São Paulo, domingo, 22 de abril de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ROMBO AMAZÔNICO

Grampo da PF revela que dinheiro financiou candidatos


Verba da Sudam foi usada em campanhas eleitorais

LUCIO VAZ
ENVIADO ESPECIAL A PALMAS

Documentos oficiais sobre investigação de fraudes na Sudam (Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia) realizada durante nove meses mostram como operam escritórios de consultoria e empresas beneficiadas em pelo menos três Estados: Tocantins, Pará a Amapá. Parte do dinheiro desviado foi utilizado em campanha eleitoral.
As 380 horas de gravações feitas pela Polícia Federal, com autorização da Justiça Federal, aos quais a Folha teve acesso, desnudam o esquema de propinas, apresentação de notas frias e documentos falsos e conivência de servidores para desviar recursos da Sudam.
O pedido de prisão preventiva feito pelo Ministério Público Federal em Tocantins à Justiça Federal resulta de um cruzamento de informações da PF, Receita Federal, auditoria e procedimentos técnicos da Sudam.
Após cinco dias detidos em Palmas, 19 integrantes do grupo que atuava nos três Estados foram libertados por decisão da Justiça. A Justiça Federal em Tocantins havia decretado a prisão preventiva de 21 pessoas. Mas a investigação prossegue. Chegaram à cidade anteontem 1.250 quilos de documentos apreendidos em escritórios de consultoria em Belém.
Diálogo entre o empresário Romildo Onofre Soares e Benjamim Bispo da Silva, em setembro de 2000, dez dias antes das eleições municipais, mostra que parte do dinheiro da Sudam financiou campanhas eleitorais.
Romildo faz parte do Grupo Soares, um dos alvos da investigação. "O negócio é o seguinte: esse dinheiro tem que sair antes da campanha, porque uma parte dele eu arrumei para a campanha? Se chegar esse documento lá hoje, é certeza que até terça-feira nós liberamos...", diz Romildo, que esteve preso em Palmas.
Depois, ele acrescenta: "Pois é, mas que vai desenrolar vai. Vai desenrolar a Xuí e o Frango Líder, tá bom?". Benjamim diz: "É, né, então está bom, seu Romildo".
Romildo, que foi candidato a vice-prefeito em Altamira (PA) pelo PMDB, continua as lamentações. "Era para passar 2.000 e só deu para passar 1.500. Não tem dinheiro para nada. Aqui, os "sudanzeiros" daqui tá tudo quebrado também; não saiu para ninguém (sic). E nós estamos levando a campanha aqui na marra. O pessoal aqui tá dando até cheque pré-datado. O trem tá feio, já atiraram em gente."
O Ministério Público vai investigar se ocorreram outros casos de uso de verba desviada da Sudam em campanhas eleitorais.
A investigação que mais avançou sobre fraudes na Sudam iniciou a partir de um dado curioso, em 1999. A PF em Tocantins apurava a aprovação de quatro projetos em Paraíso do Tocantins (TO). Descobriu-se que as quatro empresas apresentaram sua declaração de Imposto de Renda no mesmo dia, pela internet.
As empresas do Grupo Soares -Frango Líder, Paraíso Agroindustrial, Café Serrado e Refrigerante Xuí- , que já receberam R$ 18,1 milhões em dois anos, foram abertas por meio de fraudes. Funcionários de Romildo foram usados como "laranjas" nos empreendimentos. Romildo era procurador das empresas, com plenos poderes. Alguns dos sócios-proprietários apresentavam renda anual de R$ 6.588,40 ou R$ 6.629,40, conforme declaração de IR. "Como é possível, com uma renda média mensal em torno de R$ 500, possuir um patrimônio acima de R$ 3 milhões", questiona conclusão de auditoria feita pela Receita Federal.
Sócios da Frango Líder, Hilton Campos e Sildely Fantana declararam possuir fazendas em Campos Lindos e Vitória do Xingu, em Tocantins. Os cartórios locais não tinham registro dos imóveis.
Apesar de todos os indícios de irregularidades, os projetos foram aprovados pela Sudam. Os fiscais não checaram as contradições entre as declarações de renda e patrimônio. O Ministério Público e a PF decidiram grampear os donos das empresas. Nas primeiras gravações descobriram novos personagens, os donos de escritórios credenciados na Sudam.
A nova fase da investigação chegou aos escritórios de Geraldo Pinto da Silva e Maria Auxiliadora Barra Martins, que tratavam das liberações de recursos na superintendência. Surgiram então os indícios de envolvimento de funcionários da Sudam no recebimento de propina e tráfico de influência.
Só Maria Auxiliadora liberou R$ 248 milhões em cinco anos.
É evidente a "existência de laudos técnicos forjados e a conivência criminosa de funcionários para a provação e liberação de recursos", diz o Ministério Público no pedido de prisão dos envolvidos.
Foram identificados três grupos no esquema: os sócios de projetos, os escritórios de assessoria e os funcionários da Sudam. Mas haveria um quarto grupo, "esboçado por indícios de envolvimento de funcionários do Ministério da Integração Nacional".




Texto Anterior: Painel
Próximo Texto: Gravação revela detalhes de fraude no órgão
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.