São Paulo, sábado, 22 de abril de 2006

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ELEIÇÕES 2006/ABRIL VERMELHO

João Paulo Rodrigues diz que movimento vai estreitar relação com CUT, UNE e sem-teto

Líder do MST elogia protestos na França e quer ações urbanas

Hans Von Manteuffel/Agência O Globo
Jaime Amorim (à dir.) conversa com João Paulo Rodrigues, em Recife; ambos são líderes do MST


FÁBIO GUIBU
DA AGÊNCIA FOLHA, EM RECIFE

O MST, movimento que tem nas invasões de terras o seu principal modo de atuação, pretende atuar mais na cidades. A idéia é estreitar relações com entidades e movimentos sociais urbanos representativos para fortalecer as manifestações de rua e, de quebra, o próprio MST. Com isso, quer viabilizar o que chama de "revolução". Apesar do discurso, a ida às cidades vai ter de esperar, ao menos, as eleições deste ano.
O projeto foi anunciado ontem pelo coordenador nacional do MST João Paulo Rodrigues, em Recife, onde participa do 2º Fórum Social Brasileiro, na UFPE (Universidade Federal de Pernambuco). Porém, o sem terra não explicou como fará a revolução pretendida. "Revolução, para nós, é resolver o problema da reforma agrária, da educação, da saúde, fazer com que o Estado seja menos burocratizado", explicou Rodrigues.
Tido como um dos principais interlocutores do MST com o governo federal, Rodrigues citou os protestos ocorridos na Venezuela e na Bolívia como exemplos de experiências de mobilização. Na Bolívia, as manifestações ora pressionam o governo sobre a posse de campos de gás ora reivindicam o direito de plantar coca. Quase sempre terminam em conflitos com a polícia. Na Venezuela, os principais atos recentes tinham como objetivo atacar a violência urbana no país e a corrupção policial. Porém, Rodrigues deixou claro que os atos ocorridos na França neste ano são o modelo ideal do movimento.
No final de março, estudantes e sindicalistas franceses promoveram uma série de protestos e greves contra a lei trabalhista, parando o país. Houve conflitos e prisões. A lei acabou rejeitada - a França tem uma longa história de leis de proteção social, tradição que os manifestantes conseguiram manter. "O Brasil só conseguirá resolver seus problemas estruturais se tivermos o povo na rua. Por isso, nós precisamos fazer um esforço, fazer com que a França seja aqui", diz Rodrigues.
A decisão surgiu a partir da constatação das lideranças de que o MST estava perdendo força. "A maioria da população está nas cidades", diz o líder sem terra. Segundo ele, por ser "uma das menores organizações sociais que existem no país, o MST tem a clareza de que, para fazer mudanças no Brasil, precisa ter uma base muito maior". "Como conseguimos construir a Via Campesina rural, precisamos construir a Via Campesina urbana", disse.
O MST ajudou a fundar a Via Campesina em 1992 e é uma das entidades mais influentes deste fórum que reúne diversas organizações de agricultores do mundo todo. Seu objetivo é garantir o apoio de uma organização à outra, inclusive em mobilizações.
Rodrigues citou a CUT (Central Única dos Trabalhadores), a UNE (União Nacional dos Estudantes) e os movimentos dos sem-teto e dos desempregados como entidades que poderão se unir aos sem-terra. A CUT apóia a idéia. "A tendência é apoiarmos toda e qualquer mobilização de entidades sociais. Apoiaremos integralmente ações do MST no campo e na cidade. Mas espero que o MST não deixe de fazer a luta pela terra", afirmou ontem o secretário de Comunicação da CUT, Antonio Carlos Spis. A UNE não foi localizada para comentar a proposta.
O governo federal não respondeu às declarações do MST. Procurados por meio de suas assessorias, até a conclusão desta edição os ministros Guilherme Cassel (Desenvolvimento Agrário) e Paulo Vannuchi (Direitos Humanos) não haviam falado.

Trégua na eleição
Não há prazo para o início das investidas do MST nas cidades. O tom de ameaça se dissipa nos prazos. Rodrigues diz que as negociações para as alianças já estão em curso. Até junho, os movimentos discutirão os objetivos para a definição de uma pauta comum de reivindicações, mas as mobilizações só deverão acontecer a partir do próximo ano. Até lá, disse Rodrigues, os protestos no campo serão prioritários. Mas com um intervalo de ao menos seis meses.
A partir de julho, os sem terra acenam com a possibilidade de uma trégua no campo. "É bem provável que no segundo semestre fique mais difícil [promover protestos], mas não é porque atrapalha a eleição. É porque não tem com quem negociar", disse Rodrigues, que ainda afirma que as lideranças do movimento estão discutindo com suas bases a posição da entidade em relação aos candidatos à Presidência. "O mais provável é uma decisão de autonomia política, pelo menos no primeiro turno", declarou.
Sobre as acusações de que o MST promove atos violentos, disse: "O Poder Judiciário reconhece que [a invasão] é um ato democrático, na medida em que você ocupa uma terra improdutiva para demonstrar que ela precisa servir para a reforma agrária", disse.
"Destruir o laboratório da Aracruz, no Rio Grande do Sul, não é uma ação violenta, é uma desobediência civil", afirmou. "Nenhuma pessoa ficou ferida naquela ação. Isso é um ato de violência contra quem? Contra a infra-estrutura? Contra as plantinhas que estavam lá?", questionou.


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