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JANIO DE FREITAS
Além da corrupção
A movimentação de milhões no circuito de um projeto político constituiu muito mais do que permutas múltiplas de corrupção
LIDA COM serenidade durante
63 minutos pelo procurador-geral Antonio Fernando de
Souza, a síntese das conclusões a
que chegou a Procuradoria Geral da
República, a partir das suas e das investigações da Polícia Federal no
chamado mensalão e no caixa dois,
começou por ser deprimente para
acabar sendo assustadora.
Durante a longa CPI, os fatos e as
acusações explodiram de maneira
esparsa, em partes diferentes do escândalo, envoltos em passionalismo
político e quase sempre um tanto
transfigurados pelo exibicionismo
parlamentar ou pelo sensacionalismo jornalístico. Trançados agora
pelo procurador-geral em sua ordem lógica, e na engenharia da estrutura em que se processaram, os
fatos e as hipóteses já conhecidos revelaram uma configuração nova.
Não mencionada, nem mesmo insinuada, por Antonio Fernando de
Souza. Mas clara.
Aquela movimentação de milhões
privados e públicos no circuito de
um projeto político constituiu muito mais do que permutas múltiplas
de corrupção. Ali esteve a raiz de um
sistema de influência e poder que, se
desenvolvida como poderia muito
bem ter ocorrido, estaria apta a gerar conseqüências que só as especulações exageradas podem produzir.
Audácia, no pior sentido, é que não
faltaria.
É possível que o Supremo Tribunal Federal não acate agora, ou não
confirme no decorrer dos exames de
provas, as atribuições que a Procuradoria Geral faz a cada um dos incluídos no pedido de processo (é só
esse pedido que o STF está examinando). As gradações dos respectivos papéis, no quadro de responsabilidades e de propósitos, têm diferenças grandes entre vários dos citados. Mas as ressalvas que o STF faça,
supondo-se que as faça ou que fique
só em ressalvas, não podem alterar o
significado e o perigo da conjura que
ficou abrandada sob os nomes de
mensalão e caixa dois.
As defesas preliminares, na sessão
de ontem, foram o que são: defesas.
Até a redação desta coluna, apenas
uma ou outra com argumentos que
não devem passar sem exame especial de ministros do STF. Não foi a
hora, porém, de defesas propriamente ditas, e nesse aspecto qualquer avaliação é descabida. Avaliação de fundo, bem entendido. Porque de forma foi divertido rever em
um caso, como se trazida só para fins
arqueológicos, a caquética teatralidade que, pretendendo-se oratória,
transita entre o patético e a comicidade pastelão. Muito bem paga, sim.
Lula e o governo podem fingir-se
alheios ao que se passa no Supremo.
Até por não terem a fazer, afora isso,
senão atitudes de grandeza ética, ou
de sentido institucional, que não
lhes são próprias nas situações adversas. Alheios de fato, não podem
nem imaginar-se. O que foi descrito
na síntese apresentada ao STF tem
implicações passadas e reflexos presentes, todos diretos, sobre a natureza e as responsabilidades da Presidência, a par de sua conexão íntima
com o comando do PT relacionado
com a origem dos fatos e da denúncia da Procuradoria Geral da República.
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