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São Paulo, quinta-feira, 24 de abril de 2003

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FOCALIZAÇÃO

Economista defende universidade e saúde gratuitas só para pobres

RAFAEL CARIELLO
DA REPORTAGEM LOCAL

Tendo em vista a restrição orçamentária, o economista José Márcio Camargo defende que os gastos públicos sociais sejam direcionados para os pobres. Focalização, ele diz, inclui garantir saúde e universidade gratuitas apenas para quem é pobre.
Professor da PUC-RJ, Camargo é o idealizador do Bolsa-Escola e um dos principais teóricos sobre pobreza e políticas sociais no país.
Ele diz que tem conversado com integrantes da equipe econômica do governo Luiz Inácio Lula da Silva sobre suas idéias. E que o documento de diretrizes elaborado por Antonio Palocci Filho (Fazenda) expressa "o princípio" focalizador delas.
 

Folha - Por que o sr. defende políticas sociais focalizadas?
José Márcio Camargo -
Políticas não focalizadas acabam favorecendo mais os ricos que os pobres. E como você tem uma restrição fiscal importante, focalizar gastos é fundamental.

Folha - O que é focalização? Inclui Previdência, saúde pública etc?
Camargo -
O Brasil fez ao longo dos anos 90 uma clara escolha pelos seus idosos. Gasta hoje 11% do PIB com aposentadorias e pensões e tem 8% da população de idosos. Enquanto 30% da população é de crianças, e o país gasta 5% do PIB com educação.
No início da década, 40% da população era pobre. Hoje são 33%. Mas essa redução foi concentrada entre a população idosa. Hoje 50% das crianças brasileiras vivem em famílias pobres, e menos de 10% das pessoas com mais de 65 anos vivem em famílias pobres. O gasto social no Brasil está concentrado nos idosos.
Das 50% de crianças em famílias pobres, 80% não completam o ensino fundamental. Ou seja, daqui a 30 anos, vamos ter 40% da população brasileira sem completar o ensino fundamental. Ora, é impossível resolver o problema da pobreza no país dessa forma.

Folha - É possível focalizar também na educação e na saúde?
Camargo -
Sem dúvida. É um absurdo que neste país, com 50% das crianças em famílias pobres, a universidade pública seja gratuita. Quando você olha os dados, 92% dos estudantes das universidades públicas estão entre os 20% mais ricos da população. A probabilidade de uma pessoa que vive numa família entre os 40% mais pobres chegar a uma universidade pública é zero. Quando a universidade é gratuita, você está transferindo renda de pobre, que paga imposto, para os ricos.
Se as pessoas conseguem pagar o ensino de segundo grau, por que não pagar a universidade? Faz o seguinte: cobra de quem pode.

Folha - E a saúde?
Camargo -
Acho que devia-se cobrar de pessoas que têm seguro de saúde, por exemplo. Por que eu ou outra pessoa qualquer, que paga seguro, quando vai ao SUS não paga? Não tem nenhuma razão.

Folha - Esse debate chegou ao governo? No documento da Fazenda estão expressas essas idéias?
Camargo -
Acho que está expresso. Não com essa dureza, porque politicamente não seria defensável. Mas ali está colocado o princípio: de que os recursos públicos da área social sejam direcionados para os pobres.

Folha - O sr. tem conversado com a equipe do Ministério da Fazenda?
Camargo -
Eu converso com todos que querem falar comigo. Obviamente que tenho conversado com algumas pessoas do governo.


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