São Paulo, segunda, 24 de março de 1997.

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MÃOS SUJAS
Francesca afirma desconhecer existência da N'drangheta e culpa polícia pela morte do irmão Domenico
Filha de Morabito nega acusações ao pai

dos enviados especiais a Locri


Francesca Morabito não considera seu pai um mafioso, apesar de ele ser tido pela polícia italiana como o ``capo'' da N'drangheta, acusado de vários crimes e foragido desde 1989.
``Quando os juízes e a imprensa falam de meu pai, é como se fosse uma outra pessoa. Meu pai não é o que dizem eles, não é um velhaco'', afirmou à Folha.
Ela também nega a existência da máfia. ``Para que deve existir essa máfia? A Calábria é uma região pobre. O Norte da Itália é rico. A que teria servido essa máfia todos esses anos? Onde está esta riqueza, os bilhões, que o Estado atribui à máfia? O Estado procura esses bilhões e não os encontra. Essa máfia não nos faz mais felizes nem mais ricos. Para que, então?''
Francesca ainda está chocada com a morte de seu irmão Domenico, numa blitz policial na rua. Ela acusa os agentes de terem atirado a sangue frio, com o irmão já algemado. A polícia está investigando.

Esconderijo na região
``Eu não me importo mais quando falam de meu pai, mas quando matam um irmão, não é aceitável. Meu irmão não era foragido. Tinha sido processado e condenado a quatro anos por um crime que não cometeu. E que não daria seis meses de prisão no Norte. Meu irmão foi condenado à morte por ser filho de Giuseppe Morabito.''
A polícia italiana desconfia que Morabito, como a maior parte dos acusados de crimes mafiosos, esteja escondido na região.
Para evitar delatar a presença do pai, Francesca afirma que evita procurá-lo.
``Não o vejo há mais de seis anos. E não quero vê-lo, pois seria perigoso para ele. Só espero que ele esteja bem. Não quero nem saber onde está. Basta que não esteja na cadeia, pois ficaria o resto da vida preso.''
Além do pai, o que mais a preocupa são seus filhos, marcados pelo estigma da máfia.
``Procurei educá-los da melhor maneira possível, mas que tipo de futuro os espera? Para meus filhos não há futuro. Não porque vivam no ilícito, mas porque vivem no lícito'', afirmou.
``Tememos também pelos nossos netos, bisnetos, as futuras gerações da família. Esse estigma não desgruda nunca'', completou seu marido, Rocco Carrozza.
Segundo eles, a família já cogitou deixar a Itália. ``Mas por que tenho de ir? O que eu fiz? Pensei nos meus filhos, mas nós queremos estar na nossa terra. Temos uma relação de ódio e amor com a Calábria. Odiar, eu a odeio, especialmente depois do assassinato de meu irmão'', disse Francesca.

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright 1997 Empresa Folha da Manhã