São Paulo, sábado, 18 de agosto de 2007

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Na Sé, "Cansei" desemboca em "fora, Lula"

Ato liderado pela OAB-SP e empresários reúne 2.000, entre artistas e celebridades; organizadores reprovam vaias ao presidente

Evento foi marcado para lembrar um mês do desastre aéreo, mas parentes das vítimas não tiveram acesso a palanque armado na praça

LAURA CAPRIGLIONE
PAULO SAMPAIO
LEANDRO BEGUOCI

DA REPORTAGEM LOCAL

O minuto de silêncio convocado ontem na praça da Sé pelo Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros, o Cansei, em memória das vítimas do acidente com o avião da TAM, reuniu cerca de 2.000 pessoas, segundo a Polícia Militar, e 5.000, segundo os organizadores.
Sem uma palavra de ordem que sintetizasse um cansaço específico, os manifestantes gritaram "fora, Lula!" depois do Hino Nacional, cantado por Agnaldo Rayol. Em cima do palco, as lideranças do movimento, como o presidente da OAB-SP, Luiz Flávio Borges D'Urso, e o empresário João Doria Jr. se mantiveram em silêncio.
A data da manifestação foi escolhida em função dos 30 dias do desastre, mas os parentes das vítimas não subiram no palanque armado na porta da Catedral da Sé. D'Urso disse que Sandra Assali, presidente da Associação Brasileira de Parentes e Amigos das Vítimas de Acidentes Aéreos, representou as famílias no evento.
De acordo com a organização, o palco podia abrigar apenas 80 pessoas. Entre elas, Hebe Camargo, Ivete Sangalo, Paulo Vilhena, Wanderléa, Agnaldo Rayol, Fernando Scherer (Xuxa) e Osmar Santos.
"Os artistas aqui na frente, por favor. Hebe querida, vem. João Dória...Wandeca, eterna Ternurinha; Agnaldo Rayol, a voz inesquecível...", dizia o mestre de cerimônias, o advogado João Baptista de Oliveira, conselheiro da OAB, entidade que encabeça o movimento.
Ivete Sangalo foi a grande estrela, sem dizer nada durante o ato. O público se espremia e gritava o nome dela, mas era impossível se aproximar por conta dos guarda-costas que a protegiam. "Estou aqui em prol do Brasil", disse a cantora à Folha.
Ao todo, 20 seguranças particulares cercavam o palco.
Em entrevista ao final do evento, Doria e D'Urso disseram respeitar o "fora, Lula", mas declararam discordar dele. "Não apóio, não é um movimento democrático para o país", afirmou o empresário.
Houve vaias ao presidente misturadas ao "fora, Lula". D"Urso afirmou que elas não atrapalharão a relação do "Cansei" com o governo e diz que já pediu uma audiência com o presidente para levar a cabo uma segunda etapa. "O movimento não se resume ao minuto de silêncio. É o primeiro passo de diálogo permanente com o governo, com propostas para ajudar o Brasil."
Não há previsão de novas manifestações. O "Cansei" surgiu após o acidente com o avião da TAM, adotou motes como "cansei do caos aéreo" e "cansei de CPIs que não dão em nada" e até ontem contava com o apoio de 63 entidades, como a Fiesp e a Associação Comercial de São Paulo, além de empresários como o presidente da Philips, Paulo Zottolo -que não foi à Praça da Sé ontem.
Em entrevista ao jornal "Valor Econômico", Zottolo disse: "Não se pode pensar que o país é um Piauí, no sentido de que tanto faz quanto tanto fez. Se o Piauí deixar de existir, ninguém vai ficar chateado". Ele já se desculpou pela declaração.

Hino, Exército e Deus
João Batista de Oliveira, o mestre de cerimônias, evocou o o espírito militar e misturou um pouco mais as coisas na cabeça de quem tentava entender as intenções do movimento: "Não queremos guerra. É como diz o hino do Exército: "A paz queremos com fervor, a guerra só nos causa dor, porém se a pátria amada for um dia ultrajada, lutaremos com fervor'".
Padre Antônio Maria, que casou Daniella Cicarelli e Ronaldo, é chamado para falar: "Hoje, Deus diz pra nós: "Estou cansado". Deus está cansado".
Hebe Camargo chegou a bordo de um Mercedes Benz F-65 preto, com motorista, e saltou na porta da OAB. "Eu sempre participei de movimentos. Tenho fotos minhas de 40 anos atrás, na rua. Eu sou do povo!", disse ela, escoltada por seguranças, enquanto seguia pelo acesso gradeado que levava ao palanque. "Ô Hebe "Maluf" Camargo! Fez campanha pra ladrão a vida toda e agora está cansada!", grita, na direção da apresentadora, o engenheiro José Carlos Caldeira Braga, 70.
Segurando por trás nos dois ombros de Hebe Camargo, a empresária Ana Luiza Massari, que se diz indignada, explica o que faz ali pendurada: "Eu não sou ninguém, sou só amiga dela. Na verdade, sou dona de uma clínica estética", diz ela.
Longe do palco, cartazes de indignação confundiam quem esperava palavras de ordem.
O dublê Luiz Alexandre da Silva, 36, se dizia "cansado da hipocrisia e da pornografia que a TV mostra todos os dias": "Minha mãe aprendeu na TV que sexo é normal e, por causa disso, eu não conheci meu pai". A professora Jane Rocha, 48, que não tinha idéia do que se passava, afirmou: "O que é isso? Cansei? Estou exausta!"
Entre os "cansados do Cansei" estavam a artesã e cozinheira Conceição Aparecida dos Santos: "Os pobres é que estão cansados. Pedi aos organizadores para falar ao microfone, não deixaram. Moro em uma ocupação aqui no centro, e eles estão para nos despejar".
A socialite Maria Christina Mendes Caldeira, ex de Valdemar Costa Neto, deputado do PR (ex-PL) que foi acusado de fazer caixa dois na época do mensalão e renunciou, mencionou seus planos para o futuro: "Nos Estados Unidos, há punição para corruptos, por isso vou pegar minha cidadania americana", disse Christina.


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