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EXPLORAÇÃO
Fazenda no sul do Pará muda modo de tratar os peões desde o flagrante do Ministério do Trabalho, em 97
Dono de fazenda diz sofrer 'injustiça'
do enviado especial
Denunciado pela procuradora
da República em Marabá (PA),
Neide de Oliveira, por reduzir trabalhadores à condição análoga à
de escravo, o fazendeiro paulista
João Luiz Quagliato Neto, 66, dono da Fazenda Brasil Verde (1.900
alqueires, 7.000 bois), em Sapucaia, sul do Pará, disse à Folha que
está sendo vítima de "injustiça".
"Na minha fazenda nunca houve trabalho escravo", afirmou. Na
denúncia, de junho de 1997, e ainda à espera de sentença, a procuradora afirma que a fazenda "aliciou peões" no Hotel Pires, de
Xinguara, instalou-os em condições precárias e desumanas e, sob
ameaça de morte com revólver, os
impediu de sair da fazenda.
Quagliato está se defendendo
-mas o fato é que desde o flagrante do Ministério do Trabalho,
em abril de 97, a Brasil Verde mudou o modo de tratar os peões.
Passou a alojá-los em um barracão de madeira -antes eles ficavam em barracões cobertos de
plástico e palha-, com cozinha,
refeitório e banheiro.
"Agora eles têm tudo o querem", disse à Folha o gerente Antônio Alves Vieira, o Toninho,
igualmente denunciado pela promotora. Toninho também se acha
vítima de uma injustiça.
Desde a visita dos fiscais trabalhistas, ele mudou o sistema de arregimentação dos peões. Agora
manda buscá-los em Barras, no
Piauí, por meio do empreiteiro
Francisco Mesquita de Paula.
"O pessoal de lá é mais fácil de
lidar", diz Toninho. Ele paga R$
7,00 por diária de um peão, da
qual desconta os gastos com alimentação e outras despesas feitas
na própria fazenda. Estima em
25% o gasto médio de cada peão.
Havia 69 deles quando a Folha
visitou o barracão da Brasil Verde.
Estavam ali, numa empreita de
dois meses, para roçar 400 alqueires de juquira. Três entrevistados,
na frente de Toninho, disseram
que as condições de lá são melhores que as de outras fazendas, mas
reclamaram do pagamento.
Francisco Alves da Silva, 43,
mostrou as mãos ainda com feridas de um acidente no primeiro
dia de trabalho. "Mas aqui tem remédio." Os remédios, mostrados
por próprio Toninho, ficam espalhados numa caixa de papelão no
chão de um pequeno depósito.
Quagliato é um dos maiores fazendeiros da região, onde, diz, está investindo há 15 anos. Além da
Brasil Verde, ele tem, com três irmãos, a Fazenda Rio Vermelho,
igualmente alvo de denúncias de
trabalho escravo ao longo dos últimos anos, todas elas rebatidas e
não oficialmente comprovadas.
O fazendeiro não quis dizer à Folha o tamanho de sua propriedade. "Não me lembro", disse.
A Folha tentou ouvir o fazendeiro Antônio Barbosa de Melo, o
único até aqui condenado por trabalho escravo (pelo juiz federal
Leão Aparecido Alves, de Marabá,
a 19 de de fevereiro deste ano).
O crime foi flagrado pela fiscalização do Gertraf em abril de 96,
nas fazendas Alvorada (em Água
Azul do Norte) e Araguari (em Sapucaia), de onde foram libertados
20 peões. Melo não recorreu da
sentença. Seu advogado, Serafim
Gonçalves de Meira, disse à Folha
que ele está em Minas Gerais, onde
mora, aguardando a fixação da pena (o que só acontecerá em audiência marcada para 16 de julho).
Em Vila Rica (MT), outro fazendeiro que teve problemas com a
fiscalização trabalhista -o português naturalizado Antônio Delgado, 55- admitiu ter cometido um
erro ao não pagar 33 peões da Fazenda Nossa Senhora de Fátima.
"Eu paguei o "gato', mas o
"gato' não pagou os peões." Tudo acertado, Delgado não quer saber de peões. "Só deu problema.
Estou mecanizando tudo."
Na mesma Vila Rica -onde o
"gato" Antônio Gomes de Freitas
continua na ativa, apesar de denunciado por trabalho escravo,
com o fazendeiro Sebastião Vieira,
da Fazenda Porta do Amazonas-
o peão João Rosário Filho, 41, contou à Folha ter trabalhado três meses "de graça" para o fazendeiro
Francisco Barbacena da Silva, o
Chico Bernardes.
Ele não foi encontrado, mas sua
esposa, Maria Mendes da Silva negou: "É tudo mentira, seu menino; isso é coisa de peão vagabundo
que não quer trabalhar".
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