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ENTREVISTA DA 2ª
Mesmo insatisfeito, empresariado deve apoiar candidato do governo, diz pesquisadora Eli Diniz
Empresário já não teme PT, mas apóia FHC
Antônio Gaudério/Folha Imagem
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A cientista política Eli Diniz, no 25º Congresso da Anpocs, realizado na cidade de Caxambu (MG) |
ANTÔNIO GOIS
ENVIADO ESPECIAL A CAXAMBU
A cientista política Eli Diniz, do
Instituto de Economia da UFRJ
(Universidade Federal do Rio de
Janeiro), dedica sua vida acadêmica ao estudo do comportamento do empresariado brasileiro.
Já publicou "Empresário, Estado e Capitalismo no Brasil" (Paz e
Terra, 1978), "Empresariado e
Transição Política no Brasil" (Iuperj, 1984) e "Globalização, reformas econômicas e elites empresariais" (FGV, 2000), entre outros.
Irmã da falecida atriz Leila Diniz, Eli afirma que ninguém deve
se iludir com as recentes declarações de empresários se dizendo
descontentes com o atual modelo
econômico brasileiro e insinuando até mesmo um apoio ao PT nas
eleições presidenciais de 2002.
"Os empresários são suficientemente pragmáticos e flexíveis para recompor seu apoio a um candidato de situação do atual governo", diz. Segundo ela, a diminuição da rejeição a Lula "não se traduz em voto a favor do PT".
Seu último estudo, em parceria
com o cientista político Renato
Boschi, do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de
Janeiro), captou a insatisfação
com o atual modelo econômico
por parte de líderes empresariais.
O trabalho mostra que os empresários estão divididos em relação à política econômica de Fernando Henrique Cardoso -ele
também um estudioso do empresariado (autor de "Empresário Industrial e Desenvolvimento Econômico", de 1964). Um grupo tem
um discurso mais crítico, enquanto outro defende, com ressalvas, o modelo econômico de
FHC. Em comum, os dois grupos
exibem a certeza de que o processo de desestatização e abertura
econômica, deflagrado no início
dos anos 90, é irreversível.
O novo estudo de Eli e Boschi,
baseado em entrevistas com 30 líderes empresariais, foi apresentado na semana passada, no 25º encontro da Associação Nacional de
Pós-Graduação e Pesquisa em
Ciências Sociais, em Caxambu.
Folha - A um ano das eleições, hoje é mais comum ver empresários
reclamando do modelo econômico.
Alguns chegam a sinalizar uma
aproximação com o PT. Não parece
mais provável do que em anos anteriores um apoio ao partido?
Eli Diniz - Eu não tenho elementos para dizer como os empresários votarão. No entanto, seu padrão de apoio político desde o início da Nova República é o de escolha de candidatos de centro-direita. Eles votaram no Collor em
1989, temendo a vitória do Lula,
assim como apoiaram Fernando
Henrique nas duas últimas eleições. Acho muito pouco provável
que haja uma mudança tão grande a ponto de se traduzir em votos
para os candidatos de oposição.
O que está havendo atualmente
é uma diminuição da rejeição ao
Lula. Essa rejeição era muito alta.
O argumento das lideranças empresariais, hoje, é que o Brasil mudou tanto de 1989 para cá que já
não é mais possível voltar ao que
era antes. Mesmo que um partido
de esquerda vença, não é mais
possível propor mudanças que
signifiquem um retorno ao passado. Não dá mais para defender o
calote da dívida ou a reestatização
das empresas privatizadas. O próprio discurso do PT, que a imprensa chama de "light", incorpora esse aspecto.
Folha - Mas a insatisfação do empresariado com a política econômica é detectada na sua pesquisa.
Eli - A imprensa tem explorado
muito a insatisfação do empresariado como um fator favorável a
uma mudança das posições tradicionais. Acredito que os empresários são suficientemente pragmáticos e flexíveis para recompor o
apoio e superar suas divergências
com o governo. Um dos pré-candidatos do governo [José Serra" já
sinalizou que quer ser o candidato
da "continuidade sem continuísmo". Esse tipo de proposta pode
ter uma abertura entre os empresários. Algumas mudanças importantes da política econômica
atual poderão ser sugeridas pelos
pré-candidatos da continuidade.
