São Paulo, quinta, 21 de maio de 1998

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PROTESTO
Em Viena, líder dos sem-terra diz porém que MST apóia a campanha petista à Presidência da República
Invasão continuaria com Lula, diz Stedile

RODRIGO AMARAL
enviado especial a Viena

O economista João Pedro Stedile, um dos principais líderes do MST, disse ontem em Viena que as invasões de terra promovidas pelo movimento vão seguir mesmo se Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assumir a Presidência da República.
O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), no entanto, já acertou o apoio à candidatura petista, e líderes do movimento, como o próprio Stedile, devem subir no palanque de Lula.
"As ocupações não dependem da vontade do MST. Quem decide quando ocupar e que fazenda ocupar é a nossa base no interior", disse Stedile. "Enquanto houver latifúndio e enquanto houver gente sem terra, as ocupações vão continuar."
Ainda ontem, Stedile, que participou de seminários de movimentos de esquerda e de uma reunião com ONGs na sede da ONU em Viena, disse que um eventual governo Lula pode assentar 2 milhões de famílias em dois anos. Leia a seguir os principais trechos da entrevista concedida à Folha:

Folha - Os principais líderes do MST podem participar de comícios e viajar junto com Lula?
João Pedro Stedile -
Claro. Já estamos fazendo isso. É até o contrário: temos feito manifestações públicas no interior e convidamos o Lula e o Brizola para participar.
Folha - O Lula tem procurado mostrar uma posição mais moderada politicamente. Há divergências com o MST?
Stedile -
Temos conversado muito com o Lula, e a convergência é muito grande. O que temos dito ao Lula, e nos parece que ele também tem essa opinião, é que, mais do que discutir grandes propostas de plano de governo, é preciso mostrar que, nas eleições, vão estar em jogo dois modelos econômicos: esse do FHC, que subordina nossa economia ao capital financeiro, ou outro que reorganize a economia, resgate a soberania nacional, distribua a renda e fortaleça o mercado interno.
Folha - De todo modo, o PT vai ter de apresentar um plano de governo. O MST está apresentando propostas concretas a esse plano?
Stedile -
O PT vai realizar plenárias sobre isso, e certamente a base do MST vai participar. Eu, pessoalmente, não estou preocupado com o plano de governo, que é, no Brasil, só mais uma carta de propaganda eleitoral. Se a vitória do Lula for contundente, ele poderá fazer mudanças mais avançadas. Se a vitória for muito apertada e depender de muitas alianças políticas, certamente o programa de governo do Lula vai ficar muito aquém da própria vontade dele.
Folha - Quanto o MST acha possível assentar com essas medidas?
Stedile -
Nós nos guiamos pelos estudos do falecido professor José Gomes da Silva, que mostrou que é possível, em dois anos de governo, assentar 2 milhões de famílias. O governo Lula tem que trabalhar com uma meta desse tipo.
Folha - As invasões vão continuar durante a campanha eleitoral?
Stedile -
As ocupações de terra são uma forma de pressão social e não dependem da vontade do MST. Quem decide quando e que fazenda ocupar é a nossa base no interior, que tem total autonomia. Enquanto houver latifúndio improdutivo e gente sem terra, elas vão continuar. Por isso, mesmo durante um governo Lula, elas vão seguir.
Folha - Os saques no Nordeste podem influenciar o eleitorado de classe média contra o MST e consequentemente prejudicar a candidatura de Lula?
Stedile -
Na classe média, é possível que tenha alguma repercussão negativa. Mas eu tenho dito ao Lula que, se ele ganhar as eleições, terá sido com o apoio do povo. Ele que se esqueça da classe média, que, além de ser pequena, é conservadora e nunca vai votar no Lula. Mas acho que o Lula vai ter mais votos na classe média do que em 94, devido ao desemprego e aos problemas nas áreas de serviços como planos de saúde e colégios particulares, nos quais a inflação passa de 100%.



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