São Paulo, domingo, 22 de dezembro de 2002

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ELIO GASPARI

A Colômbia é aqui, está logo ali, no PMDB

A Câmara dos Deputados, o atual governo, o futuro governo e o PMDB parecem ter deixado de ver os jornais e os noticiários de televisão. Todos fazem de conta que não estão vendo o seguinte: um deputado federal, Pinheiro Landim (PMDB-CE), é acusado pela Polícia Federal de manter um e$critório para fazer favore$ e receber dinheiro de traficante de cocaína.
Um deputado do partido de Ulysses Guimarães, Tancredo Neves e Pedro Simon é acusado pelo poder público de ter ligações diretas e expressas com um narcotraficante, e a vida segue como se nada houvesse de anormal. Se bobear, alguém diz que isso não tem muita importância. Importante mesmo seriam as lágrimas da senadora Heloísa Helena, obrigada a um auto de fé pela Sagrada Congregação petista.
Nem o PT nem qualquer outro partido deveriam negociar coisa alguma com o PMDB enquanto sua direção não tomar uma posição pública a respeito das denúncias feitas pela Polícia Federal contra Pinheiro Landim. Não se pode exigir que Landim ou a velha e boa banda do PMDB mudem. O PFL manteve por um bom tempo em sua bancada o deputado Hildebrando Paschoal, que serrava os desafetos. Pode-se desejar que o novo governo imponha mudanças de hábitos às demais forças políticas. Receber dinheiro de traficantes de cocaína, por exemplo, seria pecado. Pinheiro Landim foi um leal parlamentar da base de apoio de FFHH, chegando à condição de coordenador da bancada nordestina para assuntos orçamentários. O tucanato, tão zeloso das suas prerrogativas até o último minuto do mandato, honrou o deputado com solene silêncio.
O Superior Tribunal de Justiça, colhido pela mesma investigação, tomou as providências destinadas a impedir que o pó cubra sua reputação. O que rolou nas gravações da Polícia Federal foi coisa jamais vista desde que o doutor Hildebrando teve seu açougue varejado pelas forças da lei e da ordem. É muito bom que o PMDB fique fora do governo, pelo menos é bom que fique fora enquanto tiver em sua bancada um deputado que mantém o seguinte diálogo com um traficante de cocaína:
"O pagamento vai atrasar. O avião do Vicente caiu com 450 em Rio Verde." Informa o delinquente. "Então está tudo bem. Agora, corre atrás do do Baixinho e do Peruzão. Preciso do dinheiro para resolver logo outros assuntos."
Landim é um homem de má (ou muita) sorte. Pelo lado das malfeitorias em favor do andar de cima, esteve num caso de discussão explícita de propina de empreiteiro. Pelo lado das malfeitorias contra o andar de baixo, foi um ruinoso relator do projeto de reforma dos planos de saúde.
A nação petista não tem narcoparlamentares. O PMDB pode ter deputados como Pinheiro Landim, é problema dele. Os fatos divulgados pela Justiça Federal são escabrosos, mas não podem ser considerados conclusivos. Mesmo assim, ao PMDB não se pede muito: só uma palavrinha, um gesto capaz de sinalizar para a patuléia que o partido se incomodou.

Ótima notícia: música erudita, da boa, de graça

Uma das melhores notícias do ano é o lançamento da segunda caixa de CDs do projeto "Acervo da Música Brasileira - Restauração e Difusão de Partituras". Coisa nunca feita no Brasil, rara fora das culturas européia e norte-americana. Há dois anos, Elisa Freixo, organista da catedral da Sé de Mariana (MG), contou a Eleonora Santa Rosa que havia nos arquivos da arquidiocese de Mariana algo como 2.000 partituras precisando de atenção. Guardavam memórias da música erudita brasileira dos séculos 18 e 19. Mais da metade eram composições de autores anônimos. Em outros casos, artistas conhecidos por meia dúzia de especialistas, jamais executados. Era isso o que acontecia com Bento Pereira, o mais antigo compositor mineiro conhecido. Dele achou-se apenas uma peça sacra e sabe-se que foi mestre da capela de Nossa Senhora da Conceição de Sabará entre 1748 e 1752. Mais nada.
Claira Floret, da Petrobras, interessou-se pelo trabalho de recuperação das partituras e colocou a empresa no negócio, bancando o projeto (R$ 3,2 milhões). A Petrobras quis que o projeto resultasse na produção de discos. Sob a coordenação do musicólogo Paulo Castagna, 11 especialistas e pesquisadores foram à luta. Tiveram o apoio do Museu da Música de Mariana e do arcebispo d. Luciano Mendes de Almeida. Editaram seis volumes de partituras inéditas e já puseram na rua duas caixas de CDs, cada uma com três discos. Se tudo der certo, no ano que vem sai o terceiro lote.
Mobilizaram-se abnegados instrumentistas e três conjuntos gravaram cerca de 45 peças, entre as quais a de Bento Pereira. Juntaram grupos que raramente conseguem atenção fora do circuito dos aficionados. Veio o coral mineiro Ars Nova, os grupos paulistas Brasilessentia e Engenho Barroco e os cariocas Caliope e Santa Teresa.
Os CDs (R$ 60) e as partituras (R$ 45) estão à venda no sítio do projeto, mas oito músicas podem ser capturadas de graça pela internet. As partituras também.
Poucas vezes um patrocínio cultural deu tão certo. Produziu coisa boa numa área de excelência que é habitualmente desprezada pela política de exaltação de eventos e celebridades. Quem haveria de se interessar pela preservação e execução das "Matinas de Natal" de um compositor anônimo, das quais se conhece apenas uma cópia (mal feita) do início do século 19? A Petrobras se interessou, e assim se vê que o Brasil, além de ter uma boa música erudita, tem musicólogos e instrumentistas tão refinados como dedicados ao mero exercício da cultura pela cultura.
Serviço: o endereço do projeto Acervo da Musica Brasileira é www.mmmariana.com.br.

