São Paulo, Segunda-feira, 23 de Agosto de 1999
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ELDORADO DO CARAJÁS

Vice-prefeita de Belém, Ana Júlia (PT), diz que jurado mencionou quantia para absolver réus

Promotor quer apurar suposto suborno

LUCAS FIGUEIREDO
enviado especial a Belém

O promotor Marco Aurélio Nascimento, responsável pela acusação dos 150 policiais militares envolvidos no caso do massacre de Eldorado do Carajás (sul do Pará), pedirá ao procurador-geral interino de Justiça do Pará, Francisco Barbosa de Oliveira, que investigue rumores de que jurados podem ter sido subornados para absolver os réus.
A acusação, sem provas, foi feita pela vice-prefeita de Belém, Ana Júlia Carepa (PT), à revista "Época". Ela disse ontem à Folha que, antes de começar o julgamento, o jurado Sílvio Queiroz Mendonça teria perguntado a outro pré-selecionado para compor o júri, "em tom de brincadeira", segundo ela, "se ele não aceitaria absolver os PMs em troca de R$ 3.000".
A vice-prefeita afirmou que soube disso pela própria pessoa que ouviu a suposta proposta de Mendonça. Mas Ana Júlia disse não saber o nome da pessoa que relatou o caso a ela, que não teria sido sorteada para compor o júri.
A vice-prefeita também contou à Folha que a empregada da sua casa atendeu um telefonema anônimo dizendo que o mesmo jurado que teria feito a proposta já havia ganho R$ 3.000 para votar pela absolvição dos PMs e ainda receberia mais R$ 130 mil.
A Folha tentou ontem achar Mendonça na sua casa e no telefone celular, das 16h às 19h, mas não teve sucesso.
"Eu não disse que o cara recebeu ou deixou de receber dinheiro. Eu apenas relatei à revista "Época" o que eu vi. Agora, que se investigue", disse a vice-prefeita.
Ana Júlia chegou a contar o caso logo depois da absolvição dos comandantes da operação, para João Pedro Stedile, líder nacional do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).
Stedile, no entanto, não mencionou o fato na entrevista que deu um dia após o julgamento.
Américo Leal, advogado dos PMs absolvidos, classificou a acusação de falsa. "Podem quebrar o sigilo bancário dos meus clientes se quiserem", afirmou.
Mendonça tornou-se o jurado mais polêmico do júri por ter manifestado sua opinião pouco antes do fim do julgamento dos comandantes da operação (coronel Mário Colares Pantoja, major José Maria Oliveira e o capitão Raimundo Almendra Lameira), absolvidos na semana passada.
O jurado pediu para ver cenas do início do conflito, gravadas por uma TV, e apontou um sem-terra atirando na direção dos PMs. "Agora fica comprovado que havia sem-terra armados no começo do conflito", disse, no microfone, após ver a cena diante dos outros seis jurados.
O promotor está pedindo a anulação do julgamento, entre outras coisas, pela atitude de Mendonça, que teria comprometido a regra que determina a incomunicabilidade entre os jurados, estabelecida pelo Código de Processo Penal.
O jornalista Nielsen Martins, da TV Record, disse ontem que foi ameaçado por Mendonça. Segundo Martins, o jurado deu uma entrevista a ele, com o revólver no bolso, e afirmou que, se as imagens fossem ao ar, o repórter e sua família iriam sofrer as consequências. Martins não registrou queixa na delegacia de polícia, por, segundo ele, não ter provas do fato.
O Tribunal de Justiça do Pará começa a apreciar hoje o pedido de anulação do julgamento que absolveu os comandantes.
Não há prazo para uma decisão final sobre a questão, mas se calcula que será no período máximo de seis meses, podendo ser antecipado. Até lá, o início do julgamento dos outros 147 réus ficará suspenso.


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