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São Paulo, domingo, 23 de fevereiro de 2003

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CAMPO MINADO

Medidas do governo Lula acabam com modelo desenvolvido por FHC

"Pacote" prevê auditoria no Incra e nova reforma agrária

EDUARDO SCOLESE
DA AGÊNCIA FOLHA

O modelo de reforma agrária tocado pelo governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) está com os dias contados. Isso porque o Ministério do Desenvolvimento Agrário já tem em mãos um pacote de medidas que promoverá uma verdadeira reviravolta no setor.
Drásticas, as mudanças elaboradas pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva e que serão anunciadas a partir desta semana vão desde a mudança dos conceitos para "assentado" e "assentamento" até a criação de um novo Plano Nacional de Reforma Agrária.
Além disso, segundo a Agência Folha apurou, o Planalto acabará com a inscrição via Correios dos sem-terra interessados nos programas de reforma agrária e ainda promoverá uma extensa auditoria no Incra (Instituto de Colonização e Reforma Agrária) a fim de reestruturar o órgão.
Outro ponto é também político. O ministério fará uma ampla auditoria no campo, possivelmente em convênio com a Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), para evitar que o PSDB continue a propagandear o "assentamento de mais de 600 mil famílias" na era FHC. A própria Folha já indicou, no ano passado, que tais números foram inflados.
"Primeiro, vamos expor a realidade que dê conta de um diagnóstico da situação, que oriente a nossa política [de metas]. E, segundo, é dever do governo e um direito da sociedade ter uma informação correta [do número de assentados]", declarou o ministro Miguel Rossetto à Agência Folha.
Já é conhecida também a intenção do governo federal de alterar o texto da medida provisória editada por FHC que criminaliza as invasões de terra. A Procuradoria Jurídica do Incra já enviou ao ministro Rossetto uma nova versão da MP, que abrandará as punições aos sem-terra.
A MP proíbe por dois anos as avaliações e vistorias em terras invadidas, exclui do programa de reforma agrária os camponeses que participarem de invasões e suspende todos os processos em tramitação durante as invasões.
Três semanas atrás, o governo já havia anunciado a extinção do Banco da Terra, principal programa de crédito fundiário dos tucanos, e retirado da página do ministério na internet os nomes de 25 trabalhadores rurais excluídos dos programas de reforma agrária por terem participado de invasões de terra.
A proposta mais audaciosa dos petistas é a criação de um novo Plano Nacional de Reforma Agrária, a ser lançado oficialmente em 25 de julho próximo, dia do Trabalhador Rural.
O objetivo do ministério é criar, ouvindo ruralistas e sem-terra, uma perspectiva de mexer na estrutura agrária do país, deixando de lado a priorização de políticas assistencialistas.
O PT avalia que a política de assentamentos, como é hoje, é assistencialista, na medida em que, depois de dar crédito e terra, deixa o agricultor à própria sorte.
A elaboração do novo plano está sob a responsabilidade do Incra, que já coordena discussões a respeito entre setores da sociedade e dentro do próprio governo.

Novos conceitos
Uma das primeiras medidas a ser anunciadas será a revogação de uma portaria criada em abril do ano passado na qual terrenos baldios são considerados "assentamentos" e trabalhadores rurais que nem sequer chegaram às terras, "assentados".
Os novos conceitos serão formulados com base no Estatuto da Terra (1964). "É um conceito limitado que não responde a uma visão democrática e modernizadora da reforma agrária do campo (...) A idéia de famílias assentadas deve estar inserida em um processo de organização produtiva, dispondo de um padrão de oferta de serviços públicos, água, assistência técnica, estradas, casa", afirmou Rossetto.
Outra prioridade será traçar um diagnóstico da estrutura do Incra por meio de uma auditoria a ser realizada pela Controladoria Geral da União. Atualmente o órgão conta com cerca de 5.500 servidores, sendo 40% deles em fase próxima à aposentadoria.
A demanda atual exige a contratação imediata de pelo menos outros 3.000 funcionários. Em meados dos anos 80, época dos projetos de colonização nas regiões Norte e Centro-Oeste, o Incra tinha cerca de 9.000 funcionários na ativa.


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