São Paulo, Quinta-feira, 19 de Agosto de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ELDORADO DO CARAJÁS
Jurados consideraram as provas insuficientes; anulação de julgamento pode ser pedida
Oficiais de massacre são absolvidos


LUCAS FIGUEIREDO
enviado especial a Belém

LUÍS INDRIUNAS
da Agência Folha, em Belém


Foram absolvidos os três mais graduados oficiais da operação da Polícia Militar que resultou na morte de 19 sem-terra em Eldorado do Carajás (sul do Pará) em abril de 1996. A acusação vai recorrer.
Após 43 horas de julgamento, o comandante da operação, coronel Mário Colares Pantoja, foi absolvido por 4 votos a 3. O major José Maria Oliveira e o capitão Raimundo José Almendra também foram inocentados, ambos por 5 votos a 2. Os jurados consideraram que as provas contra os três eram insuficientes.
Após a leitura da sentença, à 0h30 de hoje, cerca de 300 sem-terra, em princípio, ficaram em silêncio e, em seguida, começaram a gritar: "Assassinos, assassinos". Depois ameaçaram invadir o auditório da Universidade da Amazônia, onde foi o julgamento.
Houve tumulto quando manifestantes se aproximaram do cerco do Batalhão de Choque da Polícia Militar e começaram a atirar velas. A PM avançou, e três manifestante foram presos. A polícia previa tumultos na madrugada.

Anulação
Um dos sete jurados emitiu opinião antes do final do julgamento, contrariando determinação do Código de Processo Penal. Com base nesse fato, a acusação irá pedir a anulação do julgamento.
Após os debates da acusação e da defesa, o juiz Ronaldo Valle perguntou aos jurados se eles queriam tirar alguma dúvida antes de se reunirem para votar pela absolvição ou condenação.
O jurado Sílvio Queiroz Mendonça pediu para ver novamente a fita de vídeo que mostra cenas do confronto entre policiais e sem-terra. Depois apontou, com uma caneta de luz, fumaça saindo do lado dos sem-terra.
"Agora fica comprovado que havia sem-terra armado no começo do conflito", opinou. "O senhor não pode emitir opinião", advertiu o juiz.
O promotor pediu que outra afirmação do jurado, sobre a presença de pólvora nas mãos de uma das vítimas, fosse registrada nos autos.
"O jurado emitiu opinião e pode ter influenciado seus colegas. Se os réus forem absolvidos, esse fato pode ser usado para pedirmos a anulação do julgamento", disse Nilo Batista, assistente de acusação e ex-governador do Rio, antes da divulgação do veredicto.

Considerações finais
Durante o julgamento, nas alegações finais, o promotor Marco Aurélio Nascimento projetou fotos dos cadáveres e exibiu cenas gravadas por uma equipe de TV no momento do conflito.
Nilo Batista comparou os réus aos líderes do nazismo, que deixaram seus subordinados perseguirem judeus na Segunda Guerra.
Representando a defesa, o advogado Américo Leal afirmou que os sem-terra são um "bando de forasteiro", mas estão sendo considerados "vacas sagradas".
O líder no MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) João Pedro Stedile se mostrou indignado com a decisão: "É mais uma vergonha nacional."
Até dezembro, serão julgados por homicídio doloso (intencional) outros 147 policiais que participaram, como subordinados, da ação comandada pelos réus absolvidos na madrugada de hoje.
Começa hoje o julgamento de mais quatro oficias, os tenentes Jorge Nazaré dos Santos, Natanael Guerreiro Rodrigues, Sérgio Marques da Silva e Raimundo de Souza Oliveira.


Texto Anterior: Manifestante quer voltar para casa
Próximo Texto: Mobilização de entidades e autoridades é pequena
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.