São Paulo, terça-feira, 20 de agosto de 2002

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RAZÃO DE VOTO

Comparações que enganam

MAURO FRANCISCO PAULINO

Tem início hoje a terceira e talvez mais decisiva fase do primeiro turno da eleição presidencial. Ao espaço ocupado pelos partidos na TV e no rádio continuarão acrescentados os debates e entrevistas dos veículos. Passam a se misturar e a interagir, portanto, as aparições oficiais dos candidatos retocadas por recursos de marketing -característica da primeira fase- e as exposições em situações inquisitórias, onde a maquiagem marqueteira é diluída ao mínimo recurso das posturas e argumentos ensaiados -marca da segunda fase.
Foi pauta obrigatória nos últimos dias apurar o comportamento do eleitorado em processos anteriores, comparando as trajetórias das candidaturas após o início do horário eleitoral. Mas o efeito dessas comparações é mais ilustrativo do que conclusivo. Os novos e significativos ingredientes de marketing, em conjunto com cenários inéditos no aspecto político e no econômico, sinalizam que, nessa eleição, conclusões baseadas em comportamentos passados são, no mínimo, arriscadas.
Basta lembrar que no início de maio era aceitável supor que José Serra poderia repetir a trajetória de Fernando Henrique em 94 quando, logo após o início do horário eleitoral, ultrapassou Lula e venceu no primeiro turno. O argumento era a semelhança das taxas de ambos no mesmo período: no início de maio de 94 o Datafolha apurava 42% para Lula contra 16% de Fernando Henrique. Em maio de 2002, Lula contava com 43% contra 17% de Serra. Era só uma coincidência.
A atual disputa pela presidência é a mais imprevisível e dinâmica do período pós-redemocratização. O número reduzido de candidatos e a disposição da mídia em contribuir com o processo favorece a promoção quase diária de entrevistas e debates. Por mais padronizados que sejam os discursos e os formatos dessas reuniões, é inegável a contribuição que têm exercido para a formação do eleitor. Isso somado ao exercício contínuo do voto a cada dois anos faz crescer a percepção da importância da ida às urnas, o que resulta em uma definição mais tardia e ponderada.
Outro ingrediente que tem se mostrado influente é a utilização mais abrangente e especializada do marketing e das técnicas de pesquisas qualitativas e quantitativas. São armas essenciais, nunca utilizadas em tão larga escala, para captar e comunicar ações que contemplem os anseios do eleitorado. A exposição das candidaturas no rádio e na TV, em especial através dos spots ao longo da programação, será feita com grau inédito de elaboração.
O mais recente levantamento nacional do Datafolha revela que cerca de um terço dos eleitores que optam por algum candidato a presidente na pergunta estimulada admitem que ainda podem mudar de opinião, e isto se dá principalmente entre os menos escolarizados. Entre esses mesmos eleitores há 36% que apontam um candidato não por ser o ideal, mas por falta de melhor opção, o que ocorre principalmente entre os mais jovens e os que têm nível superior de escolaridade. Já 67% dos indecisos buscam informações sobre os candidatos a presidente e acham que ainda é cedo para se decidir. São números que mostram haver espaço para persuasão e mudanças no quadro.
São algumas razões que tornam o dia de hoje outro marco em uma eleição que se mostra emblemática mais como parâmetro para eleições futuras do que passível de balizamentos pelo passado. É um divisor de águas que está contribuindo de forma definitiva para o aprimoramento do eleitor.


Mauro Francisco Paulino, diretor-geral do Datafolha, escreve às terças-feiras nesta coluna



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