de servidores viciados em álcool e drogas,
acompanhamento escolar de jovens estagiários na Casa e cadastramento dos próprios ocupantes
de CNEs.
O Prodeq (subprograma de dependência química) atende
anualmente de 20 a 30 servidores.
Se um terço dos CNEs se dedicasse à tarefa, haveria cerca de dois
assessores para cada viciado. Na
prática, a Cope funciona como
um fornecedor de CNEs para tarefas políticas de lideranças e gabinetes parlamentares.
Reportagens anteriores da Folha mostraram que funcionários
voltados para funções administrativa da Mesa e das comissões
permanentes também estão
atuando em trabalhos políticos
para deputados e lideranças partidárias.
Fora de posto
A reportagem localizou no gabinete do deputado federal e presidente nacional do PP, Pedro Corrêa (PE), em Brasília, a assessora
de imprensa Isadora de Paula
Fonseca. Ela disse não saber que
estava lotada na Cope. "Trabalho
muito, de manhã até a noite. Não
tenho um lugar fixo ainda, mas fico indo de gabinete em gabinete
do partido", afirmou Isadora.
Ex-participante do "Ilha da Sedução", "reality show" do SBT, e
ponta da novela "Estrela Guia",
da Rede Globo, Isadora disse que
uma de suas funções é atender a
imprensa. "Não tenho nenhuma
regalia, assino o ponto todos os
dias." Corrêa não foi localizado
para falar sobre o assunto.
O uso de CNEs da Cope por partidos não é uma exclusividade do
PP. Também o PT, por meio do
deputado federal Roberto Gouveia (SP), adota a prática.
No escritório de Gouveia em
São Paulo trabalha Marisilda Silva, lotada na Cope. Segundo o deputado, ela exerce uma função
"indispensável" na Comissão de
Seguridade Social e Família. Gouveia é o vice-presidente da comissão. "Ela roda o Brasil, São Paulo e
Brasília", disse Gouveia.
Indagado sobre a razão de Marisilda estar lotada na Cope, ser localizada em seu escritório político
em São Paulo e prestar serviços
para a comissão da Casa, Gouveia
afirmou: "Estou chegando agora à
Câmara [primeiro mandato].
Não me ative a esses detalhes. O
presidente da Câmara [João Paulo] é que decide isso. Eu apenas
pedi que ela fosse contratada".
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