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ANÁLISE
Texto lembra "Brasil Grande"
IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
PERDIDA em obviedades
e alguns delírios que remetem ao "Brasil Grande" da ditadura, uma passagem
da Estratégia Nacional de Defesa deverá chamar a atenção de
observadores externos. Trata-se da referência ambígua às
pretensões nucleares do país.
Afirma que, "por imperativo
constitucional e por tratado internacional, privou-se o Brasil
da faculdade de empregar a
energia nuclear para qualquer
fim que não seja pacífico" e que
"fê-lo sob várias premissas, das
quais a mais importante foi o
progressivo desarmamento nuclear das potências".
"O Brasil zelará por manter
abertas as vias de acesso ao desenvolvimento de suas tecnologias de energia nuclear. Não
aderirá a acréscimos ao Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares sem que as potências nucleares tenham
avançado na premissa central
do tratado: seu próprio desarmamento", diz o documento.
Se ressalta que não quer a
bomba, o texto não se mostra
confortável com isso. O Brasil
sempre buscou sua independência na área. Mas, ao colocar
esse desagrado em um documento da área de defesa, muda
o tom. Cabe lembrar: apenas
uma resistência a expor sua
tecnologia de centrífugas de
enriquecimento de urânio, o
país foi posto sob suspeição pela Agência Internacional de
Energia Atômica.
O ponto é fiel ao espírito nacional-belicista do plano. O documento apresenta uma ruptura à tendência pós-redemocratização de espezinhamento das
questões militares. Ironia histórica ser o governo de antigos
antípodas dos militares a dizer
que o Brasil deve estar "pronto
para a guerra".
Nesse sentido, contudo, está
sua fraqueza. O plano é grandiloqüente, mas dificilmente será
implementado. Tudo dependeria de muito dinheiro. Só em
pensões e salários são gastos
quase 80% do orçamento dos
militares. Restará aos outros
investimentos a tesoura que virá com a crise.
Assim, soa como uma piada a
promessa de construção de um
caça de "quinta geração" no
Brasil. Nem é certo que a FAB
terá os seus US$ 2 bilhões para
comprar seus caças em 2009.
Na área naval, um acerto: deixar de lado o fetiche por porta-aviões e focar em submarinos.
Mas enfatiza os nucleares. Defesa de costa é melhor executada com os convencionais. Nuclear é arma de ataque. Isso o
plano, "Brasil Grande" em seu
coração, não diz.
Os militares mantiveram o
serviço militar obrigatório. Ao
mesmo tempo, o texto preconiza a necessidade de tropas de
reação rápida. A experiência internacional mostra que serviço
obrigatório é incompatível com
profissionalização das tropas,
pré-requisito para mobilidade
e eficácia.
Ficou de fora do plano uma
proposta incisiva sobre o uso de
soldados no policiamento. Por
outro lado, a necessidade de
controlar "organizações ou indivíduos" que atentem contra a
soberania da Amazônia, leia-se
ONGs gringas, é clara.
Por fim, a estratégia cita em
vários momentos a necessidade de capacitação da indústria
bélica, visando a independência do país. Isso foi tentando no
passado, e mostrou limitações.
Uma alternativa mais realista
seria o estímulo a parcerias.
Não há, no mundo globalizado,
tempo e dinheiro para o Brasil
ser independente nessa área.
Mas é provável que essa seja
a parte do plano mais rapidamente atendida. Afinal de contas, a receita para a capacitação
é o fim de exigências licitatórias
e vastas isenções tributárias.
Coisas de que políticos e empresários brasileiros entendem
muito bem.
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