São Paulo, segunda-feira, 20 de julho de 2009

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PF abre inquérito sobre obra no Amapá apoiada por Sarney

TCU aponta sobrepreço de R$ 17 milhões em ampliação de aeroporto de Macapá

Construção defendida pelo senador está abandonada há mais de um ano; PF apurou indícios de irregularidades durante a Operação Navalha

Erich Macias/Folha Imagem
Obras do aeroporto internacional de Macapá (AP), paralisadas por suspeita de irregularidades

RUBENS VALENTE
ENVIADO ESPECIAL A MACAPÁ (AP)

A Polícia Federal abriu inquérito no dia 17 de junho para investigar a ampliação do aeroporto internacional de Macapá (AP). Essa é a principal obra pela qual o presidente do Senado, José Sarney (PMDB), trabalhou para viabilizar na capital do Estado que o elegeu.
A PF quer averiguar irregularidades detectadas pelo TCU (Tribunal de Contas da União). A ampliação parou após o tribunal descobrir problemas no contrato e na execução, entre eles, um sobrepreço de pelo menos R$ 17 milhões. Incluído no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), o empreendimento foi inicialmente orçado em R$ 112 milhões.
A obra transformou-se em um imenso esqueleto de concreto, abandonado há mais de um ano, tomado pelo mato e, segundo auditoria, com sinais de deterioração. A ampliação foi um pedido pessoal do senador ao presidente Lula.
O lobista Geraldo Magela Fernandes da Rocha, que trabalhava para uma das responsáveis pela obra, a Construtora Gautama, disse à Folha que o novo aeroporto seria "uma homenagem" do senador ao então presidente da Infraero e deputado federal Carlos Wilson (PT-PE), morto em abril.
Segundo a assessoria de Sarney, os recursos foram obtidos no Orçamento por emendas parlamentares da bancada amapaense, da qual o presidente do Senado é o principal representante. A obra foi lançada com a presença do senador e foi uma das peças da campanha que o reelegeu, em 2006.

Operação Navalha
Os primeiros indícios de irregularidades foram apurados na Operação Navalha, deflagrada em abril de 2007 para investigar fraudes em licitações de obras públicas. O principal alvo da polícia foi Zuleido Veras, dono da Gautama, vencedora, em consórcio com a Construtora Beter, da licitação para o novo aeroporto, em 2004.
Zuleido, executivos e lobistas da Gautama foram presos e indiciados por formação de quadrilha, corrupção e tráfico de influência. A operação levou à queda do então ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, apadrinhado por Sarney.
A obra é referida em papéis apreendidos e diálogos telefônicos interceptados por ordem judicial. Em uma agenda de Zuleido há referências à atual governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB-MA). Em 16 de agosto, Zuleido anotou: "Roseana - R$ 200 mil". Em 27 de maio, "Ajuda de campanha política - Roseana".
Em laudo a que a Folha teve acesso, a polícia aponta que o nome da então senadora integrava "uma lista de quem recebeu presentes da Gautama".
Roseana perdeu a eleição em 2006, mas foi empossada em abril de 2009, após decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) que afastou o governador eleito, Jackson Lago (PDT). Na prestação de contas entregue ao TSE, não há doação da Gautama para sua campanha. Roseana sempre negou ter recebido doações da empresa.
No apartamento de Magela, em Brasília, a polícia apreendeu agendas e papéis do lobista. Anotação do dia 7 de março de 2005 mostrou, segundo a PF, "possível relação entre Geraldo Magela, Sarney e [senador] Romero Jucá, e constantes visitas aos senadores para tratar possivelmente de interesses de construtoras, dentre as quais a Gautama, para liberação de verba para obras".
Na casa de Magela, a PF achou ainda 16 páginas de fac-símiles que revelaram o trabalho que ele executou para conseguir, do Comando da Aeronáutica, a liberação de um terreno, ao lado do aeroporto, em favor da Gautama.
Em julho de 2006, a diretora comercial da Gautama, Maria de Fátima César Palmeira, conversa por telefone sobre o aeroporto com um homem identificado pela PF como "José Ricardo". Ela fala em liberar recursos. "Ricardo" conta que naquele momento estava no gabinete de Sarney e que viajaria no dia seguinte "no avião do presidente". A assessoria de Sarney disse que ninguém com esse nome trabalha no gabinete.
O consórcio que venceu a licitação, em 2004, é formado pela Gautama e pela Construtora Beter. A Gautama doou R$ 200 mil para a candidatura à reeleição do governador Waldez Góes (PDT), que formava chapa com José Sarney, e mais R$ 100 mil para o senador Papaléo Paes (PSDB-AP). A campanha de Sarney recebeu R$ 5 mil do presidente da Beter, Alberto Aulicino Neto.


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