São Paulo, quarta-feira, 20 de setembro de 2000

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PF usa helicópteros armados em ação

WILLIAM FRANÇA
ENVIADO ESPECIAL A BURITIS (MG)

A Polícia Federal usou ontem três helicópteros ocupados por homens fortemente armados, inclusive com metralhadoras, numa ação que foi interpretada pelos sem-terra como uma nova tentativa de intimidação por parte do governo. Foram quase cinco minutos de sobrevôos com as portas abertas, em rasantes que simulavam ataques a um inimigo, com armas apontadas em direção às barracas de lonas.
A ação assustou os sem-terra, que completaram ontem oito dias nas proximidades da fazenda dos filhos do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Os helicópteros da PF -com cerca de 15 homens- permaneceram na área interna da fazenda Córrego da Ponte até o final da tarde de ontem. A Folha apurou que a ação foi coordenada pelo delegado Daniel Sampaio, chefe do COT (Comando de Operações Táticas), o grupo de elite da PF.
Ontem, a guarda da fazenda era feita por cerca de 25 policiais federais e 300 militares do Exército.
Os acampados do MST, em assembléia realizada pouco depois dos sobrevôos, decidiram redobrar os cuidados com a própria segurança. Temem que sejam criadas situações para que, por descuido, eles entrem em atrito com os policiais federais ou com a tropa do Exército, que continuam na fazenda. Foi decidido que cada sem-terra deve portar uma arma branca (facão, porrete ou foice) e evitar andar desacompanhado.
Segundo os líderes do MST, a ordem é enfrentar qualquer tentativa de prisão e, se for o caso, "baixar o cacete". Os acampados passaram a tarde de ontem recolhendo galhos e fabricando porretes.
Segundo Lucídio Ravanello, coordenador do acampamento, os sem-terra estão com "disposição psicológica" para enfrentar mais vários dias diante da fazenda. Os acampados são cerca de 500. Eles montaram suas barracas ao longo de 200 metros, embaixo das árvores que cercam a fazenda em frente à dos filhos de FHC.

Jejum e leitão
Os sem-terra decidiram integrar a partir de amanhã o jejum deflagrado pela direção nacional do MST. "Queremos forçar negociações com o governo. Se elas não acontecerem, o jejum pode evoluir para uma greve de fome", afirmou Ravanello. Segundo ele, basta o governo marcar hora e local do encontro para que os manifestantes recuem, pela segunda vez, do acampamento em frente à fazenda.
Enquanto isso, o Exército fez a reposição da tropa que mantém desde o dia 10 na fazenda. Durante a noite de anteontem, chegaram sete caminhões com soldados, equipamentos e mantimentos. Ainda durante a madrugada, alguns soldados fizeram exercícios de instrução próximos à porteira principal da fazenda -que continua isolada com um toldo negro, colocado pelos sem-terra.
"Temos o direito de manter a nossa privacidade e de não sermos filmados, ilegalmente, pela Polícia Federal e pela Abin (Agência Brasileira de Inteligência)", afirmou Ravanello, ao justificar a colocação do toldo em frente à porteira principal.
A diversão de alguns dos acampados ontem foi passear com o "Fernando Henrique", um leitão branco de dois meses de idade que foi doado aos manifestantes há três dias e passa o dia sendo conduzido por uma corda amarrada na pata traseira. "A gente não quer matar ele agora não, mas se daqui a duas semanas ele ganhar mais peso, arrisca a gente comer ele", afirmou Euzébio Oliveira, do projeto de acampamento Vida Nova, de Buritis, responsável pela guarda do leitão -que tem as orelhas e as costas tingidas com as iniciais "FHC".

Crédito
O MST concorda em sair da frente da fazenda dos filhos do presidente Fernando Henrique Cardoso e das proximidades de Buritis (MG) se o governo sinalizar com a possibilidade de atender suas reivindicações. O principal pleito dos sem-terra é a liberação de R$ 2.000 para cada uma das 110 mil famílias mais carentes dos assentamentos para custear a safra deste ano. O governo tem se negado a acatar o pedido.
Gilberto Portes, da direção nacional do MST, garantiu ainda que os manifestantes que fazem vigília na frente de prédios públicos que haviam sido invadidos por sem-terra também sairiam.
O MST não exige mais que um membro do Ministério da Fazenda ou FHC participe da reunião.


Colaborou a Sucursal de Brasília


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