São Paulo, domingo, 22 de março de 1998

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AMÉRICAS
Encontro no Chile vai selar criação de centro de estudos sobre drogas, com apoio dos serviços de inteligência dos EUA
Cúpula lança nova iniciativa contra tráfico

CLÓVIS ROSSI
enviado especial a San José (Costa Rica)

A 2ª Cúpula das Américas, marcada para abril no Chile, lançará uma nova iniciativa para o combate hemisférico ao tráfico de drogas, o que inclui um centro de estudos na Cidade do Panamá.
Mas não serão meros estudos acadêmicos: os serviços de inteligência norte-americanos darão todo o apoio à iniciativa, aliás uma proposta dos EUA.
A idéia parte de um princípio que se está tornando consensual no mundo: não foi só a economia que se globalizou, mas também o crime organizado, cujo filão mais rentável é o narcotráfico.
Para combatê-lo é preciso igualmente desenvolver esforços que transcendam as fronteiras dos Estados. O governo brasileiro, que apóia a iniciativa norte-americana, aplica o raciocínio à violência e à criminalidade nas grandes cidades do país, em especial no Rio.
Desde antes da posse, o presidente Fernando Henrique Cardoso vem dizendo que a violência não começa nem termina nas fronteiras do Rio. Tem origem no narcotráfico, um negócio multinacional que começa nas plantações de coca na Bolívia e no Peru e termina nos grandes centros consumidores.
Mais recentemente, o governo FHC concluiu que, isoladamente, não poderá pôr fim a violência. O novo centro atende, portanto, à necessidade de um combate multinacional ao crime organizado também no Brasil.
O maior ou menor alcance da nova iniciativa vai depender de serem superadas as resistências que a maioria dos governos latino-americanos ainda apresenta. Acham que se trata de abrir uma brecha para ampliar a ingerência dos EUA em assuntos internos.
Por isso, o esboço do texto pronto para ser assinado no Chile pelos 34 chefes de Estado/governo da Alca (Área de Livre Comércio das Américas) é cauteloso. Diz que o organismo se pautará pelos princípios de respeito à "soberania e à jurisdição territorial dos Estados, reciprocidade, responsabilidade compartilhada e equilíbrio no tratamento do tema".
Há uma segunda fonte de resistência ao projeto, esta mais simbólica, decorrente do local em que os EUA sugerem para instalar o centro. São as dependências da antiga Escola das Américas, um centro de treinamento para militares latino-americanos que se transformou em escola de torturas e formação de agentes para o autoritarismo que marcou a América Latina nos anos 70 e 80.
A inclusão do combate ao narcotráfico como um dos temas fortes da cúpula, além de seus aspectos práticos, decorre igualmente do fato de que perdeu vigor o que deveria ser o eixo da reunião, o livre comércio nas Américas.
A cúpula servirá para o início das negociações nesse capítulo, mas não há como avançar porque os EUA, principal motor da Alca, não têm condições negociadoras.
Falta ao Executivo o mecanismo chamado "fast track", uma autorização para que o governo negocie acordos comerciais que, depois, o Congresso apenas aprova ou rejeita em bloco. Na ausência do fast track", os parceiros dos EUA relutam em avançar em qualquer negociação, pelo temor que um acordo alcançado seja, depois, estraçalhado no Congresso.



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