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São Paulo, quarta-feira, 22 de janeiro de 2003

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GLOBALIZAÇÃO

Dirigente da organização afirma, porém, que o "modelo político" aplicado no Brasil não serve para a França

PT francês busca inspiração no brasileiro

Mauricio Lima - 21.jan.2003/AFP
O ativista francês José Bové posa para uma foto após desembarcar no aeroporto de Porto Alegre


ALCINO LEITE NETO
DE PARIS

Partido dos Trabalhadores não é apenas o nome de uma organização brasileira. Na França também existe um PT, o Parti des Travailleurs, uma organização de linhagem trotskista que concorreu às eleições presidenciais de 2002.
O PT francês é mais um elemento que faz confluir as linhas de força da política brasileira com a francesa. Anteontem, o jornal "Le Monde" debateu com destaque a hipótese levantada por socialistas de que a "união de esquerdas" alcançada por Lula deveria ser um modelo para a esquerda francesa.
O dirigente do PT francês, Daniel Gluckstein, que concorreu à Presidência, discorda que se possa aplicar o "modelo brasileiro" em seu país, mas diz que a França precisa de um forte partido operário tal como o PT de Lula.
 

Folha - O que a esquerda brasileira alcançou, com Lula, é um modelo para a esquerda da França?
Daniel Gluckstein -
Não creio que seja um modelo. A maioria do povo brasileiro buscou uma solução aos problemas enormes que o Brasil enfrenta dando os meios de governar a Lula e ao PT. Trata-se de uma resposta dos trabalhadores brasileiros, que buscaram depois de 20 anos construir um partido que fosse seu. Isso corresponde à história particular do Brasil. A história da França é diferente.

Folha - Por que socialistas como Jean-Christophe Cambadélis pensam que a união das esquerdas no Brasil é um modelo para a França?
Gluckstein -
Jean-Christophe Cambadélis tem uma maneira própria de reescrever a história da esquerda em nosso país. O que eu constato é que no Brasil os trabalhadores construíram um partido, o PT, e uma central sindical, a CUT, para fazer deles um instrumento da luta de classes. O partido a que pertence Cambadélis, quando estava no governo, não buscou defender as organizações construídas pelos trabalhadores, e esse mesmo governo aplicou diretivas européias de privatização e do FMI, de privatização e de desregulamentação dos direitos operários, buscando integrar em si mesmo as organizações sindicais.

Folha - A esquerda francesa precisa se unificar para vencer?
Gluckstein -
A classe operária tem necessidade de realizar sua unidade com suas organizações para defender seus direitos e garantias. "A união da esquerda" ou a "esquerda plural" são categorias muito diferentes da unidade da classe operária. É preciso lembrar que foi o governo Jospin, da esquerda plural, que começou as grandes privatizações de ferrovias, da eletricidade, da telefonia e dos hospitais. Ele pagou por isso em 21 de abril. Ninguém pode desejar ao governo Lula a mesma sorte. Se você me perguntar se sou a favor da construção de um grande partido dos trabalhadores, como o PT brasileiro, quando ele foi criado, sobre o terreno da luta de classes, eu diria que estou de acordo. Nós pensamos que um partido assim é necessário na França e é para avançar nessa direção que nós formamos aqui o PT.

Folha - Quais as diferenças entre o PT francês e o brasileiro?
Gluckstein -
O PT brasileiro foi constituído com a ruptura de uma camada de sindicalistas e militantes com o bipartidarismo da ditadura militar. Ele foi construído a partir de uma onda de mobilização profunda da classe operária brasileira. O PT francês foi constituído pela confluência de diferentes correntes do movimento operário, depois da reunião do PC e do PS no poder, à Europa de Maastricht e sua política de austeridade. O que há de comum aos dois partidos, na fundação ao menos, é a vontade de construir um partido sem patrões, exclusivamente voltado aos interesses da classe operária. Temos em comum também a idéia de que possa haver num tal partido diferentes correntes de pensamento do movimento operário.

Folha - Os partidos tem o mesmo nome por acaso?
Gluckstein -
Não. Nós saudamos a criação do PT no Brasil como um passo adiante da classe operária brasileira. A escolha do nome PT não é fruto de simples acaso.


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