São Paulo, segunda, 20 de abril de 1998

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FHC diz ocupar mesmo espaço de Blair e Jospin

ANTONIO CAÑO
enviado especial a Brasília

O Brasil, argumenta frequentemente o presidente Fernando Henrique Cardoso, não é um país pobre, é um país injusto. Uns tantos grupos privilegiados, de acordo com sua teoria, tomaram há décadas o controle do Estado e converteram-no em um instrumento que aumentou a desigualdade.


Pergunta - Existem queixas de que o Plano Real permitiu que a economia marche bem, mas que o povo vive pior. É assim?
Resposta - Creio que nunca foi feita uma reforma econômica tão barata como esta. A economia tem crescido sempre. O dado mais preocupante é o nível de emprego. Contudo, até o ano passado, a taxa de desemprego não havia passado de 5% e pouco. Não se trata de um dado alarmante. Este ano, está subindo um pouco. Ao final do ano, o índice de desemprego vai estar um pouco acima de 6%.
Pergunta - O que pretende corrigir no programa econômico em seu segundo mandato?
Resposta - O programa econômico não está terminado. Para que se possa manter a inflação em níveis estáveis e retomar o crescimento de uns 3% ao ano, é necessário seguir uma política estrita de equilíbrio fiscal e o problema para combater o déficit fiscal é que são necessárias as reformas estruturais que demoram muito para serem aprovadas pelo Congresso, especialmente a reforma da Previdência.
No setor público, quando alguém se aposentava, ganhava 20% a mais do salário que tinha na ativa. Isso é insensato. Já foi eliminado. Agora vou ver se o Congresso aprova uma reforma que diga o seguinte: uma pessoa não poderá aposentar-se se não contribuir ao menos durante 35 anos para a Previdência Social e tiver menos de 53 anos. Parece-me muito razoável, mas aqui é um escândalo.
Pergunta - Suponho que é um escândalo porque afeta aspectos essenciais do Estado de bem-estar.
Resposta - Vocês podem falar de sociedades de bem-estar. Aqui, o que temos são sociedades de mal-estar. O que quero é mudar o Estado de mal-estar e criar um Estado de bem-estar.
Pergunta - Mas parece, pelas políticas que estão em moda e que o sr. pratica, que a melhor maneira de criar um Estado para todos é, simplesmente, eliminar o Estado.
Resposta - Sempre tem que haver Estado. Sou totalmente contra as teorias neoliberais. Não creio que o mercado deva ser o que decida o futuro. Tem que haver Estado, principalmente em países como o nosso. Temos um sistema no qual as gerações futuras pagam pelo bem-estar das anteriores.
Pergunta - Em definitivo, neoliberalismo.
Resposta - Não é isso. Blair ou Jospin são neoliberais? É preciso reconhecer que o mercado existe, que é importante como instrumento de distribuição de recursos, mas que não é tudo. O que não pode é um Estado que intervenha irracionalmente, que crie condições de desigualdade crescente em nome da igualdade. Creio que nas sociedades do futuro haverá mais espaços públicos e menos espaços burocratizados. Isso não é neoliberalismo.
Pergunta - O sr. se situa, então, no mesmo espaço ideológico de Blair e Jospin?
Resposta - E eles também me situam nesse espaço. Sim, claro. Blair o disse expressamente. Como (Antonio) Guterres em Portugal. Pensam o mesmo que penso, grosso modo. Na França, a situação é um pouco diferente. Talvez o socialismo francês seja um pouco mais vinculado às idéias do Estado.



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