O ITA fez ricos e ficou pobre

O reitor do Instituto Tecnológico da Aeronáutica, professor Michal Gartenkraut, reclama de que sua escola vai mal das contas. Recebeu R$ 11 milhões do orçamento, mas gastou quase o dobro. A folha de pagamento consome R$ 10 milhões.
Desde 1950, o ITA formou 4.200 engenheiros. Gartenkraut poderia convocar os ex-alunos da instituição, que receberam ensino gratuito da melhor qualidade e foram em frente.
Mandaria um formulário com duas perguntas:
1) O senhor é contra ou a favor do ensino superior gratuito?
2) Se é contra, tendo estudado de graça no ITA, o que acha de contribuir com R$ 100 mil nos próximos cinco anos? É uma quantia equivalente a uma mensalidade de R$ 2 mil.
Se metade dos ex-alunos do ITA puder assumir esse compromisso (semelhante ao que a patuléia desembolsa nas faculdades pagas), Gartenkraut arrecadará R$ 40 milhões por ano, o dobro do que recebe da Viúva.

Eremildo, o idiota

Eremildo é um idiota. Ele acredita em tudo o que o governo diz. Tanto no que diz o governo que está saindo quanto no que anuncia o governo que está entrando. O idiota ouviu o doutor Henrique Meirelles, presidente do Banco Central de Lula, dizer o seguinte:
"Ao contrário do que muita gente esperava, este governo não vai promover mudanças bruscas ou ideológicas na formação dos quadros de direção da política monetária."
Eremildo achava que ia haver mudanças, mas ele não se leva a sério porque sabe que é idiota. Assustou-se quando o doutor Meirelles indicou que não estava só. Havia muita gente esperando a mesma coisa.

Trégua

Na segunda metade de janeiro, as conversas do governo com o PMDB terão recomeçado, Em novos termos e, sobretudo, com novos interlocutores.

Entrevista

Miguel Giannini

(60 anos, 40 como esteta ótico, responsável pela escolha dos óculos de FFHH, Delfim Netto, Antonio Palocci e agora Lula.)
- Quando é que os óculos estão errados?
- Há duas condições. A primeira é estética. Os óculos devem respeitar cinco leis:
1) A lei do apoio nasal. Afora os problemas físicos, que eu gostaria de tratar adiante, se um par de óculos não estiver bem apoiado, vai entortar, subir ou cair pelo nariz. Muitas vezes a pessoa acha que a armação está mal ajustada. Ela está mal apoiada, ele parecerá desleixado e enxergará pior.
2) Lei das sobrancelhas livres. Depois dos olhos, as sobrancelhas são a principal forma de expressão facial. Se os óculos tapam as sobrancelhas, a única coisa que se mexe no rosto da pessoa é a boca. Congela a expressão. Essa pessoa nunca é lembrada pela expressão. Só pelos óculos. Lembra-se do Jânio? Há uns 20 anos o Delfim Netto usava esse tipo de armação. Felizmente permitiu que eu a trocasse.
3) Lei da idade para os óculos redondos. Depois dos 40 anos, os homens e mulheres devem tomar cuidado com as armações redondas de tartaruga. Elas destacam o "bigode chinês", aquele sulco que sai do canto do nariz e desce para o canto da boca. O ministro Pedro Malan usa esse tipo de óculos. Não lhe faz justiça. Derruba a expressão.
4) As hastes não devem encostar na têmpora, muito menos fazer sulcos. Dão a impressão de que a armação encolheu ou, o que é pior, que a pessoa engordou.
5) O menor é melhor. Quase sempre óculos grandes são um erro. Quem tem hipermetropia, deve usar as menores lentes possíveis. Elas funcionam como lupas. Saltam os olhos, destacam as rugas. O Paulo Francis usava lentes enormes e em todas as fotografias ele aparece com um olhar esgazeado. Na dúvida, a menor armação é melhor que a maior. Quando os óculos se fazem notar, houve algo errado na escolha. Os óculos do presidente, por exemplo, não chamam a atenção. Nem os do futuro ministro Palocci.
- Que tipo de problema de saúde pode advir do mau apoio da armação no nariz?
- Ela nunca deve marcar o nariz. Provoca problemas de pele, dificulta a respiração. A mesma coisa com a bochecha. A armação nunca deve encostar na bochecha. Com armações metálicas, pode provocar manchas e eczemas. A irritação sistemática da pele, na bochecha ou no nariz, pode até provocar câncer de pele.
- O senhor não acha que tanta preocupação com os óculos é um exercício de futilidade?
- Se você me disser que alguém é capaz de comprar armação sem se olhar no espelho, pode ser. Como isso não acontece, não é futilidade. Você pode ajudar uma pessoa a não escolher uma armação pesada, explicando-lhe que na loja ele não a experimenta com o peso da lente e fica com ela uns poucos segundos. Eu ajudo os meus clientes e gosto muito de fazer isso. Alguns deles, como o atual e o futuro presidente, muito me honram. Os índios do Xingu e as crianças a quem ajudo, não divulgo. Gosto da minha profissão e sei que ela me ajuda a servir aos outros.


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