São Paulo, domingo, 22 de abril de 2001

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Geração tem tudo, mas é insatisfeita

DO ENVIADO ESPECIAL A QUÉBEC

Os ativistas canadenses que vão promover um "carnaval antiglobalização" em Québec fazem parte de uma geração que possui tudo o que o capitalismo tem para oferecer de melhor e, em certa medida, não está satisfeita.
Jason Pouflle, 21, é um bom exemplo. Pouflle não estuda, nem trabalha.
Há sete meses, ele viaja pelo país, patrocinado por um programa do governo canadense, para prestar serviços esparsos em várias comunidades e ganhar experiência de vida.
"Se eu quisesse, poderia me formar, ganhar dinheiro, comprar uma bela casa com jardim, cachorro e tirar duas férias por ano", comenta Pouflle.
Ele usa um pequeno óculos com aros retangulares pretos, cavanhaque e cabelos longos trançados.
"No Brasil, poderiam me invejar, mas não é o que eu quero", afirma o manifestante.
O sonho de Pouflle é ter uma fazenda com plantação de produtos orgânicos em sua cidade natal, Peterborough, e criar um movimento local para brigar com as corporações e defender o direito das minorias.

"Confiança"
"Meus pais me ensinaram que o principal na vida não é ganhar dinheiro, mas é o modo como nos relacionamos com as outras pessoas", diz a estudante de economia e desenvolvimento internacional Faith Mansfield, 24.
Faith é conhecida no acampamento do Movimento Sem-Terra na cidade paranaense de Nova Laranjeira como "Confiança".
Esse é o nome que ela adotou para facilitar seu contato com os trabalhadores rurais.
Faith ou "Confiança" mora na cidade canadense de Winnipeg e foi muito influenciada pelos valores religiosos de seus pais, que são anglicanos.
Além de ter passado quatro meses no acampamento do Movimento Sem-Terra, ela prestou serviços sociais na África e quer voltar a atuar no Brasil.
"Quando vejo a coragem dos trabalhadores sem-terra no Brasil, também me sinto na obrigação de protestar no Canadá", afirma a estudante, que estará na linha-de-frente das manifestações pacíficas que acontecerão em Québec.

Qualidade de vida
Os manifestantes canadenses contam com excelentes serviços básicos, como educação e saúde, garantidos pelo governo.
Com uma renda per capita de US$ 23 mil, segundo dados de 1999, o Canadá está no topo da lista dos países com melhor qualidade de vida.
Seja por solidariedade, consciência social, religião, idealismo ou busca de aventura, muitos jovens canadenses estão se engajando nas novas formas de luta política e social, trabalhando e prestando serviços para as organizações não-governamentais.
Sebastian Gilbert Corlay, 24, é neto do ex-chefe do departamento de polícia da cidade canadense de Montreal.
Ele e o avô, 81, dividem um apartamento em Montreal e tem idéias bem diferentes sobre protestos, justiça social e papel dos governos.
"Ele foi treinado em um ambiente de forte hierarquia", afirma Sebastian, que é jornalista e trabalha para veículos de comunicação alternativos.
"Eu acho que é preciso contestar as autoridades e sou a favor da desobediência civil para corrigir as injustiças no mundo", afirmou o jovem.
Sebastian trabalha na organização social Alternatives. Em 2000, ele passou uma temporada no Marrocos ensinando membros de comunidades pobres a criar jornais na internet para brigar por direitos sociais.

"Ganhando corações"
"Estamos ganhando corações e mentes no Canadá", acredita a ativista social canadense Maude Barlow, citada por uma revista de esquerda como um dos seis nomes mais influentes internacionalmente no movimento antiglobalização.
Todos esses ativistas estão entre os milhares de manifestantes que saíram às ruas em Québec no "carnaval anticapitalismo".
A grande maioria planeja marchas pacíficas e bem humoradas. Uma minoria vai tentar bloquear ruas, derrubar pedaços da "muralha da vergonha" e invadir a área onde se reúnem os chefes de Estado, que participam das discussões sobre a Alca (Área de Livre Comércio das Américas).
"Cada grupo tem uma estratégia própria", diz Jan Renaud Lauzé, da Gomm, uma das organizações responsáveis pela coordenação do protesto. "O que cada um vai fazer é imprevisível."
(RG)


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