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ELIO GASPARI
Lula de novo, sem casa para o povo
O comissariado confiscou o subsídio da Caixa para
aquele tipo de trabalhador
que o "nosso guia" já foi
DEVE-SE AO REPÓRTER Luís Alfredo Dolci o alerta: o Conselho Curador da Caixa Econômica, presidido pelo comissário Luís
Marinho, confiscou o subsídio que
a Caixa Econômica concedia aos
trabalhadores do andar de baixo
(renda familiar até R$ 1.750) na
compra de imóveis usados. Uma
pessoa com renda de R$ 1.050 podia
comprar uma casa velha por R$ 33
mil, ficando com uma prestação de
algo como R$ 172. Perdido o subsídio (R$ 9.000), sua prestação pulará
para R$ 263. Os companheiros decidiram que, se ele quiser o financiamento camarada da Caixa, deverá
migrar para o mercado de imóveis
novos. Trata-se de levá-lo a uma situação em que acabará procurando
um imóvel 40% mais caro, ou trocará de bairro, indo para uma localidade mais afastada. Neste ano, cerca de
70 mil famílias obtiveram empréstimos para a compra de imóveis usados. Menos de 10 mil preferiram casas novas.
O argumento em defesa do confisco sustenta que a construção de
imóveis novos estimula a economia
e gera empregos. A medida asfixia o
mercado das áreas pobres, onde os
trabalhadores negociam casas de
parentes e vizinhos. Reduz o interesse pela regularização de terrenos
e construções da periferia.
"Nosso guia" pode avaliar o alcance anti-social da medida. Desde
1952, quando desembarcou em Santos, Lula viveu numas dez casas, casou-se duas vezes e formou uma família, mas nunca conseguiu comprar um imóvel novo. Esteve em
fundo de bar, barraco, rua de lama
preta, quarto alugado e construção
onde as águas vizinhas entravam pela janela. Sua primeira casa (velha)
ficava numa ribanceira e foi adquirida com a indenização que recebeu
por conta da amputação de seu dedo
mínimo. Em suas palavras, "era uma
grande utopia ter uma casa própria".
O comissariado do Conselho Curador do FGTS (onde as centrais
sindicais têm assento) sabe o que
significa para um trabalhador caçar
um imóvel novo fora da região onde
vive. Ouça-se "nosso guia": "Eu tinha essa obsessão pela casa própria
porque, quando você tem filhos, você não pode ficar mudando de bairro
em bairro, porque mudar de bairro é
mudar de escola. A molecada muda
de companheiro, e aí nunca faz amizade. (...) Então, essa obsessão foi
um sonho que eu consegui realizar".
É provável que o primeiro investimento pessoal de Lula num imóvel
novo tenha ocorrido no ano passado, quando já estava sob a proteção
do Bolsa-Presidência. Trata-se de
um pequeno apartamento no balneário do Guarujá.
A obsessão dos trabalhadores que
ficaram no andar de baixo continua
do mesmo tamanho. As dificuldades
de hoje, quando a economia cresce a
3,5% ao ano, são muito maiores do
que no anos 70, quando o professor
Delfim Netto conseguia 10%. Os comissários conhecem a vida das vítimas do confisco. Passaram por ela e
não pretendem voltar a gramá-la.
Mesmo assim, por conta de um lero-lero de empresários, drenaram o fluxo dos financiamentos da Caixa. Numa estimativa grosseira, a exclusão
dos imóveis usados afasta do mercado de financiamento da Caixa mais
de metade das áreas onde vivem os
trabalhadores de baixa renda. Quando essas regiões degradam-se, "nosso guia", do alto da pirâmide de sua
sabedoria, culpa a elite, a oposição e
o passado.
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