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ANÁLISE
O legado de Albuquerque
LUÍS NASSIF
do Conselho Editorial
"Não me sinto só. Há outros
brasileiros querendo o Brasil
melhor". O desabafo é do
ex-ministro da Saúde Carlos
Albuquerque, ontem, enquanto arrumava a bagagem para
retornar ao seu Estado.
Na semana passada, quando completou-se a cota de
3.300 municípios que aderiram ao Piso de Atenção Básica (PAB), a municipalização
já se tornara algo irreversível,
cravando um marco fundamental na história do incipiente federalismo brasileiro.
O projeto, já em implementação, consiste em transferir
para cada município valores
correspondentes a R$ 10,00
per capita. E deixar por conta
do município -com a fiscalização da Secretaria Estadual
da Saúde e do ministério- a
definição das formas de aplicar o dinheiro.
O ex-ministro Adib Jatene
deixou pronto o conceito do
Piso de Atenção Básica, mas
que envolvia recursos para assistência médica. Muitos gestores estaduais acusam Albuquerque de ter demorado na
implementação do programa.
Ele sustenta que conseguiu
ampliar a municipalização,
acabando com o controle de
grupos de poder sobre os programas de saúde do ministério. "O que fiz", diz ele, "foi
desarticular esse sistema, retirar o dinheiro dos fundos e
repassar para as prefeituras
que aderirem ao PAB".
Agora montou-se um sistema gerencial objetivo, onde as
responsabilidades estão claramente definidas, diz ele. O cidadão vai saber que atendimento básico, pré-natal, vacinas e outros programas são de
responsabilidade do prefeito,
acabando com a diluição de
responsabilidades, que impedia qualquer controle.
Ao mesmo tempo desarmou
a estrutura de comando desses programas. Para cada um
dos dez existentes, foi nomeado um conselho, composto por
figuras de realce na vida nacional, sem direito de interferir na operação, mas com poder de definir as políticas e
fiscalizar e controlar as aplicações de verbas.
Deu-se início à criação de
um sistema de auditoria,
constituído de controles estatísticos epidemiológicos, cruzamento de informações em
vários níveis e um convênio
com o Ministério Público Federal, para ajudar na fiscalização.
Também foi instituído um
sistema de contas separadas
no Banco do Brasil, às quais
terão acesso não apenas o Ministério da Saúde, mas também os Conselhos Municipais
de Saúde e as Câmaras de Vereadores.
Lições
Albuquerque leva para casa
lições aprendidas nesse breve
período como ministro:
1) mudar o Ministério da
Saúde e administrar saúde no
país não é tão difícil. O desafio é conviver com o meio ambiente do setor federal, os feudos e a estratificação de
idéias;
2) o poder provoca um distanciamento da realidade e
do povo. No final, são meia
dúzia de jornais e jornalistas
que fazem essa ponte entre
povo e governo, e muitas vezes não expressam aquilo que
é a realidade;
3) há a necessidade de toda
ação pública sempre estar ligada a uma visão sistêmica
do problema, para não dispersar. E nunca abrir mão
dessa ação sistemática em
troca de soluções parciais,
que parecem mágicas mas
que não tocam nas raízes do
problema;
4) a imprensa tem papel
fundamental na definição do
novo modelo, levantando
idéias e fazendo a fiscalização. Mas tem que se libertar
do monopólio da agenda negativa. Tem que criticar os
problemas, mas tem que ser
um agente de discussões sobre
os novos princípios, para ajudar no seu aprimoramento e
disseminação.
Email: lnassif@uol.com.br
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