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entrevista
"Não sou aloprado", diz ex-integrante de campanha petista
LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL
O ex-chefe do núcleo de inteligência da campanha nacional do PT, Jorge Lorenzetti, 56, afirma que nunca
foi o "churrasqueiro de Lula"
nem é um "aloprado". Dois
anos depois do dossiegate,
diz ter mágoa da imprensa e
de parte do PT e decepção
com o presidente Luiz Inácio
Lula da Silva.
"Não com o governo de Lula, que eu aprovo, mas pelo
uso da palavra aloprado. Eu
não sou um aloprado."
No relatório final, a Polícia
Federal descreveu Lorenzetti como o "centralizador" da
negociação do material contra o PSDB. "Eu nunca participei nem autorizei a compra
de dossiê."
Leia trechos da entrevista
concedida por telefone.
FOLHA - Que avaliação o senhor
faz do dossiegate?
JORGE LORENZETTI - Foi uma situação de muita injustiça
contra mim. Pela divulgação
feita à época, era como se eu
tivesse participado de uma
falsificação de documentos,
da montagem de um dossiê.
Depois que a PF apreendeu o
material e o periciou, constatou que não houve nada disso, ou seja, o que nós tínhamos era verdadeiro.
FOLHA - Qual foi a participação
do senhor nesse caso?
LORENZETTI - Durante a eleição, meu papel era analisar
todo material que chegasse
ao partido, proteger a campanha. Um dia, o comitê eleitoral fez contato comigo dizendo que um homem, chamado Valdebran [Padilha],
dizia ter documentos que
comprometiam a campanha
de José Serra [hoje governador de São Paulo, do PSDB].
Eu pedi, então, ao Expedito [Veloso] que procurasse o
Valdebran por meio do telefone que ele havia deixado no
comitê. Depois desse primeiro contato, Expedito foi para
Cuiabá com Gedimar [Passos]. De lá, eles trouxeram a
informação de que o conteúdo era verdadeiro. Trouxeram uma listagem de documentos, com números de
cheques e o relato dos vídeos.
Não fomos nós que fizemos o dossiê, o material nos
foi oferecido. E não vejo problema em revelar fatos verdadeiros contra adversários.
FOLHA - O que houve depois?
LORENZETTI - Houve muitas
reuniões entre Expedito, Gedimar, Valdebran e os Vedoin. Eu nunca participei
desses encontros, nunca falei
com o Valdebran nem com
os Vedoin. Soube que eles pediram dinheiro em troca do
material. No começo R$ 20
milhões, depois, R$ 10 milhões. Nunca concordei com
o pagamento, aliás, ninguém
concordou.
FOLHA - Quem pagou então?
LORENZETTI - Não teve pagamento. Teve esse dinheiro
apreendido, mas isso foi uma
surpresa. Não existia a possibilidade de negociação.
FOLHA - Até hoje não se sabe a
origem do R$ 1,7 milhão. O senhor sabe?
LORENZETTI - Não, não sei. A
minha participação era apenas análise de material.
FOLHA - O senhor nunca teve a
curiosidade de saber a origem?
LORENZETTI - Não. Eu me desfiliei e não tive mais contato
com ninguém. Olha, se fosse
hoje, eu não teria participado
disso.
FOLHA - O que mudou para o senhor?
LORENZETTI - Foram os dois
piores anos da minha vida.
Minha família e eu sofremos
muito. Só conseguimos suportar graças à solidariedade
de amigos. Perdi a função de
diretor num banco. Minha
mulher era quem sustentava
a casa. Agora estou reconstruindo a minha vida. Montei uma lanchonete no Balneário Camboriú (SC) e quero voltar a lecionar na faculdade de enfermagem.
FOLHA - No início da entrevista,
o senhor falou em injustiça...
LORENZETTI - Em nenhum
momento eu fui respeitado
pela imprensa. Nunca fui
churrasqueiro do presidente
Lula, muito menos o churrasqueiro oficial. Isso foi usado de forma pejorativa para
me desqualificar. Teve ainda
o uso da palavra aloprado.
Quando o presidente Lula
disse isso, ele estava na tensão do momento eleitoral.
Mas a imprensa passou a
usar a palavra de forma caricata, desrespeitosa. Outra
coisa que me incomoda é a
tentativa de vincular o episódio à corrupção. Sempre vivi
de renda fixa. Todas essas
acusações destroem a vida de
qualquer sujeito. Eu me desfiliei do partido. Ficou uma
mágoa com uma parte do PT,
que se apressou a me julgar e
esqueceu que eu tenho uma
história dentro do partido.
FOLHA - Esse sentimento inclui o
presidente Lula?
LORENZETTI - Não. Eu não
acho que ele me considere
um aloprado, mas a declaração foi ruim. O que tenho é
decepção por ele, veja bem,
não vá dizer que a decepção é
com o governo dele, que não
é, acho que as coisas melhoraram muito. A decepção é
porque ele nos chamou de
aloprados. Eu não sou um
aloprado. Nunca mais falei
com Lula, mas espero que
um dia a gente possa se encontrar.
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