Folha - Qual discurso eleitoral se
afina mais com as aspirações do
empresariado?
Eli - Os empresários deixam claro que são a favor da estabilidade
econômica, mas que ela só não
basta. Eles defendem uma política
mais agressiva de comércio exterior e uma política a favor da indústria nacional e de incentivo às
exportações. O que importa para
eles agora é mudar as prioridades.
Isso implica mudança da política
econômica, hoje simbolizada pelo
estilo de gestão de pedro Malan,
que deu uma rigidez muito grande à economia. Há um discurso
comum de que é preciso abrandar
essa rigidez, mas sem abrir mão
da estabilização.
O governo até permitiu o crescimento industrial no início deste
ano, mas foram medidas conjunturais, sem fôlego. Enquanto não
for rompida a vulnerabilidade externa, teremos apenas surtos espasmódicos de desenvolvimento.
Folha - Haveria margem para dar
apoio a Ciro Gomes, Itamar Franco
ou Anthony Garotinho?
Eli - Não é possível fazer essa
afirmação. Essas candidaturas
ainda estão muito pouco claras.
Até agora, o único partido que
apresentou um programa foi o
PT. Nem o ministro José Serra
nem Tasso Jeressaiti apresentaram claramente suas propostas. A
candidatura de Paulo Renato me
parece já estar descartada. Garotinho ainda está tateando. Enfim, é
muito cedo para apostar fichas.
Folha - Por que os empresários
prejudicados só agora demonstram sua insatisfação?
Eli - Parte significativa desse segmento mais atingido não teve
condição de liderar nenhuma
frente de resistência empresarial.
Muitos tiveram de vender suas
empresas ou perderam a projeção
e visibilidade política que tinham
antes. A análise das entrevistas
que fizemos no nosso último estudo [com o cientista político Renato Boschi" mostrou que, apesar
de muitos terem se sentido prejudicados, não se formou uma coalizão de perdedores que desse
mais visibilidade às críticas.
Folha - Quais setores se dizem
mais prejudicados e quais se mostram favoráveis ao atual modelo?
Eli - A avaliação positiva do governo era mais nítida em setores
que se reconheceram como beneficiários das mudanças, como entidades de indústrias da construção pesada, da construção naval,
de siderurgia e de petróleo. Os setores apontados como os mais
prejudicados foram os de autopeças, bens de capital e têxtil.
Folha - O que há em comum entre
esses dois grupos?
Eli - Nós observamos uma concordância com relação à importância da estabilização econômica, um legado de Fernando Henrique Cardoso e um modelo que
não tem mais volta. Apesar disso,
os empresários questionam o que
eles consideram perverso: a sobrevalorização do real frente ao
dólar e as altas taxas de juros, políticas mais claras do primeiro
mandato. A privatização, de forma geral, foi avaliada de forma
positiva. No entanto, mesmo o
processo de privatização revelou,
segundo as lideranças, erros graves de implementação, como ausência de compromissos em termos de investimentos futuros. Os
empresários do grupo menos favorável criticaram muito a atuação do BNDES nesse processo.
Folha - Como os empresários viram a ampliação dos grupos estrangeiros na economia nacional?
Eli - Há um consenso crítico da
forma como foi feita a abertura
comercial. Apesar de favoráveis,
as lideranças afirmam que não
houve um cuidado de acoplar
uma política mais consistente para preparar a indústria para essa
abertura. Não houve uma preocupação com o estímulo à exportação, o que gerou uma balança comercial desfavorável. É comum
também o argumento da necessidade de rever a participação do
Brasil na OMC (Organização
Mundial do Comércio) para permitir uma participação mais equilibrada do país no comércio internacional. A OMC tem favorecido
os países hegemônicos, e o Brasil
tem condições de explorar melhor seu poder de barganha.
Folha - Essa abertura e a presença
maior de grandes grupos internacionais não desarticulou politicamente as indústrias brasileiras?
Eli - Alguns empresários mais
críticos ao governo chegaram a citar essa preocupação. No entanto,
os mais afinados têm outra visão
do que é uma empresa estrangeira, diferente do modelo antigo.
Para esses, a empresa nacional é
aquela que gera emprego, produz
e se instala aqui, independente se
ela tem capital estrangeiro ou não.
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