São Paulo, Sexta-feira, 20 de Agosto de 1999
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ELDORADO DO CARAJÁS
José Gregori, secretário de Direitos Humanos, pede a anulação da decisão da Justiça do Pará
FHC critica resultado do julgamento

da Sucursal de Brasília


O presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou que a impunidade prejudica a democracia, ao comentar o julgamento dos oficiais da Polícia Militar do Pará acusados pelo Ministério Público de serem responsáveis pelo massacre de 19 sem-terra em Eldorado do Carajás, em abril de 1996.
"Como cidadão, eu lamento que o Brasil não tenha ainda, o conjunto da sociedade, tomado consciência de que a impunidade, a sensação de impunidade é o que impede a consolidação da democracia", disse ele.
No julgamento, foram inocentados o comandante da operação, o coronel Mário Colares Pantoja, o major José Maria Oliveira e o capitão Raimundo José Almendra. De acordo com os jurados, as provas contra eles eram insuficientes.
FHC disse que "esperava algum grau de condenação, em vários níveis, uma reprimenda moral que seja". "Se há algo que revoltou o país e a mim, foi o massacre de Eldorado do Carajás."
"Isso (o massacre) é inaceitável. O Brasil não pode mais conviver com esses fatos", afirmou FHC. O presidente disse esperar que "nas próximas decisões o país se sinta mais seguro de que não haverá impunidade".
Questionado sobre a repercussão internacional da decisão, FHC declarou que "o Brasil, e lá fora a mesma coisa, espera que haja apuração de responsabilidades". "Eu não posso dizer "fulano foi responsável, beltrano não foi". Mas não pode ser que ninguém foi. Alguém foi (responsável)".
O secretário de Estado de Direitos Humanos, José Gregori, defendeu ontem a anulação do julgamento que absolveu os oficiais.
"Decisão judicial que não faz justiça não é para ser lamentada, é para ser anulada por um novo julgamento", afirmou ele, segundo nota oficial distribuída por sua assessoria de imprensa.
"É difícil entender que os chefes de uma expedição policial que resulte em 19 mortes, com seis execuções a frio, não mereçam determinado tipo de punição", diz a nota do secretário.
O ministro Raul Jungmann (Política Fundiária) disse estar envergonhado com o resultado do julgamento do massacre de Eldorado do Carajás.
"Respeito a Justiça de meu país e confio que esse resultado adiante possa ser revertido. Lamento profundamente a decisão e hoje me sinto envergonhado", afirmou Jungmann. Emocionado, chegou a interromper diversas vezes seu discurso.
"O Brasil não pode carregar na consciência os 19 mortos de Eldorado do Carajás sem a punição exemplar de quem cometeu isso. Senão, todos nós, brasileiros, somos culpados", disse o ministro.
"A decisão do júri foi um fracasso, uma decepção, um escândalo e reforça a impunidade", declarou d. Tomás Balduíno, presidente da CPT (Comissão Pastoral da Terra), entidade ligada à Igreja Católica que monitora a violência no campo e assessora movimentos de sem-terra.
O presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), d. Jayme Chemello, disse que não conhece o processo sobre a chacina, mas achou estranho que os policiais militares acusados tenham alegado que agiram em legítima defesa.
"É muito estranho o uso de metralhadoras em ações de legítima defesa", afirmou Chemello. "É um caso muito complicado porque não houve mortes entre os militares para sustentar a alegação de legítima defesa", afirmou ele.
O ministro José Carlos Dias (Justiça) evitou comentar a absolvição dos oficiais da Polícia Militar do Pará. Disse que adotou essa posição para não cometer "uma ingerência absurda" nas atividades do Poder Judiciário.
"Como ministro que representa o Poder Executivo, eu não posso dizer se foi justo ou injusto o resultado do julgamento", afirmou ele. "Não há reparos a fazer quanto aos aspectos formais do julgamento", acrescentou.
(WILSON SILVEIRA, ABNOR GONDIM e RAQUEL SÁ)


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