São Paulo, quarta-feira, 21 de julho de 2004

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ELIO GASPARI

José Dirceu, o Napoleão de "Diário Oficial"

Seria muito bom se o comissário José Dirceu, nomeado presidente da Câmara de Desenvolvimento Econômico, viesse a se transformar num contraponto à ekipekonômica que impôs ao Brasil dez anos de estagnação econômica e ruína social.
Dirceu irá para a posição onde se dá o maior índice de mortalidade da administração nacional. No governo FFHH, explodiram quatro ministros e hierarcas suspeitos de tentar o contraponto fatal. Os seguintes:
- José Serra, apesar de ter começado o governo como um poderoso ministro do Planejamento, em 1998 tornou-se um festejado ministro da Saúde.
- Luiz Carlos Mendonça de Barros presidia o BNDES e foi abatido em vôo a caminho do Ministério do Desenvolvimento. Capotou em 1999, na curva dos grampos da privataria. (Justiça seja feita: a banca e a ekipe nada tiveram a ver com isso.)
- Clóvis Carvalho, nomeado ministro do Desenvolvimento, foi eletrocutado em setembro de 1999 por ter dito que "excesso de cautela pode ser sinônimo de covardia". O ministro Pedro Malan decapitou-o em menos de 48 horas.
- O presidente do BNDES, Andrea Calabi, ensaiou divergências com a ekipe e foi defenestrado em fevereiro de 2000 pelo então ministro Alcides Tápias. No ano seguinte, Tápias acabou preferindo o caminho de casa.
Na sua encarnação petista, a ekipekonômica não conseguiu defenestrar o professor Carlos Lessa da presidência do BNDES. Engoliu a exoneração do presidente da Anatel, depois de ter propagado que "os mercados" reagiriam negativamente a semelhante exercício do poder republicano. No ano passado, uma tentativa de assenhorear-se da concepção da política social do governo acabou em retirada, mas não em desistência.
Desde já, é bom lembrar que não é o comissário José Dirceu quem assusta a banca internacional. O que a assusta é o nível suicida de endividamento do Brasil. Hoje a dívida pública está em 56,8% do PIB, contra 55,5% ao fim do tucanato. Quando os sábios do PSDB capturaram a política econômica do governo brasileiro, a dívida estava em 14% do PIB. Parece que eles sentiram algum cheiro de queimado, pois começaram a mostrar-se preocupados com o tema.
Seria muito bom se o comissário conseguisse se transformar num contraponto à ekipekonômica. Sua crônica, contudo, não estimula grandes esperanças. O único desenvolvimento pelo qual José Dirceu briga e triunfa é o da publicidade de seus poderes.
Deve-se ao professor Cláudio Gonçalves Couto a enumeração de algumas características dos superpoderes da Câmara de Desenvolvimento Econômico. Ela tem 14 ministros e uma comissão executiva composta por 30 hierarcas. Ou seja, o aparelho desenvolvimentista do comissário não cabe no Airbus de 40 lugares que Lula comprou na Europa. Ademais, Dirceu já preside quatro Câmaras. A saber: Câmara de Política Social, Câmara de Política Cultural, Câmara de Política de Recursos Naturais e a Câmara de Politicas de Integração Nacional e Desenvolvimento Regional.
Se tantos poderes fossem poucos, a Casa Civil de José Dirceu participa de 37 dos 55 grupos de trabalho criados pelo governo de Lula e coordena 16.
Tudo o que se precisa é de um contraponto à ekipekonômica. Pela tenacidade pessoal e pela biografia política, José Dirceu está habilitado para essa tarefa. Infelizmente, em um ano e meio de poder, o chefe da Casa Civil revelou-se um Napoleão de "Diário Oficial". É lá, e só lá, que se mostra invencível.


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