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JANIO DE FREITAS
A terceira reforma
Enquanto não lhe ocorrem
mudanças mais próximas
dos compromissos de seus dirigentes com o eleitorado, nem
por isso o governo fica imóvel. Já
avançada a desreforma previdenciária e encaminhada a anti-reforma tributária, a Presidência deu mais um passo para
reformar os históricos e universais métodos do jornalismo.
Há uns dois meses, diante das
críticas à recusa de Luiz Inácio
Lula da Silva a dirigir a palavra
aos repórteres brasileiros, seu
braço direito (em outros tempos
era o esquerdo) Luiz Gushiken
fez a concessão de admitir que
era conveniente algum contato
presidencial direto. Veio, então,
o primeiro passo da reforma: foi
inventada a entrevista sem perguntas, que estavam proibidas.
O presidente fez aos repórteres
uma espécie de show exclusivo,
com uma peroração em tudo
igual às de todos os dias, onde
lhe seja oferecida oportunidade.
Ou a oportunidade de criar
uma oportunidade para mais
um evento típico de candidato.
Por algum motivo indefinido,
mas presumivelmente ligado a
desejos de retribuição, no final
de semana passado apareciam
duas entrevistas de Lula, uma à
TV Globo e outra a "Veja". As
duas exclusividades, propostas
pela própria Presidência, pegaram mal nos numerosos jornais,
TVs, rádios e revistas ostensivamente repelidos. Assim, a título
de reparo, surgiu a ocasião para
um duplo avanço mudancista.
Repórteres de variadas Redações estiveram à mesa para um
misto de café da manhã e entrevista com o presidente. Dois jornalistas de cada Redação convidada. Mas não escalados, como
sempre, segundo critérios de
chefes de reportagem, editores
ou diretores. Se não em todos, e
tudo indica que sim, houve casos em que a própria Presidência se atribuiu aquela responsabilidade, designando quem deveria estar presente. Não há o
que ressalvar a respeito de escolhas. Trata-se de observar o importante avanço. Avanço sobre
atribuições implícitas na liberdade de imprensa. Uma atividade jornalística não se confunde com um encontro social.
O segundo passo não foi menos interessante: proibido o uso
de gravador. E, diante de cada
jornalista, a conveniente profusão de pratos, copos, xícaras e
talheres, entre os quais alguns
insistiram em alojar seu bloco
de anotações.
Bush, imagina-se, ficaria muito surpreso se, no meio de uma
de suas entrevistas diárias, fosse
informado de que mesmo ele
tem uma liçãozinha de comportamento democrático a dar a alguém.
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