São Paulo, domingo, 21 de janeiro de 2007

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Ex-funcionários comprometem Renascer

Depoimentos sigilosos colhidos pelo Ministério Público descrevem supostas irregularidades contábeis cometidas pela igreja

Advogado dos Hernandes diz que depoimentos não têm valor jurídico e acusa os promotores do caso de extrapolarem suas funções

LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

Após pedir a prisão e a extradição dos fundadores da Renascer em Cristo, Estevam e Sônia Hernandes, o Ministério Público de São Paulo avança agora sobre a contabilidade da igreja.
Em depoimentos sigilosos, dois ex-funcionários da Renascer e um advogado descreveram supostos esquemas ilegais operados pelo casal, como a emissão de duplicatas frias, o uso do dinheiro na compra de imóveis particulares, os "golpes" aplicados em fiéis e a constante preocupação em aumentar a captação de verbas.
Os nomes dos informantes são mantidos em sigilo pelos promotores do Gaeco, grupo especial do Ministério Público de combate ao crime organizado, que investiga o caso.
Pelo depoimento de uma das pessoas, ao qual a Folha teve acesso, os cheques doados por fiéis durante os cultos são depositados em uma das 21 contas correntes da Renascer. Os pré-datados são vendidos para factorings ou bancos.
Uma relação detalhada com centenas de números de cheque, valores e contas favorecidas foi entregue à Promotoria.
O Gaeco diz ter provas de que as doações financiaram projetos pessoais do casal Hernandes, como a aquisição do haras em Atibaia (SP) por R$ 1,8 milhão e de uma casa de praia no Estado da Flórida (EUA) por R$ 1,27 milhão.

Ajuda aos templos
As testemunhas afirmaram desconhecer a existência desses bens. Uma delas disse que o envio de dinheiro para os EUA sempre foi justificado como ajuda aos templos daquele país.
Uma das pessoas narrou aos promotores que, no período em que trabalhou no departamento financeiro da Renascer, emitiu duplicatas simuladas, que não correspondiam a nenhuma prestação do serviço.
A ordem de emissão, disse, era dada por Estevam. O filho do casal que trabalhava no mesmo setor, Felipe (Tid), segundo a testemunha, "raramente" pedia a emissão ilegal.
As operações, disse, eram feitas pelas seguintes factorings e os bancos: Terranova, Banco Daycoval, Banpar, Múltipla Factoring, Banco Safra, Schain, Banco Cidade e Bradesco.
Com exceção da Terranova, que pertence a um fiel, não há qualquer evidência de que as demais empresas soubessem da origem das duplicatas.
O advogado ouvido disse que o representante da Terranova, Sérgio Mortari, teve um prejuízo de cerca de R$ 7 milhões em créditos a receber da igreja. Amigo pessoal de Estevam, a dívida teria sido abatida com a transferência de imóveis.
As outras modalidades supostamente praticadas pela Renascer, como narrou a testemunha do departamento financeiro, envolvem os fiéis.
Numa delas, os nomes dos fiéis foram usados como fiadores de imóveis locados pela Renascer. Muitos contratos foram rompidos por falta de pagamento, e os fiéis tiveram os bens pessoais penhorados.
Segundo a testemunha, ao mesmo tempo em que a igreja se perdia em dívidas com os fiéis, tornava mais rígidas as metas de arrecadação de cada templo, ora para a aquisição de uma torre de TV, ora para a aquisição de uma rádio.
Se não cumprisse a meta, o pastor era punido com uma transferência.
O projeto mais importante, disse, é o carnê Gideão, feito por meio de faturas enviadas aos fiéis com a promessa de conquistas e vitórias. "Jamais se esqueça de que o seu milagre sempre será maior que a sua oferta", diz o site da igreja.


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