|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Governo federal privilegia prefeituras da base aliada
Entre as 100 maiores cidades, 26 das 30 mais beneficiadas são de partidos da base
PT controla 11 desses 26 municípios; entre as 30 cidades que foram menos
favorecidas por convênio neste ano, só 2 são do PT
RANIER BRAGON
JOHANNA NUBLAT
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A 11 meses das eleições municipais de 2008, o governo Luiz
Inácio Lula da Silva privilegia
prefeituras aliadas na liberação
de verbas federais de investimento. Mapa da distribuição
das verbas por meio de convênio com as cem maiores cidades do país mostra que das 30
mais beneficiadas proporcionalmente pelo governo em
2007 (reais por habitante), 26
são comandadas por partidos
aliados, sendo 11 do PT.
A cidade "oposicionista"
mais bem colocada no ranking
é Montes Claros (MG), governada pelo PPS, que aparece na
19ª posição. O município recebeu uma média de R$ 40,7 por
habitante; a primeira da lista,
Boa Vista, comandada pelo
PSB, recebeu, em média,
R$ 186,4 por habitante.
No lado oposto da lista, o das
30 cidades que menos recursos
receberam, proporcionalmente, 11 são comandadas pela oposição. Apenas duas são do PT
-Londrina (PR), na 86ª posição, e Viamão (RS), na 78ª.
Feita de outra forma, a conta
revela que as prefeituras governistas receberam 73% do R$ 1,5
bilhão destinado pelo governo
federal para esses convênios,
apesar de governar 62% da população dessas cidades. Os oposicionistas receberam 26% dos
recursos, embora governem
37% da população.
Na comparação entre partidos, o PT, que comanda 21% da
população das maiores cidades,
recebeu destinação de 27% dos
recursos. O aliado PMDB, com
15% dos munícipes, ficou com
18% da destinação. Os partidos
da oposição, que dirigem 25%
(DEM) e 12% (PSDB) dos habitantes, receberam, respectivamente, 19% e 6% dos recursos.
"Eu diria que, na qualidade
de petista e de uma pessoa que
conhece o Lula, eu deveria ser
mais privilegiado. Estou tentando tirar R$ 18 milhões desde
2002. Até costumo reclamar
quando encontro com ele. A cidade é pobre. Sem esse recurso,
não só eu como prefeito nenhum consegue fazer obras de
infra-estrutura", diz o prefeito
de Embu (SP), Geraldo Leite da
Cruz (PT), que está em seu segundo mandato.
A prefeitura foi destinatária
de R$ 13 milhões de verbas federais em 2007, o que a coloca
como a 11ª mais beneficiada
proporcionalmente. O dinheiro, diz o prefeito, foi usado em
saneamento, urbanização de
favela e reconstrução de casas.
Privilégio
Com a experiência de já ter
vivido as duas situações no governo Lula, a de oposicionista e
a de aliado (atual cenário), o
prefeito de Campo Grande,
Nelson Trad Filho (PMDB), reconhece que há privilégio.
"O presidente Lula sempre
soube separar isso, essa coisa
de partido. Mas a gente sabe
que na parte do staff de baixo
isso é algo que é levado em conta sim", disse Trad, que, além
dos R$ 42 milhões já obtidos
neste ano, disse ter conseguido
na última semana aval do
BNDES para a liberação de R$
10 milhões para habitação e saneamento em Campo Grande.
Outros prefeitos ouvidos pela Folha disseram que, além do
bom relacionamento com o
Planalto, pesam também para a
liberação a apresentação de
bons projetos, para que não haja entrave na análise técnica, e
o trabalho da bancada de deputados federais e senadores.
Um exemplo é São Vicente
(SP), que tem nesta legislatura
o ex-prefeito Márcio França
como representante da cidade
na Câmara, ocupando o posto
de líder da bancada do PSB.
"Sem dúvida, o salto de uma
cidade que não tinha um deputado representante e hoje tem
fica nítido até nos números, pelo volume de repasses do ano
passado para este ano já se percebe um trabalho forte", diz o
prefeito Tércio Garcia (PSB). A
cidade é a 7ª mais beneficiada
proporcionalmente.
Também em 2004
Em 2004, também houve direcionamento das verbas para
aliados -das 50 cidades mais
beneficiadas, 26 eram administradas pelo PT. O resultado das
urnas, porém, mostrou que o
dinheiro pode não ter sido decisivo: os petistas só elegeram o
prefeito ou foram ao segundo
turno em 18 dos 50 municípios.
Prefeito de uma cidade que
está na parte de baixo da lista,
Fuad Gabriel Chucre (PSDB),
diz que Carapicuíba (SP) "a vida inteira foi um município
abandonado". Antes de ser informado sobre as 30 cidades
mais beneficiadas, completou:
"Com certeza, foram do PT".
"Tenho a impressão que ser
da oposição dificulta um pouco
mais [a liberação das verbas]. O
diálogo entre pessoas do mesmo partido é mais fácil, a pessoa pede mais e se beneficia
mais", disse. Carapicuíba está
em 70º na lista, com destinação
de R$ 3 milhões em 2007.
A responsabilidade final pela
liberação de verbas federais para o convênio com as prefeituras não está concentrada em
apenas um ministério, mas diluída entre eles.
"Coincidência"
Líder da bancada governista
na Câmara, José Múcio (PTB-PE), diz que os dados refletem
uma coincidência, já que, segundo ele, a liberação obedece
apenas a critérios técnicos.
"Isso é coincidência, não tem
absolutamente nada a ver uma
coisa com outra. Os critérios
são técnicos. Está se liberando
emenda de oposição. São Paulo,
Minas Gerais e Rio Grande do
Sul [comandados por governadores de oposição] têm sido
grandes beneficiários dos programas do governo", afirma.
O ministro Walfrido dos Mares Guia (Relações Institucionais), responsável pela liberação de parte desses recursos (os
que foram inscritos no Orçamento por meio de emendas do
parlamentares), também repete que o atendimento ocorre de
forma indiscriminada.
A Folha tentou falar com
Romênio Pereira, Secretário
Nacional de Organização do
PT, responsável pela coordenação das candidaturas petistas
em 2008, mas assessores informaram que ele estava em viagem a Fortaleza e havia perdido o telefone celular.
"Isso sempre foi assim, mas
no governo Lula tem piorado
muito. Os grandes projetos para a cidade do Rio de Janeiro,
para os quais a gente precisa de
aval, de fato o governo tem boicotado. Agora, na relação na
ponta, de alguns ministérios,
principalmente o Ministério
do Desenvolvimento Social, a
relação tem sido muito correta", diz o presidente do DEM,
Rodrigo Maia, cujo pai, Cesar
Maia (DEM), é prefeito do Rio.
Os números da reportagem
são baseados em um cruzamento feito pela Folha com
base em dados coletados no
Siafi (sistema de acompanhamento de gastos federais) pela
assessoria de Orçamento do
DEM no Congresso. Reúnem
empenhos (compromisso de
gasto) e valores pagos em 2007,
além de valores de Orçamentos
anteriores pagos neste ano.
Texto Anterior: Painel Próximo Texto: Município com 18 mil pessoas ocupa 7º lugar em verbas destinadas Índice
|