São Paulo, domingo, 20 de março de 2005

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JANIO DE FREITAS

E chamam de reforma

É impossível calcular a dimensão do prejuízo, mas não há dúvida de que recairá em quase todos os cantos e recantos do país e da vida dos cidadãos. Em parte, até já está aí.
Será a terceira formação de novo ministério em dois anos e três meses de governo. E Lula está enrolado nesse desatino, um vai-e-volta que gira a cada 24 horas, há nada menos do que sete meses. Mais de meio ano. Em agosto do ano passado o noticiário já incluía discussões palacianas sobre a conveniência de nomear logo os novos ministros ou esperar os resultados eleitorais. Neste ano, a cada semana a reforma é anunciada para a seguinte, como o próprio Lula fez na quinta-feira 10 para a semana que acabou agora - sem a "reforma acertada", como as últimas 30 semanas.
Todo esse imensurável tempo de governantes, parlamentares, jornalistas e outros desperdiçadores habituais estaria justificado, talvez, se ao fim comunicassem algo respeitável. Impossível. Estão enrolados nas discussões e combinações mais torpes e desrespeitosas com o país e com cada cidadão. Tudo é em torno de cupinchadas, onde pôr o cara do Severino, e então deslocar o Eunício pra onde, tem que arrumar mais um ministério qualquer pro PTB, esse é meu, diz à fulana e ao fulano pra pôr isso aí no jornal. No dia seguinte, tudo recomeça, porque alguém cobrou, diz a linguagem comprometida do jornalismo, "mais espaço no governo" para "a base aliada".
A terceira formação do ministério. A cada uma das duas primeiras, a eventualidade de um ministro sério e trabalhador foi invalidada. Ou seja, mesmo quando ocorre a excepcionalidade, a regra é de que não adianta ser dedicado à função e ao interesse público. Quando conclui seus diagnósticos, pôde definir seus planos e adotou as medidas básicas para desenvolvê-los, o ministro aplicado é substituído. Se o sucessor, por cúmulo do acaso, for sério, recomeça o processo do antecessor, e cai. Se não for, tudo bem: não foi mesmo escolhido pelo critério de habilitação específica e seriedade comprovada.
Os prejuízos decorrentes desse sistema, não inventado agora, mas agora exacerbado como nunca, não são recuperáveis. Quando Adib Jatene foi afastado do Ministério da Saúde, porque Sérgio Motta convenceu Fernando Henrique de que ali estava um candidato potencial à Presidência, e a idéia de reeleição já era tão viva quanto silenciada, foi nomeado um médico convenientemente inexpressivo. Carlos Albuquerque mostrou-se incomparável na inépcia. O quadro da Saúde no Brasil por certo seria outro nos últimos anos, não fosse aquela exoneração imoral. E ainda por muito tempo a Saúde sofrerá pela sustação de políticas e projetos que Adib Jatene desenvolvia.
Hoje como ontem. Guardadas as diferenças de proporção e circunstância, aí está Amir Lando, que foi feito ministro da Previdência pela necessidade de pronta substituição do desgastado Ricardo Berzoini. Lando trabalhou com seriedade, esquematizou uma reestruturação da Previdência, mas pára tudo para ceder o lugar a uma cupinchice.
A Folha de ontem dizia que "formigas, baratas e até ratos, nas últimas semanas, vêm se espalhando pelo Planalto, onde despacha o presidente". Nas últimas semanas? Ah, isso é que não. Muito menos que a invasão tenha "começado a crescer nos últimos dias, depois da dedetização do jardim palaciano". Não é o jardim que estão mudando, é o ministério.


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