São Paulo, sábado, 21 de fevereiro de 2004

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SOMBRA NO PLANALTO

Decisão de fechar as casas contraria os planos do próprio governo, que planejava legalizar esse jogo, que seria operado pela CEF

Pressionado, Lula proíbe bingo no país

Juca Varella/Folha Imagem
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao lado de sua mulher, Marisa Letícia, aparenta preocupação durante sua visita à fábrica de carrocerias de ônibus Marcopolo, localizada em Caxias do Sul


GABRIELA ATHIAS
EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Contrariando o que defendia até hoje, o governo resolveu ontem editar medida provisória proibindo a exploração de bingos e de máquinas caça-níquel no país. A medida é uma reação à crise gerada pela divulgação de vídeo no qual o ex-subchefe da Presidência Waldomiro Diniz pede propina e dinheiro para campanhas a um empresário do bingo.
A fita foi gravada em 2002, quando Waldomiro presidia a Loterj (Loteria do Estado do Rio de Janeiro) no governo Benedita da Silva (PT). Com a posse de Lula em 2003, Waldomiro passou a assessor de José Dirceu na Casa Civil, com quem já havia trabalhado na Câmara dos Deputados e dividido apartamento em Brasília.
A Polícia Federal também fechou 16 bingos na madrugada de ontem no Distrito Federal, apreendendo cerca de 560 máquinas caça-níqueis na operação chamada "Cartão Vermelho". A PF alega que a ação não tem relação com o caso Waldomiro.
A MP seria assinada pelo presidente assim que chegasse de Caxias do Sul (RS), às 21h, na Base Aérea de Brasília, para ser publicada na edição de hoje do "Diário Oficial". Até a conclusão desta edição, o texto não havia sido divulgado. A edição da MP torna inválidas as atuais licenças de funcionamento dos 1.100 bingos que operam no Brasil, segundo a Associação Brasileira dos Bingos.
A maioria desses estabelecimentos funciona por meio de liminar. "O presidente determinou a edição de uma medida provisória até que se faça uma discussão a esse respeito no Congresso", disse o ministro Márcio Thomaz Bastos (Justiça).
A idéia de baixar a MP foi discutida em Brasília numa reunião da qual participaram os ministros Dirceu, Luiz Dulci (Secretaria Geral), Antonio Palocci Filho (Fazenda), Thomaz Bastos e o presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP). Por telefone, Lula deu seu aval e mandou publicá-la.
Em discurso para 2.000 pessoas na sede da indústria de carrocerias de ônibus Marcopolo, em Caxias do Sul (RS), Lula disse que "não haverá nenhum problema político que atrapalhe os passos que o Brasil precisa dar".
"Quero dar uma informação importante para vocês: não haverá nenhum indício que envolva práticas ilícitas ou corrupção neste governo que não seja investigado até o fim", afirmou o presidente Lula ontem.
A respeito da eventual criação de uma CPI, Lula afirmou:
"O Congresso tem toda a serenidade para decidir ou não por uma CPI. Sou filho de uma mulher que morreu aos 64 anos e que me dizia: "A única coisa que você não pode perder nunca é o direito de andar com a cabeça erguida e olhar nos olhos dos outros". É esse o grande patrimônio que tenho na vida. Mas tenho muito cuidado com isso, porque no Brasil se instituiu a cultura de que todo mundo é culpado até que provem contrário. Tenho outra cultura. Para mim, todo mundo é inocente até que se prove o contrário".
Thomaz Bastos informou que se reuniu ontem com o superintendente da PF, Paulo Lacerda, para que a polícia possa planejar a operação nacional de fechamento dos bingos, que deverá ocorrer imediatamente após a publicação da lei -ou seja, hoje.
A decisão de fechar os bingos contraria os planos do próprio governo, que planejava legalizar esse tipo de jogo, analisando inclusive a hipótese de estatizá-lo.
Na mensagem que Lula enviou na segunda-feira passada para a abertura dos trabalhos legislativos deste ano, o governo diz: "A legalização prevê a obtenção e a disciplinação de fontes de recursos, como é o caso dos bingos, que permitam ao governo financiar projetos de inclusão social".
Um grupo de técnicos ligados à Casa Civil estudou em 2003 uma proposta para a regulamentação dos bingos no Brasil, com a seguinte conclusão: bingos deveriam ser controlados pela União e operados pela Caixa Econômica.
Em 2001, época em que era pré-candidato à Presidência, Lula disse ser a favor da legalização do jogo do bicho. A declaração foi dada em um jantar com jornalistas.


Colaborou LÉO GERCHMANN, da Agência Folha, em Caxias do Sul

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