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PERSONALIDADE
Acusado de participação em atos de tortura nos anos 70, militar teve seu registro médico cassado em 89
Médico Amílcar Lobo morre aos 58 no Rio
CRISTINA GRILLO
da Sucursal do Rio
O médico e psicanalista Amílcar
Lobo, 58, morreu ontem no Rio
devido a complicações cardíacas.
Lobo foi o primeiro médico na
América Latina a ser punido sob
acusação de participação em atos
de tortura.
Em 1989, ele teve seu registro de
médico cassado pelo CFM (Conselho Federal de Medicina) sob a
acusação de envolvimento com
tortura, decisão da qual recorreu.
O recurso ainda tramita no STJ
(Superior Tribunal de Justiça).
Internado havia 24 dias no hospital da Beneficência Portuguesa
(centro do Rio), Lobo teve como
causa da morte pneumonia, choque séptico e cardiopatia isquêmica.
Militar, ele serviu de 1970 a 1974
como segundo-tenente médico no
quartel da Polícia do Exército na
rua Barão de Mesquita (na Tijuca,
zona norte do Rio), onde funcionava também o Doi-Codi.
De acordo com denúncias de
ex-presos políticos, a função de
Lobo seria a de examinar os presos
para avaliar se poderiam continuar a ser torturados.
Lobo nunca admitiu ter participado de sessões de tortura. Admitia ter examinado presos políticos
após sessões de tortura, mas não
com o objetivo de verificar se poderiam continuar a ser torturados.
O próprio médico contou, em
1986, ter sido uma das últimas pessoas a ver o deputado Rubens Paiva ainda com vida, em 1971, no
prédio da rua Barão de Mesquita.
Ele teria examinado Paiva e constatado hemorragia causada por
torturas.
"É lamentável que ele tenha
morrido sem ter contado tudo o
que viu nas prisões políticas", disse a presidente do grupo Tortura
Nunca Mais, Cecília Coimbra.
Coimbra foi uma das responsáveis pelas acusações que levaram
Amílcar Lobo a ter seu registro
médico cassado pelo CFM em 89.
Ela foi presa em 1970 e levada para o Doi-Codi. "Ele me examinou,
mediu minha pressão e perguntou
se eu tinha algum problema cardíaco. Depois, disse para outra
pessoa que eu podia ir. Fui levada
para a sala de tortura", afirma.
As ligações de Amílcar Lobo com
a tortura causaram reflexos no
meio psicanalítico. Ao surgirem as
primeiras denúncias de seu envolvimento com a tortura, Lobo fazia
sua formação como analista.
Seu analista didata (responsável
pela formação) era o psicanalista
Leão Cabernite. Segundo os psicanalistas Hélio Pellegrino e Helena
Bessermann Vianna, Cabernite teria sido conivente com Lobo por
não ter denunciado, à época em
que o analisava, seu envolvimento
com a tortura.
Afastado da medicina, Lobo passou a ter problemas cardíacos. Seu
corpo seria velado no cemitério de
São Francisco Xavier até hoje. Ele
deve ser cremado na segunda.
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