São Paulo, quinta-feira, 22 de dezembro de 2005

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HERANÇA MILITAR

Anúncio da liberação de documentos foi feito pela ministra Dilma Rousseff, perseguida pelo regime

Ex-guerrilheira "abre" arquivos da ditadura

PEDRO DIAS LEITE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Coube a uma ex-guerrilheira, a hoje ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, anunciar ontem o fim de um capítulo da ditadura militar. Centenas de milhares de documentos dos órgãos de investigação do regime foram transferidos ontem da sede da Agência Brasileira de Inteligência para o Arquivo Nacional de Brasília.
De acordo com Dilma e com integrantes do governo ligados à transferência dos arquivos, todos os documentos anteriores a 1975 -justamente o período mais duro do regime militar- estão liberados, porque não houve, em nenhum momento deste governo ou do anterior, a renovação do sigilo sobre os papéis ultra-secretos, que têm prazo de 30 anos.
A ministra não quis dar certeza de que todos os documentos foram transferidos de fato. "Não tenho a menor condição de afirmar o que aconteceu nos anos anteriores, se estão intactos ou não."
Na prática o acesso a esses documentos ainda deve ser limitado, especialmente no começo. Eles estão organizados, em grande parte, como fichas pessoais, e, para não haver violação de direitos individuais, somente poderão ser estudados com autorização dos investigados.
"Tudo que se refere à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas, há garantia de acesso restrito ao diretamente interessado, ao cônjuge, aos ascendentes ou descendentes. Aos demais, as informações relativas a terceiros estão protegidas, você pode consultar desde que o nome seja preservado, a não ser com a expressa autorização", afirmou Dilma ontem de manhã.
No entanto, segundo um integrante do governo responsável pela transferência dos arquivos, a intenção é que, agora que estão sob cuidado de historiadores, os documentos sejam classificados por assuntos também. Assim, seria mais fácil seu estudo por pesquisadores e jornalistas, apenas com a omissão dos nomes dos envolvidos nos episódios. Os arquivos devem estar abertos para consulta a partir de janeiro.
A medida dá um acesso mais amplo aos arquivos. Antes, quem quisesse saber o que havia sobre si próprio, recebia um resumo da Abin com as informações. Agora, terá o número do documento, sua origem e o teor, entre aspas.
Perseguida pelo regime militar, a ministra estava emocionada. Com fama de ser muito dura nas negociações e com seus auxiliares, ontem soltava frases sem terminá-las, embargava a voz e chegou a ficar com os olhos marejados. "Fico emocionada obviamente", admitiu. "É muito importante um país se redemocratizar, eu sou fruto desse momento", complementou a ministra.
Depois de cerimônia para empossar o novo secretário especial de Direitos Humanos, Paulo de Tarso Vannuchi, 55, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comentou a medida: "Só poderia ser aberto quando a gente estivesse preparado, a Dilma fez no momento certo, o Zé Dirceu [antecessor no cargo] já tinha trabalhado nisso...".


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