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CAMPO MINADO
Movimentos sociais já têm 880 mil pessoas vivendo em acampamentos para pressionar por reforma agrária
Total de acampados cresce 33% em 2 meses
EDUARDO SCOLESE
DA AGÊNCIA FOLHA
Como forma de pressionar o governo federal a realizar a reforma
agrária historicamente prometida
pelo PT, os movimentos sociais
incharam para 200 mil o número
de famílias acampadas em todo o
país. Em apenas dois meses, houve um acréscimo de 33% no total
de pessoas acampadas.
Levantamento feito pela Agência Folha nas 29 superintendências regionais do Incra (Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária) aponta para pelo menos 197.078 famílias acampadas
atualmente no país. O número,
porém, deve chegar à casa das 210
mil, pois São Paulo e sul do Pará
ainda trabalham com números
parciais.
Na prática, são 880 mil pessoas
vivendo debaixo de barracos de
lona aguardando a criação de assentamentos.
A atual quantidade de trabalhadores rurais nos acampamentos
representa um crescimento de
228% em relação ao último semestre do governo FHC (60 mil
famílias acampadas) e de 33% sobre julho passado (148 mil), segundo dados do Incra.
Tática de pressão
"Sem dúvida é uma tática de
pressão sobre o governo", declarou João Paulo Rodrigues, da
coordenação nacional do MST
(Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra). O movimento
esperava atingir o atual patamar
de acampados em dezembro.
Sete Estados concentram 60%
dos acampados -Bahia, Mato
Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraná e Pernambuco. O ranking é liderado
pelos pernambucanos, com
23.842 famílias, somando-se dados das superintendências do Incra em Recife e Petrolina.
No sul do Pará, a seção do Incra
em Marabá tem 4.661 famílias cadastradas (dado utilizado pela reportagem), mas afirma que outras cerca de 6.000 têm recebido
cestas básicas nos acampamentos
da região.
O cadastramento dos sem-terra
tem sido lento -o relatório final
já deveria ter sido apresentado em
julho. O atraso dos trabalhos se
deve principalmente à falta de
verba para o envio dos entrevistadores aos acampamentos. O Incra
mato-grossense é um reflexo da
ausência de recursos -só conseguiu cadastrar 28% das 19.307 famílias acampadas no Estado.
Assistência
A falta de dinheiro alegada pelo
governo como responsável pela
demora na aceleração da reforma
agrária também reflete na assistência básica aos acampados.
Desde o início do ano, o governo
federal distribuiu, em média, menos de uma cesta básica por família -um total de 174 mil cestas,
segundo o Ministério da Segurança Alimentar e Combate à Fome.
Com o inchaço dos acampamentos, a primeira intenção dos
sem-terra é forçar o Palácio do
Planalto a aprovar ainda neste
ano um novo PNRA (Plano Nacional de Reforma Agrária). O
projeto do plano tem entre suas
metas assentar 1 milhão de famílias até 2006 e ajustar as normas
de execução do Incra para acelerar o processo de desapropriação.
A realidade do governo, porém,
tem sido diferente. Neste ano,
mesmo com a promessa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de
assentar 60 mil famílias, o número não deve ultrapassar as 10 mil.
Para o ano que vem, o recurso
programado prevê o assentamento de cerca de 25 mil famílias (13%
do total de acampados).
Demanda reprimida
"As mobilizações são parte de
uma demanda reprimida. O problema é que o otimismo se choca
com a pouca operacionalidade
efetiva da reforma agrária até agora", disse Gilmar Mauro, da direção nacional do MST.
Segundo a Agência Folha apurou, a idéia de priorizar os acampamentos às invasões se consolidou no início do mês, logo após a
troca de Marcelo Resende por
Rolf Hackbart na presidência do
Incra, considerada pelo movimento como uma traição do Planalto.
Para os sem-terra, a reforma
agrária maciça e que visava beneficiar os acampados ficou em segundo plano com a saída de Resende. Rolf, segundo o MST, será
uma espécie de "auxiliar" do ministro Miguel Rossetto -com
uma tendência pró-agricultura
familiar e programas de crédito
fundiário.
Instrumento
O presidente da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), Manoel José dos Santos, segue a mesma linha: "O acampamento é o principal instrumento de luta para a
promoção dos assentamentos,
sem dúvida nenhuma. O fluxo
dos acampamentos somente diminui com uma resposta do governo para avançar o programa
de reforma agrária".
Ao deixarem as invasões em segundo plano, os sem-terra evitam
descumprir a medida provisória
antiinvasões. A MP proíbe por
dois anos as avaliações e vistorias
em terras invadidas.
As invasões caíram 44% de julho para agosto -passando de 43
para 24, segundo o governo federal. Porém, nos oito primeiros
meses deste ano, ocorreram 184
invasões -quantidade que supera o total registrado de janeiro a
dezembro de 2001 e 2002, com 158
e 103 casos, respectivamente.
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