São Paulo, Sexta-feira, 23 de Abril de 1999
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SISTEMA FINANCEIRO
Luiz Bragança é irmão de ex-sócio do ex-presidente do BC
Amigo de Lopes negociou ajuda ao Marka, diz Cacciola

MARTA SALOMON
da Sucursal de Brasília


Luiz Bragança, amigo de Francisco Lopes e irmão de seu ex-sócio na empresa de consultoria Macrométrica, intercedeu junto do ex-presidente do Banco Central em favor do Banco Marka. O contato ocorreu no dia em que o BC socorreu a instituição.
A informação aparece no depoimento que o dono do Marka, Salvatore Cacciola, deu à comissão de sindicância do Banco Central na última terça-feira. Segundo o relato de Cacciola, Luiz Bragança foi à casa de Lopes às 8h do dia 14 de janeiro. Na ocasião, teria feito uma exposição ""a respeito da situação aflitiva do Banco Marka".
Bragança viajou a Brasília num jatinho fretado pelo Marka na empresa Líder Taxi Aéreo. A empresa confirma a viagem.
No vôo, além de Luiz Bragança (irmão de Sérgio Bragança, sócio da Macrométrica), estavam Cacciola e o consultor Rubem Novaes. Este último é apontado como intermediário num suposto esquema de informações privilegiadas. Foi ele quem apresentou Luiz Bragança a Cacciola em 97.
As investigações em curso no BC, no Ministério Público, na Polícia Federal e na CPI do Senado apuram a participação dos irmãos Bragança e de Rubem Novaes nesse suposto esquema de vazamento de informações.
O depoimento de Cacciola, em que ele relata o encontro entre Bragança e Lopes, contraria declarações do ex-presidente do BC segundo as quais ele não teria participado das negociações para o socorro ao Marka.
Ao relatar que Rubem Novaes veio a Brasília no mesmo vôo, Cacciola também contraria nota divulgada pelo consultor negando vínculos com a operação ou contatos recentes com diretores do Marka.

Amizade útil
A presença de Luiz Bragança na missão foi atribuída, pelo próprio Cacciola, à amizade que ele mantinha com Lopes: ""...Sabia que o senhor Bragança mantinha relações pessoais de amizade com o senhor Francisco Lopes (seriam amigos de infância) e isso poderia ser útil no desenrolar das negociações".
""Diante da angústia em que se encontrava no dia 13 de janeiro, o declarante (Cacciola), necessitando de algum tipo de apoio ou assessoria, telefonou para o senhor Rubem Novaes e para o senhor Luiz Augusto Bragança, para que estes o acompanhassem em sua viagem para Brasília", registra o termo de declaração do dono do Marka ao BC.
Salvatore Cacciola relata que, na conversa com Bragança na manhã do dia 14 de janeiro, Lopes afirmara ""não vislumbrar uma solução para o caso".
Ocorre que, no decorrer desse mesmo dia, a diretoria do Banco Central aprovou operações de venda de dólar futuro da Bolsa de Mercadorias & Futuros para socorrer instituições em dificuldades. O socorro beneficiou o Marka e o Fonte Cindam e custou R$ 1,5 bilhão ao Banco Central.
Cacciola tomou a iniciativa de dizer à sindicância do BC que o ""apoio" prestado por Novaes e Bragança não fora remunerado, saíra de graça, ""até porque entende que não houve prestação de nenhum serviço".
Antes de Bragança procurar pessoalmente Lopes, o próprio Cacciola teria tentado, sem sucesso, um contato pessoal com o ex-presidente do BC no dia da substituição do comando do banco e da mudança da política cambial.
Depois da intervenção de Bragança, Cacciola teria voltado ao BC, já no dia 15, ""para tratar das formalizações finais a respeito da solução adotada para o Banco Marka". Nessa altura, Bragança voltou ao Rio de Janeiro.
Os interlocutores de Cacciola no BC teriam sido o assessor da presidência Alexandre Pundek e dois funcionários do departamento de Fiscalização (senhora Teresa e senhor Aguiar, não identificados). A lista não inclui diretores do BC.
Numa das idas do presidente do Marka ao BC, ele escreveu um bilhete para Lopes, encontrado na busca realizada em sua casa, pedindo condições melhores do BC. No texto, aparece grifada a expressão ""esquecer tudo". À comissão, Cacciola insistiu em que ""a expressão não significava esquecer nenhum fato desabonador em relação a Francisco Lopes".
Durante o seu primeiro depoimento ao BC, que durou sete horas e 20 minutos, o dono do Marka negou conhecer esquema de vazamento de informações privilegiadas do BC ou ter acesso a ele.
""Na verdade, o que foi colocado é que o mercado e algumas consultorias esperavam que, se fosse haver alguma alteração na política cambial, ela só ocorreria a partir de fevereiro", declarou o dono do Marka, tentando justificar por que apostara contra a desvalorização do real.
Encarregado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso de preparar a desvalorização da moeda, Francisco Lopes trabalhava com um cronograma inicial de mudança da política cambial apenas em fevereiro.
Em relatório entregue ao BC, Cacciola atribui a arriscada aposta no câmbio a previsões da Tendências Consultoria Integrada, segundo as quais o acordo do Brasil com o FMI afastaria os rumores de desvalorização.
Antes da viagem a Brasília, Novaes trabalhou como diretor do Marka no início da década. O consultor voltou a prestar serviços remunerados ao Marka depois da moratória da Rússia, ocasião em que teria apresentado Bragança a Cacciola.


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