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MUNICÍPIOS
Ricardo Murad (PSB), 43, tio do universitário Rômulo Augusto Trovão, 25, administra Coroatá
Prefeito no MA vive e estuda em S. Paulo
MÔNICA BERGAMO
da Reportagem Local
Estudar e trabalhar ao mesmo
tempo é uma realidade para milhares de estudantes brasileiros.
Rômulo Augusto Trovão, 25
anos, no entanto, conseguiu uma
proeza: estuda engenharia na
Universidade Mackenzie, em São
Paulo, e trabalha no interior do
Maranhão, a 3.488 quilômetros
de distância. E não se trata de um
emprego qualquer: Rômulo Augusto é prefeito de Coroatá, município de 55 mil habitantes do interior do Estado.
Como o prefeito administra a
cidade sem nunca estar lá? "Meu
tio me ajuda", afirmou ele na semana passada ao professor Antonio Pena, que dá aula de fundações no Mackenzie. "Mas como é
isso?!", espantou-se o professor.
É isso mesmo. Há duas semanas, enquanto Rômulo andava esbaforido pelos corredores do
Mackenzie para saber dos professores se havia passado de ano, seu
tio, Ricardo Murad (PSB), 43, dava ordens a torto e a direito em
Coroatá. Ainda ligava para o celular do prefeito para saber se ele estava tirando boas notas.
No meio de uma reunião com o
Secretário de Orçamento, Manoel
Ponte, na sala do próprio prefeito,
Ricardo recebeu a notícia: "Rominho passou de ano!".
Foi uma felicidade. De tanto viajar nos finais de semana para Coroatá, e faltar às segundas-feiras,
Rominho estava de dependência
em oito matérias.
O prefeito é uma espécie de Celso Pitta do tio. Só foi eleito graças
à popularidade de Ricardo. Ao
contrário do afilhado de Paulo
Maluf, no entanto, jura que nunca
vai brigar com o padrinho.
Rominho cursava o primeiro
ano de engenharia, em 1996,
quando foi eleito. Assim que tomou posse, nomeou o tio para a
Secretaria de Governo. Deu a ele
amplos poderes para governar e
retomou os estudos.
A maior qualidade de Rominho
é esta: um chefe que goza da absoluta confiança do subordinado.
"Ricardo precisava de alguém
que nunca o traísse", diz Rominho. "É o primeiro mandato do
Rominho. Eu jamais o deixaria
só", retribui o tio. "Ele não podia
parar de estudar. Seria um crime
fazer isso com o menino."
Rominho recebe salário de R$
3.000,00. Paga aluguel e mensalidade da escola. A prefeitura paga
a metade de suas passagens aéreas. O pai de Rominho, Rômulo,
ainda manda mesada, algo como
R$ 2.000,00 por mês.
A eleição de um estudante que
vive em São Paulo para dirigir Coroatá é apenas uma entre as diversas histórias que transformaram
Ricardo Murad em personagem
ilustre no Maranhão.
Ricardo é famoso também pelas
brigas que trava com a própria família -ele é irmão de Jorge Murad, marido da governadora Roseana Sarney- e pela habilidade
antiga de administrar Coroatá
sem nunca ter sido prefeito.
Em 1992, Ricardo se candidatou
à prefeitura e colocou como vice a
mulher, Teresa. Venceu as eleições. Tudo ótimo, a não ser por
um problema: ele era deputado
federal. Ao assumir a prefeitura,
perderia o mandato em Brasília.
Pensa daqui, pensa dali, encontrou a solução. "Não apareci para
tomar posse. Sumi", lembra. A vice, Teresa, mulher de Ricardo, virou prefeita. O marido mandava.
Foi o início do que Ricardo chama de "República Livre do Maranhão". "Só nós temos coragem de
fazer oposição à família Sarney."
Ele brigou com o ex-presidente
em 1992, quando Sarney se negou
a lançá-lo ao governo do Estado.
Na primeira campanha da cunhada Roseana Sarney ao governo, em 1994, Ricardo ia à televisão
dizer que Sarney não trabalhava.
"Eles não trabalham mesmo. Sabe
o que a Roseana faz o dia inteiro?
Ela joga baralho. Quem manda no
governo é meu irmão."
Em 1997, Roseana se casou com
Jorge, com quem já vivia. Ricardo
diz que ela só oficializou a união
para que ele, como seu parente, ficasse impedido por lei de se candidatar ao Senado.
"Ninguém no Maranhão sobrevive em guerra com Sarney", diz.
Ele relata o caso de um médico
que, por ser seu amigo, foi acusado de fraudar o Sistema Único de
Saúde. "Tu acha que um médico
vai fazer parto num homem? Inventaram, por perseguição."
Por isso, na hora de escolher o
candidato à sucessão de sua mulher, Ricardo optou pelo próprio
sobrinho. "Coloquei o Rominho
para resguardar os amigos." O
slogan da campanha foi: "Vote
Rominho. Ricardo continua".
Dono da TV local, que ganhou
quando Sarney era presidente, e
sócio de uma rádio, Ricardo Murad é uma versão moderna dos
antigos coronéis do interior.
Mandou colocar TVs em todas
as praças, para que as pessoas
possam jogar baralho, dominó,
bater papo e assistir novela.
Instalou postos policiais nas entradas da cidade. Determinou que
todo funcionário público -inclusive o prefeito- use uniforme
com o nome do cargo que ocupa
bordado em lugar visível. Criou a
Farmácia Popular, que vende remédio a preço de custo.
Construiu um complexo de lazer, onde são realizados bailes para 7 mil pessoas. É tanta gente, bebendo tanta cerveja, segundo ele,
que os banheiros femininos não
deram conta da demanda.
Ricardo mandou construir uma
parede com uma barra de ferro.
As mulheres seguram na barra e,
agachadas, fazem xixi. "A tecnologia é de Campina Grande, na
Paraíba, que reúne milhares de
pessoas na festa de São João", diz.
Ao caminhar pela cidade, ele é
abordado por sem-terra que ocuparam terrenos e por professoras
que lhe pedem a distribuição de
camisinhas nas escolas.
"Quando Rominho está junto
do Ricardo, é a maior dificuldade.
Eu só sei falar com o Ricardo. É ele
quem acompanha os problemas e
sabe como resolver", diz a secretária de Saúde, Jesus Monteiro.
A confusão é grande também
entre os coroataenses. "Quem
manda aqui é Ricardo, mas o prefeito é Rominho. Pelo menos assim diz Ricardo, não é?", diz Juvenal Carvalho, 39. "Ricardo é o
chefe, porque o menino ainda é
bem novinho, entende?", diz a comerciante Conceição da Silva, 55.
Rominho agora está passando
férias em Coroatá, e já prepara a
campanha da reeleição. "Aí, sim.
Vou estar formado e livre para administrar a cidade para valer."
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