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20 ANOS
Presidente da República, 2 ministros e pelo menos 9 deputados sofreram sanções do regime militar
Anistiados políticos chegam ao poder
CLÁUDIA TREVISAN
da Reportagem Local
Há exatos 20 anos, o comerciante de Cruzeiro d'Oeste (PR) Carlos Henrique Gouveia de Mello
estava prestes a resgatar sua real
identidade e se transformar em
José Dirceu, nome que havia
abandonado cinco anos antes,
quando passou a viver clandestinamente no país.
Vinte anos depois, Dirceu é um
dos 513 deputados federais brasileiros e um dos principais líderes
do maior partido de oposição do
país, o PT. A seu lado na Câmara,
estão pelo menos outros oito parlamentares punidos durante o regime militar e beneficiados pela
Lei da Anistia, sancionada em 28
de agosto de 1979.
Os anistiados também chegaram ao poder no Executivo, a começar do próprio presidente Fernando Henrique Cardoso. Aposentado compulsoriamente na
USP (Universidade de São Paulo)
em 1969, FHC resgatou há 20 anos
o direito de voltar a dar aula em
universidades públicas.
As restrições sofridas pelo presidente durante o regime militar
foram bem menores que as impostas a dois de seus colaboradores atuais, Aloysio Nunes Ferreira
e José Serra, que viveram no exílio
a maior parte do período militar.
Atual secretário-geral da Presidência da República, Ferreira tinha 23 anos em 68, quando partiu
para a França -país do qual só
voltaria 11 anos depois, com a
aprovação da anistia.
Condenado à revelia a três anos
de prisão em 72, Ferreira tinha como advogado outro integrante do
governo federal, o ministro da
Justiça, José Carlos Dias, que também defendeu o secretário da
Ciência e Tecnologia de São Paulo, José Anibal. Anibal saiu do
país em 73, aos 25 anos, e voltou
em agosto de 79.
Serra, ministro da Saúde de
FHC, era presidente da UNE
(União Nacional dos Estudantes)
em 64, quando começou o regime
militar. No ano seguinte, exilou-se no Chile, passou um período
nos Estados Unidos e retornou ao
Brasil em 77. Apesar da volta, seus
direitos políticos continuavam
suspensos, em razão de condenação a três anos de prisão que ele
havia recebido em 1966.
Legislativo
Enquanto os tucanos dominam
a cena entre os anistiados do Executivo, os petistas são maioria no
Poder Legislativo.
Dos pelo menos 9 deputados
anistiados, 5 são filiados ao PT:
José Dirceu, José Genoino, Milton
Temer, Nilmário Miranda e Waldir Pires. Os deputados Sérgio
Miranda e Aroldo Lima integram
o PC do B, Fernando Gabeira, o
PV e Neiva Moreira, o PDT.
Desse grupo, Lima é o único que
estava na prisão no dia em que a
Lei da Anistia entrou em vigor.
Depois de ter vivido como clandestino por dez anos, ele foi preso
em 76, quando integrava a direção do PC do B. No ano seguinte,
recebeu a condenação a dez anos
de prisão. Ganhou a liberdade no
último dia de agosto, aos 39 anos.
Genoino foi para a clandestinidade em 69 e, em 70, passou a integrar a guerrilha do Araguaia,
organizada pelo PC do B. Preso
em 72, cumpriu integralmente
sua pena, até 77, mas só recuperou seus direitos políticos em 79.
Seu colega de partido José Dirceu era candidato à presidência
da UNE em 68, quando foi preso
com os cerca de mil estudantes
que participavam do congresso
da entidade em Ibiúna (SP).
No ano seguinte, foi trocado pelo embaixador norte-americano
Charles Burke Elbrick, que havia
sido sequestrado, entre outros,
por Fernando Gabeira.
Banido pelo regime militar, Dirceu voltou clandestinamente ao
país em 74 e foi viver em Cruzeiro
d'Oeste, com o nome de Carlos
Henrique Gouveia de Mello. Casou, teve um filho e só revelou a
real identidade à então mulher no
dia em que saiu a anistia.
Gabeira participou do sequestro do embaixador norte-americano como integrante do MR-8.
Preso, acabou sendo trocado em
1970 por outro embaixador sequestrado: Ehrenfried von Holleben, da Alemanha. Voltou ao Brasil em 79, depois de quase dez
anos no exílio.
Consultor-geral da República
do governo João Goulart, Waldir
Pires entrou na primeira lista de
cassações. Exilou-se em Paris,
voltou ao Brasil em 1970 e só recuperou seus direitos políticos com
a anistia, quando tinha 52 anos.
Neiva Moreira era deputado federal e, como Pires, entrou na primeira lista de cassações. Saiu do
país em 64 para só voltar 15 anos
depois, aos 62 anos.
Militares
O petista Milton Temer estava
entre os cerca de 7.500 militares
cassados pelo regime de 64. Expulso da corporação, ingressou
no Partido Comunista e, em 73,
exilou-se na ex-União Soviética.
Condenado duas vezes sob acusação de prática de atividades
subversivas, Sérgio Miranda viveu como clandestino grande
parte do regime militar. Em 79,
aos 31 anos, livrou-se das condenações e pôde voltar a seu Estado
natal, o Ceará, onde não punha os
pés desde o início da década.
Atual presidente da Comissão
de Direitos Humanos da Câmara
dos Deputados, Nilmário Miranda viveu como clandestino a partir de 69. Preso em 72, cumpriu
pena de três anos e meio.
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