São Paulo, domingo, 22 de setembro de 2002

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GOVERNO

Objetivo seria evitar processos contra Fernando Henrique após o mandato

Procuradores suspeitam de "rede" para proteger FHC

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

O lobby de tucanos na escolha de desembargadores do Tribunal Regional Federal da 3ª Região alimentou a idéia de que se forma na Justiça Federal paulista uma "rede de proteção" para quando Fernando Henrique Cardoso, que tem domicílio eleitoral em São Paulo, deixar a Presidência.
"A alternativa de uma rede de proteção é uma hipótese plausível, se não for aprovado o projeto de lei restabelecendo o foro privilegiado para ex-ocupantes de cargos públicos", afirma a procuradora regional da República Ana Lúcia Amaral, 49.
"Eventuais ações de natureza penal e civil, por atos praticados no exercício de mandato eletivo federal, teriam necessariamente que tramitar na Justiça Federal do domicílio do réu", diz Ana Lúcia.
A Folha apurou que essa hipótese -admitida reservadamente por outros membros do Judiciário e do Ministério Público- é reflexo das nomeações dos ministros Nelson Jobim, Ellen Gracie e Gilmar Mendes, no Supremo Tribunal Federal, e do advogado João Otávio de Noronha, ex-diretor jurídico do Banco do Brasil, no Superior Tribunal de Justiça.
Essas nomeações foram associadas ao temor atribuído a Fernando Henrique de vir a ser perseguido por juízes e procuradores, depois do mandato.
Para o porta-voz da Presidência da República, Alexandre Parola, Fernando Henrique "entende que carece de sentido e pertinência qualquer insinuação referente a objetivos alheios aos critérios de escolha, tal como definidos pela Constituição".
Segundo Ana Lúcia, "pelo que observo e ouço, há o predomínio no TRF3 de um certo grupo que parece ter excelente comunicação com o Palácio do Planalto".
Ela se refere ao apoio de Jorge Scartezzini, ex-presidente do TRF3 (97-99) e ministro do STJ, à nomeação -pelo Presidente da República- de alguns desembargadores. O TRF3 tem sede em São Paulo e jurisdição nos Estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul. Scartezzini nega essa influência.
No discurso de posse, no último dia 13, o mais novo desembargador do TRF3, Luís Antônio Johonsom Di Salvo, juiz escolhido em lista tríplice pelo critério de merecimento, disse que devia sua nomeação a Scartezzini, presente ao ato. Di Salvo ainda agradeceu a amigos do Executivo e Legislativo. O procurador-geral da Fazenda Nacional, Almir Martins Bastos, representou o ministro Pedro Malan na solenidade de posse.
As listas tríplices são encaminhadas pelo TRF3 ao ministro da Justiça, que, após as averiguações formais, encaminha três decretos para a escolha e assinatura do presidente. Quando o presidente já tem um nome escolhido, sobe apenas um decreto.
Na gestão de Scartezzini, o TRF3 obteve aval da Fazenda para receber da Caixa Econômica Federal o prédio da sede do tribunal, na avenida Paulista, em permuta.
"Desconheço em quantos Estados, sedes de tribunais federais, a Caixa e o governo federal tenham sido tão generosos", diz a procuradora da República. A adaptação do prédio, por conta da Caixa, gerou processo no Tribunal de Contas da União para corrigir irregularidades nas obras.
No salão nobre na sede do TRF3, no 25º andar, há uma escultura representando a Justiça, com o nome de Scartezzini destacado numa grande placa.
Nomeado ministro do STJ por Fernando Henrique em junho de 1999, tendo como "padrinhos políticos" o governador Mario Covas e integrantes da área econômica do governo, Scartezzini é irmão do ex-ministro Cid Flaquer Scartezzini, que se aposentou no STJ em fevereiro daquele ano.
Jorge Scartezzini é casado com a ex-desembargadora do TRF3 Ana Maria Flaquer Scartezzini, que trabalha no escritório de advocacia de Arnold Wald, em São Paulo. Wald é um dos advogados de defesa em processo de improbidade administrativa em que são réus ex-dirigentes do Banco Central e os ministros Pedro Malan e Pedro Parente, entre outros.
No TRF3, Scartezzini revelou independência em relação ao governo federal, quando manteve em 1997 liminar contra o leilão da Vale do Rio Doce, a decisão mais importante na disputa jurídica contra a privatização da estatal.


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