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JANIO DE FREITAS
Um tempo sem remédio
Em outros tempos, mesmo
próximos, seria um desaforo
com a pessoa e um insulto ao
país. Sarney lhe daria resposta
enfezada. Itamar reagiria com
atitude forte de governo. Collor
aproveitaria para um gesto
presepeiro, mas também não
engoliria.
Três possíveis reações supondo-se que os dirigentes de laboratórios americanos no Brasil
ousassem dizer, ao tempo daqueles governantes, que estudam um pedido ao presidente
eleito dos Estados Unidos,
George W. Bush, para intervir
contra um ato do presidente
brasileiro relativo a preços de
remédios.
O que era desaforo foi feito
agora e recebido como coisa
natural, logo, sem necessidade
de reação do presidente. Quem,
por isso, sinta um travo de humilhação, tome um remedinho
multinacional para desativá-la. Não se pode criticar os dirigentes dos laboratórios americanos, que só terão agido de
acordo com a lógica de sua experiência e de fatos do seu conhecimento. Grossos podem
ser; malucos, não. Sabem onde
estão e com quem lidam.
Essas circunstâncias valorizam mais a batalha que José
Serra trava com os preços dos
medicamentos. Não é difícil
imaginar sua outra batalha,
para obter de Fernando Henrique Cardoso, contra o próprio e
contra Pedro Malan & cia., a
medida provisória congelando
em 4,4% os aumentos no ano
que vem.
A sem-cerimônia dos laboratórios americanos indica longa
duração para a guerra. Suas
ameaças de cortar os atuais
descontos, assim obtendo aumento de preços muito além
dos 4,4%, desafiam Serra, cuja
retaguarda não lhe é mais solidária do que o inimigo. Mas
nisso e por isso é que Serra se
tem mostrado o melhor dos ministros. Um dos dois ou três que
são ministros de fato.
Houvesse uma orientação governamental mais comprometida com os interesses do Brasil,
o velho e indecente problema
dos remédios se resolveria com
o que, hoje em dia, pode ser
apenas um comentário de Serra: "Se esses laboratórios fizessem nos Estados Unidos o que
fazem aqui, teriam problemas
graves na Justiça".
Os reprovados
A influência do boicote de
alunos nas notas que o MEC
atribui aos cursos superiores,
no provão, não é um critério: é
uma idiotice. Proveniente do
ressentimento pela crítica implícita na ausência e da falta de
propósitos sérios.
A ausência de examinandos
jamais pode indicar o nível de
sua capacitação. Mas o MEC a
usa para aviltar a nota de
"avaliação do curso". É, portanto, uma avaliação falsa. É
fraude. E pode estar afastando
futuros alunos de cursos que
são, de fato, qualificados e os
dirigindo para cursos inferiores, mas com notas melhores
porque seus alunos compareceram ao provão.
A título de exemplo, um curso
com muitos professores cuja capacidade conheço e admiro, o
de comunicação da Universidade Federal Fluminense, recebeu nota péssima por causa do
boicote, mas tem qualidade notória. É um dentre muitos com
o mesmo tratamento pelo
MEC.
Como diz a diretora do curso
da UFF, Irene Cristina do Amaral, "o MEC não contrata professores, não corrige salários e
não compra material há cinco
anos, mas se acha no direito de
cobrar". Cobrar o que ele próprio não tem. Nota Z, e não
apenas o reprovante E, merecem os tecnocratas do MEC-provão.
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