São Paulo, segunda-feira, 21 de abril de 2008

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Mateiros querem reparação por terem de guiar militares

Eles alegam terem sido obrigados por militares a ajudar a perseguir os guerrilheiros no Araguaia e dizem ter sofrido maus-tratos

Rafael Andrade/FolhaImagem/16.abr.08
O mateiro Raimundo Souza, que pediu indenização ao governo, em sua casa em São Geraldo


SERGIO TORRES
ENVIADO ESPECIAL A SÃO DOMINGOS DO ARAGUAIA (PA)

Acusados de ajudar os militares a caçar na floresta amazônica os guerrilheiros do PC do B que atuavam na região do Araguaia, os mateiros também querem ser indenizados pelo governo. Alegam que foram obrigados a acompanhar as tropas enquanto durou a repressão à guerrilha (1972 a 1974).
No período em que estiveram a serviço do Exército, os homens que serviam de guias no meio da mata dizem que foram espancados, confinados e proibidos de trabalhar. Enquanto isso, afirmam, suas famílias passaram fome, pois as lavouras se perderam.
Nos relatos à Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, que já anunciou que indenizará moradores do Araguaia -região que abrange o sudeste do Pará, norte do Tocantins e sul do Maranhão-, os guias dizem não ter tido outra opção.
"No começo de 74 botaram a gente na mata para caçar esse pessoal. Fui obrigado a ir. Se não fosse, já sabe", disse Cícero Lucas da Silva, 54. Ele diz ter sido preso por 15 dias antes de ser forçado a ajudar o Exército. "Não sei qual foi o motivo [da prisão]. Graças a Deus não encontramos mais guerrilheiros."
A mesma sorte não teve Sinézio Martins Ribeiro, 84, morador de Palestina do Pará. Preso em 1973, vítima de choques elétricos ao atuar como mateiro, assistiu ao ataque que resultou na morte dos guerrilheiros Jaime Petit da Silva e Adriano Fonseca Filho. Depois, disse, viu as cabeças dos dois serem cortadas. "Fiquei preso no barracão. Na mata, a gente ia no rumo de alguns pontos, via o rastro. Não se podia dizer não. Tinha que ficar caladinho. Era obrigado a ir. O Exército estava como feras", afirmou.
Outro lavrador improvisado como mateiro foi Raimundo Gomes de Souza, 78, que também requereu indenização do governo. "Não queria ir atrás de ninguém. Eram meus conhecidos, meus vizinhos. Os militares me pegaram, amarraram, algemaram, trouxeram para a base [militar] de Xambioá [à época, vilarejo em Goiás]. (...) Era acusado de estar ajudando o pessoal. Se não acompanhasse, ia morrer."
O presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão, disse à Folha que, embora estejam reivindicando a indenização, os mateiros não estarão entre os primeiros agraciados, que deverão ser conhecidos ainda neste semestre. Até agora, 240 moradores da região já recorreram à comissão, em busca da indenização.


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