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MEMÓRIA
Brasilianista afirma que ex-governador do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul foi o político mais carismático do século 20
Brizola assustava a elite, diz Skidmore
RAFAEL CARIELLO
DE NOVA YORK
MURILO FIUZA DE MELO
DA REPORTAGEM LOCAL
O historiador Thomas Skidmore, 71, afirma que Leonel Brizola
foi o político mais carismático do
Brasil no século 20 e também o
que "mais assustou" a elite. Mais
que Luiz Inácio Lula da Silva?
Bem mais, declara o brasilianista
norte-americano.
Além de ter sido "a mais militante figura de esquerda" do país,
Brizola, para Skidmore, foi um
dos primeiros e um dos melhores
políticos brasileiros a saber usar a
TV. "Ele tinha uma habilidade
que poucas pessoas têm. Quando
encarava a câmera, ele projetava a
sua personalidade. Foi de longe o
melhor orador e o mais carismático político da esquerda. Lula não
assustava ninguém. Brizola metia
medo nas pessoas", disse o autor
de "Brasil: De Getúlio a Castelo" e
professor aposentado da Universidade Brown à Folha.
Era para amainar esse temor,
diz Skidmore, que o governador
do Rio de Janeiro e do Rio Grande
do Sul costumava se referir a si
mesmo como "o engenheiro".
"Para que todos soubessem que
ele era um bom engenheiro, integrante da classe média."
O historiador aproxima Brizola
de seu inimigo e oposto político
no campo ideológico, o governador do extinto Estado da Guanabara Carlos Lacerda (1914-1977).
Para Skidmore, ambos foram
mestres na arte da intriga política,
excelentes oradores, ficaram "à
margem" da Presidência da República, mas polarizaram a política brasileira nos anos 50 e 60.
O papel de polarizador se manifestou principalmente nos anos
anteriores ao golpe militar de
1964, afirma o historiador.
Lembrando a "Cadeia da Legalidade", destinada a garantir a posse na Presidência do petebista
João Goulart, após a renúncia de
Jânio Quadros e a tentativa dos
ministros militares de vetar a posse de Jango, Skidmore diz que "foi
Brizola quem organizou a defesa e
anunciou que, se os generais
mandassem tropas, afundaria navios em Porto Alegre".
Nos meses que antecederam o
golpe, o "engenheiro" foi "um
agitador", diz Skidmore. "Ele era
mais ameaçador, simbolicamente, que Goulart. Jango não tinha,
pessoalmente, esse caráter "macho" de Brizola."
Nos anos 80, afirma Skidmore,
Brizola perdeu prestígio e respeito na esquerda, embora o historiador afirme que em 84 o trabalhista ainda causasse temores entre os que se opunham à campanha das diretas -havia o medo
de que ele pudesse ser o eleito, caso a emenda passasse.
Finalmente, nos anos 90, Brizola se tornou, afirma o historiador,
"um fantasma ambulante", que
zelava pela própria saúde.
"Lembro de ter participado de
um programa de TV com ele, em
São Paulo, anos atrás. Depois do
programa, nós e um bando de jornalistas fomos beber num bar ali
perto. Todos tomamos um drinque, com exceção de Brizola. Disse para mim mesmo: "Esse filho
da mãe vai sobreviver"."
"Não foi grande democrata"
Para a historiadora Maria Celina D'Araújo, do CPDOC (Centro
de Pesquisa e Documentação de
História Contemporânea), da
Fundação Getúlio Vargas, Brizola
faz parte de uma geração de políticos que tinham pouco apreço
pelas instituições políticas. "Ele
foi um grande líder político, mas
não foi um grande democrata."
D'Araújo ressalta que Brizola se
destacou nos anos 60 por defender um projeto de democracia direta, que diminuía o papel do
Congresso Nacional.
"Na época, ele dizia que era preciso dissolver o Congresso, formado por forças conservadoras,
para instituir um Congresso popular, mas, ora, aquele Congresso
tinha sido eleito democraticamente", afirma.
A historiadora não chega a responsabilizar o ex-governador pelo golpe de 1964, mas diz que suas
declarações e atitudes radicais
ajudaram a isolar e, conseqüentemente enfraquecer, o então presidente João Goulart.
O ponto alto da radicalização de
Brizola ocorreu no discurso da
Central do Brasil, em 13 de março
de 1964, dias antes do golpe,
quando, ao lado de Jango, defendeu veementemente as reformas
de base. "Bandeiras como "reforma agrária, na lei ou na marra",
assustaram as classes médias e a
elite conservadora", diz.
D'Araújo diz ainda que as ações
nacionalistas de Brizola no governo do RS (1958-61), como a encampação de empresas estrangeiras, ajudavam a formar esse temor de sua imagem.
Com a fundação do PDT, após o
exílio, e na eleição de 1982, quando foi eleito pela primeira vez governador do Rio, Brizola incorporou bandeiras até então consideradas progressistas, como a defesa dos direitos das minorias. "Ele
tinha um discurso muito moderno, mas a prática no governo se
mostrou mais conservadora."
A historiadora destaca ainda a
coerência do ex-governador. "Ele
defendia idéias retrógradas, mas
nunca praticou estelionato eleitoral. Brizola sempre foi coerente
com a sua ideologia nacionalista."
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