São Paulo, domingo, 23 de junho de 2002

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JANIO DE FREITAS

A hora do Nobel

O prêmio Nobel tão ambicionado e sempre distante dos brasileiros tem, afinal, maiores chances: o ministro Pedro Malan inventou a estabilidade instável, equivalente à quadratura do círculo, e isso lhe permite concorrer em duas categorias, a de Economia e a de Física. Impôs pesados sacrifícios a 170 milhões de cobaias, mas, a credenciá-lo ainda mais, demonstrou o método simples de aplicar sua invenção: nada fazer diante dos problemas ou, se apertado, implorar dinheiro ao FMI.
Ninguém parece estar se dando conta, mas o feito da política econômica mantida com aplausos há oito anos não tem precedente na história brasileira e poucos países o alcançaram. Depois de tudo o que imprensa e TVs aqui têm dito sobre o arruinamento argentino, estar o Brasil imediatamente atrás da própria Argentina, como segundo país em situação financeira mais crítica no mundo, em apenas uma semana ultrapassando até o cambaleante Equador e a pioral da África, a Nigéria, tem um significado que só não alarma a leviandade nacional.
O que dizem as matrizes da especulação internacional, elevadas a templos na religião endolarada dos Malans, é que o Brasil está nas vésperas da Argentina. E o que se pode dizer, diante disso, é que só a sorte o livrará de que um peteleco de mau jeito, de algum especulador, provoque a implosão. Os Malans e sua política econômica apenas continuarão abúlicos, inertes e posudos.

Os Daniel
O declarado propósito de prejudicar a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva não invalida, a priori, as acusações de João Francisco Daniel, sobre um esquema de propinas na administração, em Santo André, do seu irmão assassinado, Celso Daniel. Há, porém, dois aspectos a serem distinguidos nas acusações.
João Francisco Daniel, ele próprio envolvido em pedidos suspeitos à Prefeitura, refere-se a propinas "para financiar as campanhas de Marta e de Lula", propinas cuja ocorrência, ou não, o Ministério Público paulista investiga há tempos. O adendo do Daniel sobrevivente é a finalidade que atribui, sem qualquer elemento de convicção, ao dinheiro ilegal, assim favorecendo os principais suspeitos de improbidades em benefício próprio.
O outro é a acusação à polícia e ao Ministério Público, segundo a qual "o processo de investigação não foi bem conduzido, ele [o prefeito Celso Daniel" foi assassinado porque se rebelou contra o esquema" de propinas. Ou João Francisco Daniel sabe mais do que está dizendo, e a polícia paulista fica em má situação, ou a afirmação indica um grau de leviandade que põe o próprio acusador sob suspeitas graves. Esse segundo aspecto da atitude político-acusatória de João Francisco Daniel ainda não está sob a necessária verificação.
Desde logo é possível notar uma contradição esquisita no que diz João Francisco Daniel. Seu irmão prefeito estava incumbido de coordenar a campanha de Lula, logo, aceitou a coordenação da campanha beneficiada pela propina a que resolvera dar fim.
A tragédia de Celso Daniel não se encerrou no seu assassinato. Primeiro, foi posto como vítima de um crime passional de homossexualidade. Agora, como personagem de um esquema de corrupção ativado sob sua autoridade de prefeito.



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